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28.12.09

Hurt

Tirado da Wikipédia:


"Hurt" has been covered by other artists in addition to Cash, including the following.

Peter Murphy, on some live performances.
Tori Amos frequently sang three or four lines of the song as an introduction to other songs during her Dew Drop Inn tour in 1996, most frequently "Caught a Lite Sneeze", and then again in 1998, as an improvisational bridge.
Breaking Benjamin
Sheryl Crow covered the Cash version on the television special Tribute to Johnny Cash.
Matthew Good, acoustic tour 2006.
Gregorian arranged the lyrics into a medieval Gregorian chant.
Kermit the Frog is featured in an unauthorized parody called "Sad Kermit".
Aaron Lewis of Staind covered the song during his 2007 Have Guitar, Will Travel solo acoustic tour.
Luna Amara
Jeff Martin did a full cover in an acoustic set at the W2 in Holland. He also reversed the lyrical point of view and implemented in to mixed track that consisted of his songs Psychopomp and Requiem which he released on the "Live at the Corner" record.
Montezuma's Revenge
Placebo, at the House of Blues in California in 2003.
Damien Rice, by inserting lyrics from the song into his live performances.
Underoath played it acoustic live.
Sevendust did a cover as a tribute to Johnny Cash on their Southside: Live Double Wide CD/DVD.
Westside Connection sampled the main riff for their song "The Gangsta The Killa and The Dope Dealer".
Anathema have covered the Johnny Cash version several times live, including during their appearance at the 2007 Download Festival.
Eddie Vedder covered the Johnny Cash version live on his 2008 solo tour.
Absurd Minds covered the song on their 2006 EP The Cycle.
Feeder frontman Grant Nicholas played an acoustic cover of the Johnny Cash version, for a BBC Radio 2 session. Later appeared on a Napster Sessions EP.
Christy Moore performed a live version on his DVD Christy Moore Live in Dublin 2006 with Declan Sinnott, again based upon Johnny Cash's cover.
Fightstar played it on a radio 1 rock show session based on the Nine Inch Nails version.
The New Shining covered the song on their Album Supernatural Showdown
Portuguese fado singer Mísia covered the song on her album Ruas (2009). (courtesy of mamis)
New Zealand Band Titular Nebular covered the song on an early demo
David Page Music Performance

18.12.09

Lugares estranhos do mundo IX

Eu prometo que o 10 faço um próprio, mas achei que essa matéria do Valor se encaixava demais na lista pra não repassar.

À rua São Caetano, zona central de São Paulo, o movimento é intenso. São apenas duas da manhã de quinta-feira, dia 17. Ônibus enfileiram-se rumo à rua Monsenhor de Andrade. Bancas à mercê do sereno estão repletas de vestidos pendurados em cabides, iluminados por lâmpadas que se equilibram por um fio. O cheiro de milho verde e de churrasquinho se mistura ao funk e ao samba que vêm dos CDs piratas dos camelôs.

Os ambulantes da rua Monsenhor de Andrade, onde funciona a tradicional "Feirinha da Madrugada", no bairro do Brás, disputam consumidores com os ex-camelôs, que se tornaram comerciantes legalizados e com banca fixa no Shopping Popular da Madrugada, na mesma rua.

No centro da disputa, um público que chega apressado, trazendo nos ombros imensas sacolas. No bolso, no mínimo, R$ 1,5 mil em dinheiro para gastar com produtos para revender. Só neste mês, os sacoleiros movimentam no Brás e na rua 25 de Março pelo menos R$ 50 milhões por noite. Tanto dinheiro chamou atenção até da multinacional Nestlé, que já se instalou no centro de compras mais popular da cidade.

O Shopping Popular da Madrugada deve atingir seu pico de vendas e de público neste sábado, último antes do Natal, quando são esperadas 80 mil pessoas. Criado há quatro anos pela Prefeitura de São Paulo, como alternativa legal aos ambulantes, o lugar se transformou na nova atração do turismo popular de compras da cidade.

Com roupas baratas, acessórios e artigos eletrônicos, seu grande trunfo é contar com estacionamento para ônibus - as 240 vagas originais foram ampliadas para 390, tendo em vista o aumento da procura. Também foram criadas 100 vagas para vans. Cada ônibus paga R$ 50 por noite e, a van, R$ 30, serviço que antes era gratuito, mas começou a ser cobrado este ano.

Com isso, os sacoleiros que vêm das mais variadas regiões do país, principalmente Sudeste e Sul, fazem do Shopping sua base de apoio: compram na feirinha, no próprio Shopping e, ao amanhecer, nas lojas do Brás e da rua 25 de Março. Enquanto isso, vão guardando as mercadorias nos ônibus.

Quem administra o espaço de 140 mil metros quadrados é a empresa GSA, que paga aluguel de R$ 137 mil ao governo federal, uma vez que o terreno, cortado pela linha do trem, pertencia à antiga Rede Ferroviária Federal SA (RFFSA).


Falando na RFFSA: saiu o edital para os trens regionais de passageiros. Entre as linhas, Campinas-Arararaquara, São Paulo-Itapetininga, Santa Cruz-Mangaratiba, e Campos-Macaé.

17.12.09

Vai um snow crash aí, mano?

Fui ler o Global Guerrillas porque queria ver a opinião dele sobre a notícia do dia: guerrilheiros afegãos e iraques conseguiram hackear o sinal de vídeo dos bombardeiros de controle remoto (UCAV) usados pelos Estados Unidos, utilizando um sistema russo desenvolvido pra piratear conexões alheias pegando arquivos com cópiraite. Não (ainda) os controles, mas saber onde estão e o que estão olhando já ajuda...

Lendo o que tinha no blógue desde a última vez que visitei, dei de cara com essa outra notícia aqui, que não sei se é tão cyberpunk quanto a anterior, mas é bastante impressionante - e mais impressionante ainda que não tenha sido objeto de tanta divulgação e grita quanto eu imaginaria.

Drugs money worth billions of dollars kept the financial system afloat at the height of the global crisis, the United Nations' drugs and crime tsar has told the Observer.

Antonio Maria Costa, head of the UN Office on Drugs and Crime, said he has seen evidence that the proceeds of organised crime were "the only liquid investment capital" available to some banks on the brink of collapse last year. He said that a majority of the $352bn (£216bn) of drugs profits was absorbed into the economic system as a result.


Resumindo: quem salvou, em parte, os bancos foram os cartéis da droga. E rapeize dos organismos internacionais fez vista grossa porque o dinheiro era necessário.

16.12.09

Às avessas


O "filósofo" Olavo de Carvalho, que cometia artigos no Globo antes de ficar maluco demais pra este, e hoje recebe uma sinecura do Afif para morar na Virginia, vive de repetir e traduzir lugares comuns da extrema direita americana. Não tem nenhuma relevância além da cômica (ao contrário do seu colega Reinaldo Azevedo, que afinal ainda escreve na Veja, e muito apropriadamente o Hermenauta sacaneia). Mas uma afirmação dele num de seus programas me chamou a atenção porque já a vi antes, em outros lugares, e até dita por gente que não se considera racista: a de que (parafraseando) "a escravidão já existia na África, e se fosse pra escolher o escravo preferia ser vendido para o português."

A afirmação, além de preconceituosa (porque parte do princípio, reificado, de que o português é superior, no caso como dono de escravo), é falsa. É mais do que falsa: é o contrário do que acontecia na realidade. Temos carradas de fontes, do século 17 ao 19, que apontam para o uso da ameaça da venda aos brancos para pôr escravos na linha. Isso não é nenhuma novidade da pesquisa historiográfica - Bastide e Verger já tinham recolhido fontes com esse dado. Se calhar até o Nina Rodrigues. A ameaça se baseava em parte no desconhecimento sobre o que seriam esses brancos estrangeiros (Olaudá Equiano, o primeiro escravo a publicar sua própria autobiografia, fala que achava que os brancos eram canibais), em parte na realidade do inferno que eram a escravidão nas plantações das Américas (muuuuuito pior do que a escravidão na África, com exceção dos poucos escravos de minas e salinas) e, especialmente, no inferno particular que era o navio negreiro. Olhem a foto que abre este post. Tão vendo? Pois bem, o navio ilustrado, na verdade, teria 60% a mais de negros do que o representado; a ilustração mostra o limite de ocupação imposto na Inglaterra no fim do século XVIII, não a realidade, ignorando a lei ou antes dela. Há 462 seres humanos empilhados no navio, com as dimensões corretas, que se chamava Brookes, na ilustração. Em sua última viagem antes da ilustração, o mesmo navio carregou 601. Na mais lucrativa antes disso, mais de 800. Ah, e a ilustração não dá espaço pras vigas suportando o convés, nem pras tinas de excremento.

Realmente, tudo que eu desejaria na vida seria ir parar num lugar desses. Por seis meses a um ano.

15.12.09

Change


OK. Nunca fui dos que achavam que Obama ia redimir os pecados do mundo, apesar de brincar com isso cantando "hey Bama O Bama Bama Bama hey Bama hey Bama Ho BAma." Afinal, nada no histórico dele sugeria que fosse algo mais do que mais um advogado de elite e político americano, mais ou menos conservador, imperialista, como todos os que lhe antecederam com a exceção do pastor que plantava amendoim. Mesmo assim, minhas decepções com ele vêm se acumulando. Geralmente, como no caso da abdicação total de qualquer apoio aos direitos GLBT, eu punha isso na conta do "ele está se concentrando no arremedo de SUS de quinta categoria que quer construir, e isso mal ou bem é uma coisa boa, se ele conseguir."

Mas aí me aparece o discurso, ao receber o prêmio Nobel das boas intenções, explicando que a guerra justa é uma paz mais verdadeira do que a paz se não for legal, uma defesa radical da doutrina da "guerra humanitária" que começou sob Clinton e se radicalizou com Bush (apesar dos Casii Bellorum iniciais da invasão ao Iraque e Afeganistão não terem nada a ver com ela).

A doutrina da guerra humanitária contra países "maus" é, acima de tudo, a hipocrisia elevada ao nível de política externa, já que ninguém imagina os EUA invadindo a Arábia Saudita ou a Colômbia. É, quase perfeitamente, a reedição século 21 do fardo do homem branco. Sobre o fardo do homem branco, escreveu Mark Twain:

Having now laid all the historical facts before the Person Sitting in Darkness, we should bring him to again, and explain them to him. We should say to him:

"They look doubtful, but in reality they are not. There have been lies; yes, but they were told in a good cause. We have been treacherous; but that was only in order that real good might come out of apparent evil. True, we have crushed a deceived and confiding people; we have turned against the weak and the friendless who trusted us; we have stamped out a just and intelligent and well-ordered republic; we have stabbed an ally in the back and slapped the face of a guest; we have bought a Shadow from an enemy that hadn't it to sell; we have robbed a trusting friend of his land and his liberty; we have invited our clean young men to shoulder a discredited musket and do bandit's work under a flag which bandits have been accustomed to fear, not to follow; we have debauched America's honor and blackened her face before the world; but each detail was for the best. We know this. The Head of every State and Sovereignty in Christendom and ninety per cent. of every legislative body in Christendom, including our Congress and our fifty State Legislatures, are members not only of the church, but also of the Blessings-of-Civilization Trust. This world-girdling accumulation of trained morals, high principles, and justice, cannot do an unright thing, an unfair thing, an ungenerous thing, an unclean thing. It knows what it is about. Give yourself no uneasiness; it is all right."

Now then, that will convince the Person. You will see. It will restore the Business. Also, it will elect the Master of the Game to the vacant place in the Trinity of our national gods; and there on their high thrones the Three will sit, age after age, in the people's sight, each bearing the Emblem of his service: Washington, the Sword of the Liberator; Lincoln, the Slave's Broken Chains; the Master, the Chains Repaired.

It will give the Business a splendid new start. You will see.

. . . . . .

And as for a flag for the Philippine Province, it is easily managed. We can have a special one -- our States do it: we can have just our usual flag, with the white stripes painted black and the stars replaced by the skull and cross-bones.

. . . . .

By help of these suggested amendments, Progress and Civilization in that country can have a boom, and it will take in the Persons who are Sitting in Darkness, and we can resume Business at the old stand.

14.12.09

Schaden schaden schadenfreude

OK, sou pacifista, paz e amor bicho, porrada só na rodinha...mas confesso que não deixei de dar um sorrisinho ao ver a carantonha do Berlusconi ensanguentada. Por que isso?

Porque quando se diz que um político é fascista, normalmente é hipérbole pra dizer que ele é um reaça autoritário. (Cf. Le Schtroumphissime)

Quando se diz que é mafioso, geralmente é hipérbole pra significar que ele é corrupto. (Cf. mais ou menos todos os DEMocratas)

No caso do Berlusconi, mafioso e fascista é simplesmente uma descrição literal do que ele é.



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A Economist, falando sobre a tentativa do New Labour de virar um pouco Labour, aposta que Another obstacle is that the Tories are not stupid enough to die in the ditch for the rich. They have swallowed most of the government’s rich-squeezing policies, albeit reluctantly. At the election, the rich will have no champions. Aqui no Brasil, PSDEMB são de fibra mais sólida do que os Tories britânicos, pelo visto.

10.12.09

Petrobrás detona igreja histórica

Oposição papou mosca em não fazer essa manchete. Finalmente algo de verdade pra cruzada deles contra a Petrossauro.

Sonhando o Rio

O Grobo tem um caderno especial com, entre outras coisas, projetos dos seus leitores para o Rio. Os projetos vão do banal (pintar as casas de favelas) ao óbvio (uma passarela subterrânea ligando o MAM e o Santos Dumont ao metrô, com esteiras rolantes) ao alucinado-genial (linhas de teleféricos de grande capacidade margeando e interconectando os maciços montanhosos) ao imbecil (um projeto de mergulhão na Jardim Botânico que pelo visto acha que fazer mergulhão num solo hipersaturado de água e ao lado de uma fieira de palmeiras centenárias é barato).

Eu continuo com os meus. Além, sempre, da idéia do Gaudí Palace Copacabana - um museu usando o projeto de hotel que o Gaudí fez pra Niviórque.



6bn de dólares vão pra renovação da Biblioteca Nacional. Um concurso arquitetônico internacional seria feito para escolher uma proposta de renovação e uso dos edifícios, que incluiriam o presente, o Palácio Gustavo Capanema , e o quarteirão entre a Beira-Mar, a Presidente Wilson, e a Presidente Antônio Carlos, que seria reformado ou arrasado, à escolha do projeto. Além disso, seriam construídas ou adaptadas unidades regionais em Porto Alegre, São Paulo (na região do Anhangabaú ), Goiânia, Recife e Belém. Seriam 2bn em prédios, e 4bn num fundo de renovação permanente do acervo. Arquitetura líquida pro prédio novo do Rio, estilo internacional pra São Paulo, neomoderna em Goiânia, high-tech no Recife e verde em Belém e PoA.




1bn iria para a criação, onde hoje se encontra o gasômetro, de um aquário público de grandes dimensões (o maior do mundo , hoje, é o de Osaka , que custou uns 170 milhões), e para sua manutenção. A idéia é algo que teria um caráter mais sério do que o da SeaWorld (nada de shows, em geral), mas teria um número grande o bastante de atrações interativas (fora os sempre populares túneis dentro de aquários gigantes) para ser atraente em si.

1bn para a ampliação do Rio-Zôo , incluindo as compensações pela área hoje ocupada por presídio , exército , etc, e um mergulhão substituindo a avenida Bartolomeu de Gusmão.

1bn para a reforma geral do Museu Nacional, incluindo a construção de grandes salões subterrâneos para a área de paleontologia, para a reserva e para estacionamento (as duas primeiras ligadas diretamente ao palácio da boa vista), e de um prédio pequeno para a área administrativa e letiva.

0.5bn para a criação do Museu da Intolerância, em São Cristóvão, focado na escravidão brasileira, mas com direito a exposições sobre outros horrores como o Holocausto, Ruanda, Bósnia, etc, sobre outras escravidões, inclusive as atuais ou as da Roma Antiga, sobre a Passagem Atlântica e sobre o racismo e preconceito étnico.

1bn para o Museu da África, na Gamboa, parte em moldes similares aoMuseu Afro-Brasil, mas com muito mais sobre a África propriamente dita.

1bn para um museu de transportes na Estação Barão de Mauá, da antiga Leopoldina.

2bn para os museus da praça Mauá. Um do mar, no píer, e um das Índias no prédio da Portus. Ao lado do museu do mar, no lado direito do píer, talvez fosse o caso de se construir uma marina. O museu do mar seria acima de tudo um museu de ciências, com todos os experimentos e informações tendo algo a ver com o mar, mas utilizando o tema para falar de processos físicos, de geologia, de biologia, etc. (E incluindo, claro, a forma como a pesca industrial está esvaziando o mar). O das Índias teria como tema central o império colonial português, e partiria daí pra contemplar a evolução das rotas de comércio no mundo, as trocas entre Brasil e África, as artes e sociedades do Oceano Índico, a construção das naus, de onde vieram as árvores das ruas do Rio de Janeiro...







2.5bn para enterrar as oficinas do metrô e as linhas de trem da Central do Brasil e da linha 2 até o ponto onde se separam os ramais norte e oeste, e construir um parque por cima, incluindo a reforma (com um grande teto de vidro sobre as plataformas) da Central, e a criação de uma estação de trêm e ônibus integrada (com o espaço de veículos enterrado) no lugar da atual (e vergonhosa) estação de São Cristóvão.

9.12.09

Il pleuvait sans cesse sur Magnitogorsk

Interessante que os primeiros a se manifestar em defesa dos latifundiários tenham sido deputados de um partido ex-comunista e outro que ainda se reinvindica como tal. Se os dois ainda tivessem alguma coisa de esquerdista, daria até pra fazer o paralelo com as catástrofes ambientais monumentais do Pacto de Varsóvia. Mas até que as críticas do Aldo foram amenas perto das dos outros defensores do latifúndio.

Impressionante é o tom de voz dos "produtores," que atingiu o ápice na ameaça de "currar" o Minc. Provando (como fez, logo quem, FH há já cinco décadas, sobre a escravidão) que o capitalismo em nada inibe o coronelismo, muito pelo contrário, e nem os neo-coronéis com ADRs na bolsa de Nova Iorque diferem em nada de importante dos velhos coronéis. OK, provando não, o que prova é o fato deles terem jagunços e escravos em suas fazendas, mas que é engraçado é.

OK, seria mais engraçado se não fosse o tamanho da influência deles. Como já disse e repito, o maior partido do Brasil não é o PMDB, nem o PT, nem o PSDB. É a bancada ruralista. Mais organizado, disciplinado, e ideologicamente coerente, também.

8.12.09

Os jornalistas e a matemática n

A Economist prova que não são só os jornalistas brasileiros que, às vezes, esquecem de fazer as contas apresentadas por suas fontes, além de deixar bem clara sua identificação com a elite branca. (Na África do Sul e no mundo.)

Fazendo as contas por eles: há 40.000 fazendeiros brancos na África do Sul. Houve 1.650 assassinatos no campo, a maioria de fazendeiros brancos, desde 1991. Vamos fingir que esse "a maioria" significa 1.100. Houve uns 60 assassinatos por ano. Não é exatamente a vendéia. A taxa, de 150/100.000p aa, é comparável às das grandes cidades sul-africanas; a média nacional é 60. Mas pera - e aí tá o segundo truque. 40.000 "fazendeiros," e 1.2000 assassinados "fazendeiros e familiares." O número 40.000 se refere ao número de paterfamiliae. O número real é 216.000 "fazendeiros e suas famílias."

Conclusão: o índice de assassinados entre os fazendeiros brancos e suas famílias é menor que a média do país. Alto ainda, sem dúvida. Mas longe do cataclisma que sites racistas querem apresentar - e que, tacitamente, a Economist engoliu.

5.12.09

Lasciate ogni speranza, voi ch'intrate

Já virou festa. A BBC entrevista o cara que entrou voluntariamente em Auschwitz. A diferença entre ele e o outro cara que fez a mesma coisa é que o polonês achava que se tratava de um campo de concentração, apenas - isto é, uma instalação de grande porte para prisioneiros. Denis Avey foi sabendo que estava entrando no inferno.

4.12.09

Núcleo duro

Matéria no Valor fala sobre o núcleo de pobreza que mais resiste tanto ao crescimento econômico quanto aos programas sociais existentes, formado pelas famílias chefiadas por mulheres pobres e jovens. Soa, quando você pensa no assunto, como uma constatação óbvia dentro das hierarquias e exigências da nossa sociedade; tanto que o fenômeno não é exclusivo do Brasil. Até na Suécia existe esse núcleo duro da pobreza. OK, lá a situação dele é diferente. Mas não deixa de ser marcada por carestia e violência. Aliás, um dos motivos pelos quais lá o problema é menor é exatamente algo que é pouco questionado hoje em dia: a condicionalidade dos benefícios sociais implantados, tão tarde, no Brasil.

Cue in o Suplicy e sua renda universal...


...A história de superação de Mislene, no entanto, ainda está no campo da ficção. Mãe de Mirela, de 2 anos, ela vive um drama bem real. A filha, cujo pai morreu no início do ano, tem problemas respiratórios crônicos, o que exige hospitalização frequente e atenção constante quando está em casa, na Vila Nhocuné, bairro da extremidade leste paulistana. "Ninguém quer contratar uma pessoa que é obrigada a faltar sempre. Estou desempregada e sem renda. Vivo dos mantimentos que minha mãe, que também está sem emprego e mora longe, me manda", desabafa.

Dramas como o de Mislene engrossam as estatísticas de um grave problema social no Brasil: cada vez mais a extrema pobreza se concentra em famílias chefiadas por mulheres com menos de 35 anos, responsáveis por crianças de menos de 6. São pessoas que permanecem em condições de indigência, apesar do crescimento econômico, da melhoria e expansão do mercado de trabalho e das políticas de transferência de renda. "São questões que os programas convencionais, como o Bolsa Família, não são capazes de resolver", diz o economista André Urani, sócio-fundador do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets).

Urani pôs uma lupa sobre dados das dez principais regiões metropolitanas do Brasil e constatou que a pobreza urbana é feminina. Em 1993 havia 6,3 milhões de pessoas em condições de extrema pobreza nessas regiões - 1,6 milhões delas viviam em famílias chefiadas por mulheres. Passados 15 anos, 3,5 milhões viviam em condições de extrema pobreza nessas mesmas áreas - 1,8 milhões em famílias chefiadas por mulheres. Ou seja, embora o total de pessoas com renda familiar per capita até R$ 104,00 tenha sido reduzido, essa diminuição não se verifica em famílias chefiadas por mulheres. Nesse período, apesar de o porcentual de pessoas que vivem na indigência ter caído 44% no Brasil metropolitano - Porto Alegre, Curitiba, São Paulo, Rio, Salvador, Distrito Federal, Recife, Fortaleza e Belém -, a queda não se refletiu nas condições de vida de quem vive em famílias chefiadas por mulheres.

O fenômeno registrado nas regiões metropolitanas, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (Pnad) de 2008, se repete no Brasil como um todo, ainda que com menos intensidade. Em 1993, havia 32,4 milhões de pessoas em condições de extrema pobreza no país, das quais 5,5 milhões viviam em domicílios chefiados por mulheres. Passados 15 anos, havia 15,8 milhões de pessoas em condições de extrema pobreza, das quais 5,2 milhões viviam em famílias com mulheres no comando. Apenas 1,7% da redução da indigência no Brasil, portanto, se deu em famílias chefiadas por mulher. "Não somos capazes de enfrentar a extrema pobreza nessas famílias", afirma Urani.

Um dos problemas centrais para que a pobreza adquira o contorno feminino é que as mulheres chefes de família raramente são beneficiadas pelas melhorias no mercado de trabalho, uma consequência da combinação de fatores como falta de perspectiva de futuro, ausência de responsabilidade paterna para com os filhos, baixa escolaridade e falta de equipamentos públicos. "Há necessidade, por exemplo, de a creche ser universal e os serviços médicos serem acessíveis", diz Maria Salet Novellino, professora da Escola Nacional de Ciências Estatísticas e autora da pesquisa "Os Estudos sobre Feminilização da Pobreza e Políticas Públicas para Mulheres". "O trabalho da mulher está associado à família, e o Estado tem de apoiá-la para que ela deixe a criança num lugar público decente. A mulher falta ao trabalho, basicamente, porque o filho ficou doente."

Historicamente, famílias monoparentais - com apenas um adulto responsável -, em geral chefiadas por mulheres, são mais pobres por contar apenas com uma renda que, sendo de trabalho feminino, já é menor do que do trabalho masculino, avalia a economista Lena Lavinas, que realizou uma pesquisa sobre a ausência do público feminino entre os beneficiários do Bolsa Família. Ela identificou que mais da metade das pessoas que não recebem o benefício vivem em famílias chefiadas por mulheres, e 60% das pessoas que não recebem, mesmo sendo elegíveis, são mulheres chefes de família. Os dados foram coletados com 121 mil mulheres do Recife.

Mislene é elegível. Já havia solicitado os benefícios do Bolsa Família fazia seis anos, quando deu à luz Mailon Emanoel Esteves, que morreu ainda bebê. Não obteve o direito. Voltou a buscar informações quando Mirela nasceu. Foi à Regional da Penha, em São Paulo, onde a orientaram a esperar um profissional responsável pelo cadastramento do programa em sua casa. "Até hoje ele não veio. O que eu faço?", pergunta.

Lúcia Modesto, secretária nacional de Renda de Cidadania, área do Ministério do Desenvolvimento Social que coordena o Programa Bolsa Família, diz que trabalha com um novo objetivo para os dois próximos anos: alcançar 2 milhões de famílias, a maior parte nas áreas urbanas. Para isso, investe numa nova forma de fazer o cadastro, treinando profissionais que possam ir às ruas localizar e identificar possíveis beneficiários.

Para cadastrar 120 mil novas famílias, que serão mapeadas nas áreas mais precárias da cidade, a Prefeitura de São Paulo vai receber R$ 4 milhões. O mesmo esforço será feito no Rio e em todas as principais capitais do país, e a meta é identificar famílias que precisam de outros apoios além da transferência de renda.

A pobreza feminina, de fato, tem outros dilemas. A vizinha de Mislene, Rosely Lazzarini, de 32 anos, chegou a ter direito ao Bolsa Família, mas perdeu. Mãe de cinco filhos - Leonardo, 10, Lilian, 8, Luana, 6, Luiz Felipe, 4, e Leandro, 2 -, ela deixou de receber o benefício porque o filho mais velho não apresentou a frequência escolar exigida por duas vezes. "Sou separada e meu ex-marido não paga pensão. O Leonardo foi morar com ele e eu não tinha como vigiá-lo na escola", justifica. "Os que moram comigo raramente faltam."

Desempregada, Rosely diz que não tem condições de trabalhar por causa dos problemas de saúde da filha Lilian, que há um ano não se locomove e requer cuidado em tempo integral. "Ela tem problema nos ossos e está muito deprimida, por isso não tem vontade de estudar", conta.

Durante algum tempo Rosely vendeu batatas fritas na porta de sua casa, mas, para valer a pena, a matéria-prima tinha de ser adquirida a mais de 25 quilômetros de distância. O negócio ficou inviável. "Não tenho como abandonar tudo. Como batata pesa, e eu ia de ônibus ao parque D. Pedro [zona central de São Paulo] para comprar mais em conta, não dava para pegar mais do que um saco de 50 quilos por vez. Eram muitas viagens."

Adultos como Mislene e Rosely têm dificuldade de mobilidade porque, ao ser os únicos responsáveis por crianças tão novas, sem ter com quem deixar os filhos, acaba sendo impraticável até sair de casa, o que impede o atendimento pela rede social. "Falta um conjunto de políticas na rede de assistência social que resolva uma série de outros déficits, além da renda, que aparecem nas famílias monoparentais chefiadas por mulheres", observa Lena Lavinas, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). "Quanto mais a política focaliza em públicos específicos, menos alcança quem precisa. Por isso é preciso pensar em políticas universais", defende.

Ao impor mais exigências para o recebimento do benefício, diz Lena, menos o Estado garante benefício às pessoas que precisam dele. "Qualquer programa de inclusão da mulher no mercado deve ser bem equacionado. Não pode ser apenas um programa de renda. As regras do mercado não servem para mulheres com essas características", afirma Maria Salet Novellino.

3.12.09

Nunca antef na hiftória defte paíf...

A expressão já virou até a capa da Revista Ferroviária. Agora o anúncio é que, no período 2008-2010, a capacidade de processamento de computadores de grande porte no Brasil vai duodeplicar.



A Petrobras acaba de concluir o projeto Galileu, que consiste na instalação de um supercomputador com capacidade de 160 teraflops - o equivalente à realização de 160 trilhões de cálculos por segundo. O projeto envolveu uma parceria com cinco universidades e investimento de R$ 24,2 milhões. O supercomputador é o maior da América Latina e figura entre as 30 máquinas mais velozes do mundo, de acordo com um levantamento feito pela organização americana Top 500.

Essa "supermáquina", na verdade, é constituída por 3,3 mil processadores e mais de 13 mil servidores (computadores de grande porte) que operam em conjunto, o chamado cluster. Todo esse aparato está instalado em cinco instituições - Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Universidade de São Paulo (USP). A última etapa do projeto foi concluída nesta semana, com o início das operações do sistema na USP, que recebeu investimento de R$ 10 milhões.

...

A conclusão do projeto Galileu exemplifica o rápido avanço dos equipamentos de alto desempenho (conhecidos como HPC ou High Performance Computing). Antes desse projeto, a Petrobras já havia lançado um supercomputador no Brasil. No ano passado, com investimento de R$ 5,8 milhões, a estatal criou o Netuno, instalado no Núcleo de Computação Eletrônica (NCE) da UFRJ, que possui uma capacidade de 16 teraflops e é composto por 256 servidores.

Juntos, o projeto Galileu e o Netuno vão ajudar a compor a Grade BR, composta por cerca de 14 mil núcleos de processamento e uma capacidade total de 200 teraflops. Essa rede fornecerá infraestrutura computacional suficiente para que 300 pesquisadores das universidades envolvidas desenvolvam novos programas e simuladores para os trabalhos de pesquisa e perfuração de poços do pré-sal.

No ano passado, o Brasil dispunha de dois supercomputadores de alto desempenho, mas apenas o Netuno entrou no ranking elaborado pela Top 500. A USP também já operava um supercomputador com capacidade de 3,6 teraflops, que chegou a ser elencado em edições anteriores do estudo da Top 500.

Neste ano, em setembro, a Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (Unesp) iniciou o uso do seu GridUnesp, de 33,3 teraflops, e que recebeu investimento de R$ 3,6 milhões. O cluster está distribuído em uma rede que integra 2.944 unidades de processamento, distribuídas em sete polos de acesso, nos campi de São Paulo, Araraquara, Bauru, Botucatu, Ilha Solteira, Rio Claro e São José do Rio Preto.

Até janeiro, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) também prevê concluir o processo de licitação para aquisição de um supercomputador de 15 teraflops. A proposta de licitação foi anunciada no ano passado e prevê um orçamento de R$ 50 milhões, dos quais R$ 35 milhões serão investidos pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Outros R$ 15 milhões virão da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), informou o Inpe. Quando concluído, esse cluster constituirá um dos seis maiores centros mundiais de previsão numérica de tempo e clima e de modelagem de mudanças climáticas.

25.11.09

O horror, o horror

Faltar luz, tudo bem. Faltar água, tudo bem. Esgoto, escola, hospital, ar, tudo isso é supérfluo.

Mas faltar COCA COLA é indizível, obsceno, grotesco, inominável.

19.11.09

Defendendo o indefensável

Também conhecido como Gilberto Kassab. Sério, eu odeio o Kassab do fundo do meu coraçãozinho negro, mas pô. A Folha desde o começo da semana repete, como manchete do caderno de Cotidiano, que "Kassab vai aumentar o IPTU" ou variantes. E isso é uma pusta mentira. A prefeitura de São Paulo (e digo a prefeitura, não o Kassab, porque se trata de uma operação rotineira e técnica da prefeitura, não uma decisão de governo) vai corrigir os valores da tabela de IPTU para refletir os atuais valores das áreas ocupadas. Chamar isso de "aumento de imposto" é como se eu dissesse que aumentou meu imposto porque paguei mais depois de receber um aumento de salário. E em locais que sofreram depreciação de valor do metro quadrado, vai haver redução do IPTU.

Comentário sobre a situação um: por mim, aumentava-se de verdade o IPTU. Assim como o imposto de renda a nível federal, o imposto sobre a propriedade fundiária municipal é responsável por uma fatia muito pequena da arrecadação. E por mim o gordo dos impostos recairia sobre a renda e a propriedade, não sobre o consumo e a produção como hoje ocorre.

Comentário dois: a Folha continua firme na campanha Serra Presidente 2009 / Vamos Encerrar Esse Ciclo*, então porque malha desse jeito, recorrendo a distorcer os fatos, um aliado do Serra?


*Frase de Aecim que, se a Dilma for esperta, vai usar muito na campanha. Se for muito esperta, o horário eleitoral do PT vai consistir unicamente da foto de um certo ex-presidente com um pé na cozinha, com a legenda "PSDB" embaixo.

17.11.09

Varões Vigorosos da Virgínia

O Partido Republicano americano, ressentido com a vitória democrata ano passado, deu liberdade plena pra sua ala mais raivosa e irracional fazer "tea parties" e besteiras do gênero, inventar maluquices sobre a nacionalidade do presidente e de modo geral se apresentar como dez vezes mais radical do que um partido que já se movimentou bastante pra longe do "centro" político, como quer que você o defina.

Mas os Republicanos, que como diria Gore Vidal são "a ala militarista do Partido Corporativo," não podem eles mesmos se entregar completamente ao movimento Tea Party. E agora, o inevitável aconteceu - a galera vestida de índio e jogando chá no porto está tentando assumir o controle.

O histórico global de políticos estimulando radicais e achando que podem controlá-los não é lá grandes cousas. A ver no que vai dar o movimento político que fala de "Jesus e John Wayne." Falando no que, o excelente cartum abaixo, do Tim Kreider

13.11.09

A festa da democracia

Nas universidades públicas brasileiras, as eleições resultam numa lista, da qual o "dono" (secretário estadual ou ministro da educação) escolhe o reitor. Geralmente, entretanto, essa "escolha" é protocolar; o mais votado é escolhido. Paulo Renato, como ministro da educação, decidiu, de forma controversa, desrespeitar essa tradição na UFRJ; agora, como secretário da educação, decidiu fazer isso na USP. (É a primeira vez que o primeiro colocado não vira reitor da USP desde 1981.)

Pra notícia ficar realmente divertida, o motivo pro sujeito ser tudibom e se ignorar a praxe é ele ser "grande administrador," tendo presidido o CADE que aprovou a fusão da AMBEV e posto a PM pra porrar os alunos da SanFran depois de uma ocupação de um dia.

Curioso é que ele fala que uma das prioridades dele é a autonomia universitária, apesar de estar sendo escolhido por cima da preferência da universidade. Por outro lado, o significado dele de autonomia parece ser "arrumar mais dinheiro e dar mais poder às fundações."

12.11.09

Prudência ou pirraça?

Um artigo bem interessante da Scidev trata da construção e operação de satélites por países em desenvolvimento - o artigo cita nominalmente a Índia, a África do Sul, e a Nigéria.

O artigo cita a acusação de que a construção de satélites seria apenas uma obra de prestígio, que tem um pouco de verdade e um pouco de ciúme, feita pelos órgãos de países desenvolvidos, cujos dados são, hoje em dia, disponíveis digrátish em boa parte, o que tornaria redundante a construção de satélites por outros. Logo depois contrabalança ela falando da necessidade de controle sobre a informação, e de informações mais detalhadas e atualizadas do que as tais informações disponíveis de graça.

Mas o que acho interessante na acusação de que seria um projeto de prestígio é que, bem, boa parte da corrida espacial sempre foi exatamente isso. Os astronautas e cosmonautas pesquisam, principalmente, "os efeitos do espaço em astronautas e cosmonautas." Vá, e taiconautas. Não há muito que eles façam que não possa ser feito - às vezes melhor - por robôs, a uma fração insignificante do custo. Com o preço de se mandar duas vezes astronautas para consertar o Hubble, dá pra comprar um novo Hubble. Quanto a dizer que isso é feito por países ricos, e não por países que, nas palavras do artigo, "do not even manage to feed their own people," bem, isso é verdade, de certa forma, também da China e da Rússia - e até os EUA têm milhões de pessoas desnutridas e em situação de insegurança alimentar. Sem nem ampliar a questão para a solidariedade global. (Ie o dinheiro do programa espacial indiano poderia alimentar indianos carentes, mas o dinheiro do programa espacial americano também poderia alimentar indianos carentes.)

Estou longe de, ao dizer isso, condenar os programas de vôo espacial tripulado. Há quem argumente que a grana fabulosa gasta no projeto Apolo teve um retorno, em termos de incentivo à educação científica e relações internacionais, muito mais do que suficiente. O problema dessa discussão é que, bem, ela é muito difícil de medir. Ao contrário da maioria das discussões políticas, não se trata de algo que possa ser tratado de alguma forma objetiva, o que é ignorado por quem advoga medidas irracionais (cf. "Guerra ao crime" no Brasil), mas algo que legitimamente escapa à apreensão técnica. Qualquer argumento a favor ou contra esbarra em coisas como história contrafactual, e cadeias de se, se, se deeeeeeeeeeeeeste tamanho.

Nessas horas que agradeço por não ser deputado.

10.11.09

Desmatando a peroba

Com a entrada em campo de Marina Silva, o governo Serra busca estabelecer suas credenciais verdes editando uma lei que prevê a queda nas emissões de gases do efeito estufa do estado. Com direito ao secretário de meio ambiente (aquele mesmo que odeia ambientalistas) declarando que "está faltando a coragem ao governo federal de assumir essa agenda com a altivez que nós estamos aqui empenhados em São Paulo pelo nosso governador."

Curiosamente, é a primeira lei de restrição de emissões de carbono de que já ouvi falar que não mereceu um protesto, um pio, um ai por conta de qualquer entidade empresarial, nem da FIESP, nem do CIESP, nem do IBA, ninguém. Nem o agronegócio paulista, geralmente tão aguerrido contra ambientalistas quanto contra sem-terra. Que coisa.

Olhando para a lei, a coisa se explica. Primus, a lei não fala em fazer absolutamente nada até 2014. O plano vai ser formulado "nos próximos dois anos." Secundus, Serra já dá a dica: a meta vai ser atingida "com a troca de combustíveis poluentes na indústria, com o incentivo a transportes mais limpos e com o reflorestamento de matas ciliares" - ou seja, com medidas que o estado e sua indústria já serão obrigados a cumprir, por lei ou programa de incentivos federais, e com meios dúbios como chamar o metrô de "investimento em redução de emissões" e incentivos fiscais a plantações de eucalipto.

Tertio, a cereja do bolo: a lei fala em uma emissão atual de 122MtCO2eq, a ser reduzida para 98MtCO2eq até 2020 através dessas medidas "a conferir." Ora, o último inventário da CETESB, referente a 2006, falava que tinham sido emitidos 72Mt no estado...

Tobin e Strauss Kahn, no parque se beijam

OK, OK, não é uma taxa Tobin. O Dominique Strauss-Kahn, mulherengo profissional e diretor do FMI nas horas vagas, diz isso com todas as letras.

Ainda assim, é interessante que o FMI esteja propondo um imposto internacional, o que até há pouco tempo atrás seria um tabu completo. Pessoalmente, sou mais a favor de uma taxa Tobin de verdade - digamos, 0,005%, o que desestimularia um pouco a especulação, e arrecadaria uns cinquenta bilhões de dólares por ano - por baixo - pra se destinar à ONU, que por enquanto tem que mendigar dinheiro pra agências de pouca importância como o Programa Mundial de Alimentação e a UNICEF.

Alguém não gosta da ONU, ou acha que a turma reaça dos EUA que crê em helicópteros pretos? Tranqs, destine-se ao invés disso os proventos da taxa Tobin pra sanar as dívidas públicas dos países mais pobres, em ordem ascendente de IDH. Dava pra zerar o total em menos de quatro anos. (Hoje em dia, vários dos LDCs dedicam mais de 40% da arrecadação pública ao pagamento de títulos da dívida.)

9.11.09

Alto valor agregado

Um dos problemas da discussão sobre o efeito estufa é que geralmente ela se concentra no dióxido de carbono, tanto que as emissões de outros gases, na hora de fazer a conta, ao invés de serem convertidas em algum índice abstrato, são convertidas em "toneladas de CO2 equivalentes."

E, bem, cada vez mais se acha outros gases problemáticos. Isso porque quase qualquer outro gás contendo carbono captura mais calor do que o CO2. O metano, tão comum nas vaquinhas, é o pior deles; contando seu potencial de captura é responsável por um terço mais ou menos do efeito estufa humano. Possivelmente. Possivelmente porque nunca se sabe exatamente quanto - e novos estudos sempre saem pra pior. Por exemplo, agora se reavaliou o papel da drenagem de pântanos no efeito estufa e, surpresa, eles respondem por quase metade das emissões por mudança de solo, bem mais do que o que se pensava até há pouco. (Não confundir com as emissões de pântanos e outros depósitos de carbono pelo próprio aquecimento global, também conhecidas como "nóis sifu.)

Por isso que, às vésperas de uma nova reunião sobre o aquecimento global, as posições "moderadas" não são nem de longe suficientes. Xiítismo, no caso, é necessário. Pelo menos para um país que tem metade da sua população na costa, e pode se desertificar no interior (perdendo, entre outras coisas, as hidrelétricas).

29.10.09

Ainda somos os mesmos e vivemos




Uma tabela dos gostos por classe mostrada pela Time-life em 1949, antecipando o Bourdieu em uns trinta anos.

Engraçado pensar no que seria diferente numa tabela feita

A) No Brasil na mesma época
B) Nos EUA hoje em dia
C) No Brasil hoje em dia

Pelo menos duma coisa tenho certeza: a cerveja de microcervejaria se enfiou no lugar do martini.

13.10.09

Repensando a reforma agrária

A reforma agrária, no Brasil, tem desde sempre se calcado em três pontos:

*as terras divididas são consideradas "improdutivas." Nunca se aventou por cá (como por exemplo no Japão do pós-guerra, comandado por aquele comunista do McArthur) em dividir todas as grandes propriedades.
*as terras são divididas por uma agência do governo federal. No período recente, essa agência é o INCRA, subordinado a um ministério específico para o tema desde 2003. O Ministério tem uma função ancilar de prover infraestrutura aos assentamentos e incentivar a agricultura familiar.
*as terras são divididas no sentido estrito; isto é, a terra que costumava ser uma grande propriedade individual se torna um número de pequenas ou médias propriedades individuais. Para prevenir a negociação, existe um prazo, entre oito e doze anos, antes do qual não é legalmente permitida a transferência da terra.

E, bem, cada vez mais está claro que esse modelo não dá certo. Pesquisas recentes indicam que até o resultado mais antiintuitivo de todos ele alcança, o de aumentar a concentração fundiária. As críticas feitas à atuação de diversos governos no campo geralmente não falam em rever todo o modelo (ou, em alguns casos, falam de revê-lo a partir de palavras de ordem nebulosas pseudoesquerdistas), e os próprios governos dedicam-se a melhorias, ou a anexos, que não questionam aquelas bases ali em cima. Assim é que, por mais louvável que seja (e mais capital político que custe), a discussão sobre o índice de produtividade rural não questiona o caráter sacrosanto da terra "produtiva." O MST questiona mas, apesar de suas influências maoístas, não questiona a idéia da reforma através da transferência a famílias.

O MST, no link ali, fala em proibir a venda. A questão é que os ex-sem terra não vendem seus lotes porque traíram o movimento véi,, mas porque não têm outra alternativa razoável, mesmo. E a idéia do apoio do INCRA ou MDA como solução é uma admissão de fracasso, sinceramente. OK, o governo financia fartamente, e desde sempre, os grandes fazendeiros, e deveria deslocar esse apoio para os pequenos (menos do que deveria, isso já tem acontecido no governo Lula). Mas existe uma diferença entre "estímulo" e "condição de sobrevivência." Se a reforma agrária em si não causa uma desconcentração fundiária nem melhoria da vida dos assentados, ela é inútil; mais valeria investir essa grana e esse capital político em alguma outra coisa. A não ser que você seja dos que acreditam em algum valor sagrado e essencial da matysyrazemlya - não é o meu caso.

O interessante é que, na esteira do prêmio Nobel de economia deste ano, uma das soluções possíveis para isso é justamente aquela que seria defendida pelos Dostoiévskis da vida. Afinal, já se sabe há algum tempo que a Tragédia dos Comuns não é nem um pouco inevitável - antes do artigo que deu nome à situação, aliás, já que Polanyi já descrevia o processo nem um pouco "econômico," no sentido de desprovido de coerção armada e estatal, da privatização da terra na Inglaterra protocapitalista.

Não estou dizendo que transferir a terra para comunidades, indivisivelmente, seja a melhor idéia. Mas é uma idéia. E idéias são urgentemente necessárias, se quisermos sonhar que seja com uma reforma agrária neste país tão desigual, no qual, não custa lembrar, ao contrário do que diz a classificação oficial do IBGE (pela qual quem mora em distritos-sede de municípios é urbano, não importa a orientação econômica do município), entre 31 e 43% (segundo o próprio IBGE, quando fala em ocupações) da população ainda está diretamente ligado ao campo. Só, por baixo, uns 58 milhões de pessoas.

9.10.09

Creeeeepy

Não gosto de repassar links sem nem um tique de comentários, geralmente. Mas o que comentar sobre o almofadão sensual? O que comentar, fora ÏA ÏA CTHULHU FTAGHEN. NYARLATHOTEP PFLUGH SHOGGOTH K'THOGGUA.

O que restava da minha sanidade voou pela janela vendo essa coisa. É um shoggoth sexual. Dio mio. Socorro.

Pérolas aos porcos

Paulo Henrique Amorim, em seu Conversa Afiada, cunhou a expressão "PIG, Partido da Imprensa Golpista" para se referir ao nosso querido oligopólio de mídia, representado oficialmente pela ANJ. A expressão é meio infantilóide, coisa de animador de torcida, mas reflete uma bem real disposição das famílias Marinho, Frias, e Civita de atacar o governo por todos os cantos imagináveis, sem abrir mão inclusive de, quando não há notícias a manipular, inventar besteiras. A grande imprensa, cada vez mais, abre mão de uma pretensão à neutralidade anódina e se reconhece como de direita escancarada, e portanto inimiga jurada de um governo de centro-esquerda, com colunistas e editorialistas algo extremos como Reinaldo Azevedo, João Pereira Coutinho, Rodrigo Constantino, e outras figuras folclóricas. (Olavo de Carvalho, pelo menos, não escreve mais para o Globo. Provavelmente por desavenças mais pessoais do que ideológicas.)

E, bem, acho isso ótimo. A mídia e, esqueci de dizer no post embaixo que o mencionava, o TCU (basicamente composto de DEMos e PMDBistas da ala Serra). E todo mundo que não aceitou O Cara como seu senhor e salvador devia achar isso ótimo. Afinal, a idéia da mídia e do TCU é justamente servir como órgão de controle do governo; se pegam no pé deste por motivos errados, tanto faz, desde que peguem no pé. Um dos maiores problemas do Brasil pré-Lula, que pode ser visto até hoje nos estados, era justamente o excesso de boa vontade da mídia com os governos. (Dos tribunais de contas, nem precisa se falar nada.)

Além disso, enquanto a mídia tiver esse ódio visceral e ficar pegando no pé com viés moralista, esquece de devotar o mesmo espaço à batalha ideológica - e há muitas em curso no Brasil de hoje. Que o diga a Kátia Abreu.

PS Acabo de descobrir outras expressões do PHA. "Colonistas" e "PUM." Eu hein. Tá parecendo o primo que lembra de tomar os remédios do Olavo.

6.10.09

BrIC

Do Valor:

O Brasil deve ter o sexto melhor crescimento do mundo em 2010, o que deve impulsionar o lucro das principais empresas em bolsa em mais 26% e tornar ainda mais atrativas as ações brasileiras. A avaliação é da Bank of America Merrill Lynch Global Research, que elevou na semana passada a projeção de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2010, de 4,5% para 5,3%. A instituição também acredita que os juros básicos brasileiros não vão subir no ano que vem, contrariando as projeções do mercado futuro.

De acordo com a Merrill Lynch, em 2010, o Brasil só crescerá menos que a China (10,1%), Qatar (8,1%), Índia (7,8%), Nigéria (5,5%) e Oman (5,4%). As mudanças macroeconômicas fizeram a equipe de análise de ações da BofA Merrill Lynch rever suas projeções e reforçar o otimismo com o país, diz Pedro Martins Júnior, estrategista-chefe de ações para a América Latina.



Sabe quando foi a última vez que o Brasil esteve entre os países de maior crescimento do mundo, com inflação baixa e redução da desigualdade? Pois é, "nunca antef na hiftória defte paíf." E a projeção da Merrill Lynch nem é tão otimista assim - o Bradesco fala em 7%, e o relatório Focus saiu com uma média ponderada de 5,5%

Já o índice previsto pra China me lembra desse cartun da Economist: alguém, ao olhar a parada de 60 anos do PCC, pergunta pro vizinho "where in the world will China be in 60 years?" e recebe de resposta "at this rate, the question is where in China will the world be."

5.10.09

Corrigindo a Bíblia

Há algum tempo atrás, os conservadores americanos, indignados com o "viés liberal" da wikipedia, decidiram lançar a "conservapedia." Uma wikipedia conservadora. Porque você pode achar que artigos sobre o mundo natural não têm nada a ver com política, mas tem que lembrar que pra eles têm - afinal, o mundo foi criado em seis dias, há 5700 anos atrás, lembra?

A justificativa pra essas posições alucinadas que esse povo advoga geralmente vêm de uma coisa chamada "inerrantismo literal da Bíblia," isso é, a convicção de que as palavras contidas na Bíblia são direta e literalmente a palavra de Deus, então têm que estar correta. Mais curioso é que muitos deles tomam como versão perfeita e acabada da Bíblia, não a versão mais original possível, mas a tradução do Rei James (que, literariamente, é magnífica).

Agora a cereja no bolo de maluquice: apesar disso, tem um povo na conservapedia querendo corrigir a Bíblia.



As of 2009, there is no fully conservative translation of the Bible which satisfies the following ten guidelines:[2]

Framework against Liberal Bias: providing a strong framework that enables a thought-for-thought translation without corruption by liberal bias
Not Emasculated: avoiding unisex, "gender inclusive" language, and other modern emasculation of Christianity
Not Dumbed Down: not dumbing down the reading level, or diluting the intellectual force and logic of Christianity; the NIV is written at only the 7th grade level[3]
Utilize Powerful Conservative Terms: using powerful new conservative terms as they develop;[4] defective translations use the word "comrade" three times as often as "volunteer"; similarly, updating words which have a change in meaning, such as "word", "peace", and "miracle".
Combat Harmful Addiction: combating addiction by using modern terms for it, such as "gamble" rather than "cast lots";[5] using modern political terms, such as "register" rather than "enroll" for the census
Accept the Logic of Hell: applying logic with its full force and effect, as in not denying or downplaying the very real existence of Hell or the Devil.
Express Free Market Parables; explaining the numerous economic parables with their full free-market meaning
Exclude Later-Inserted Liberal Passages: excluding the later-inserted liberal passages that are not authentic, such as the adulteress story
NE uma delas, segundo eles, é PERDOAI-OS PORQUE NÃO SABEM O QUE FAZEM
Credit Open-Mindedness of Disciples: crediting open-mindedness, often found in youngsters like the eyewitnesses Mark and John, the authors of two of the Gospels
Prefer Conciseness over Liberal Wordiness: preferring conciseness to the liberal style of high word-to-substance ratio; avoid compound negatives and unnecessary ambiguities; prefer concise, consistent use of the word "Lord" rather than "Jehovah" or "Yahweh" or "Lord God."

30.9.09

Les forçats de la faim

A seca está preocupante no Nordeste Brasileiro, e assustadora na África Oriental.

Da Economist, sobre a segunda:

THIS year’s drought is the worst in east Africa since 2000, and possibly since 1991. Famine stalks the land. The failure of rains in parts of Ethiopia may increase the number needing food handouts by 5m, in addition to the 8m already getting them, in a population of 80m. The production of Kenyan maize, the country’s staple, is likely to drop by one-third, hitting poor farmers’ families hardest. The International Committee of the Red Cross says famine in Somalia is going to be worse than ever. Handouts are urgently needed by roughly 3.6m Somalis, nearly half the resident population (several million having already emigrated during years of strife). In fractious northern Uganda cereal output is likely to fall by half. Parts of South Sudan, Eritrea, the Central African Republic and Tanzania are suffering too. Rich countries are being less generous than usual. The UN’s World Food Programme says it has only $24m of the $300m it needs just to feed hungry Kenyans for the next six months.



O pior é que não só os problemas de sempre com a sociedade africana continuam (com as novas potências emergentes doidinhas pra fazer as mesmas sacanagens que as velhas potências continuam fazendo, vide Vale em Moçambique ou CNOOC no delta do Níger), como o aquecimento global atinge mais justamente as regiões mais próximas do Equador.

Caso alguém teja interessado, dá pra comprar bandeide pela internet.

29.9.09

Frase do dia

É do ministro do TCU Aroldo Cedraz, ao comentar a recomendação de que 41 obras do governo federal sejam paralisadas. DO Globo: O TCU não é uma casa política. Nunca se curvou e não se curvará jamais a critérios políticos - afirmou o relator do processo de fiscalização das obras públicas feitas em 2009, ministro Aroldo Cedraz.

Alguém poderia se perguntar o que fazia Aroldo Cedraz antes de ser ministro do TCU. Juiz? Contador? Coisa parecida?

Mais ou menos.

Deputado federal (Congresso Revisor), 1991-1995, BA, PRN
Deputado federal, 1995-1999, BA, PFL
Deputado federal, 1999-2003, BA, PFL
Deputado federal, 2003-2007, BA, PFL

É pecuarista, ex-carlista, e mora em apartamento funcional do Senado. Foi indicado ao TCU pela Câmara dos Deputados.

28.9.09

Monorail! Monorail!

A última brincadeira de transporte urbano em São Paulo é anunciar que as linhas de metrô adicionais planejadas serão de monotrilho, ao invés de metrô tradicional. O problema é que, bem monotrilho é uma porcaria.

Melhor dizendo: monotrilhos têm a vantagem de ocupar pouco espaço, comparado com um trem tradicional. Mas têm a desvantagem óbvia em compensação: transportam mais ou menos a metade do volume de passageiros (considerando-se o volume máximo a ser transportado). Numa cidade com mais de vinte milhões de pessoas, em que o metrô tradicional já está abarrotado, sugerir linhas de monotrilho como linhas de metrô é no mínimo temerário, pra não dizer ridículo.

A capacidade de transporte do monotrilho é a mesma do bonde (sobre pneus ou rodas de ferro); o único motivo pelo qual se escolheria ele no lugar do bonde seria caso se queira fazer uma linha ao longo de uma linha urbana, sem tirar área de rua. Mas ele é um serviço pra cidades de médio porte, ou em grandes cidades um serviço alimentador da linha principal de transporte.

Usar o bonde sobre pneus (ou corredores de ônibus dedicados) como linha principal se justifica como gambiarra, utilizando a oferta de linhas estruturais rodoviárias nas grandes cidades brasileiras, enquanto não se arruma grana pra fazer a linha de trem de verdade. Fazer uma desapropriação e viadutos para monotrilho, afundando uma grana em algo que depois não pode ser convertido, é mais caro, tem exatamente o mesmo efeito, e mais difícil de desfazer - diminuindo, portanto, as perspectivas de eventualmente se ter naquela rota uma linha-tronco de verdade.


******


Capacidade máxima segura, em pessoas por direção por hora, de sistemas de transporte:

Trem (bitola 1,6 - como os metrôs e trens de subúrbio atuais do Rio e SP): 81.000 (com trens compridos; com trens curtos como os usados no metrô daqui, cai pra 60.000)
Trem (bitola 1 como a linha 5-SP, ou monotrilho): 33.000
Bonde ou corredor de ônibus segregado, com estações (fura fila): 29.000
Bonde não segregado, ou corredor de ônibus semisegregado: 18.000
Ônibus no meio do trânsito: 6.000
Uma faixa de carros de passageiros: 1.500


As linhas de metrô e trem dos sistemas mais completos, como Paris e Londres, só lidam com uns 30,000 pphd, mas isso é porque o sistema, em rede, distribui todo mundo. Isso é uma situação ideal, até porque assim uma pane não para o sistema todo, como ocorreu quando um trem da linha 1 do metrô-SP pegou fogo este fim de semana - mas não consta que a idéia seja construir, simultaneamente, umas 15 linhas de monotrilho.

24.9.09

Beowulf

Há pouco tempo atrás, foi achado o dragão. Agora encontramos seu tesouro.

O dragão nanico, pra mim, é a coisa mais quitifófi do mundo. Quero um.

22.9.09

All-american

Tirado do Hermenauta: concurso do jornalzinho conservador da universidade de Staford pra achar beldades conservadoras.

O detalhe que fecha a piada com chave de ouro: a moça da foto, tirada de um catálogo de lingerie, é a modelo francesa Laetitia Casta, que já foi uma das escolhidas como modelo daqueles bustos bregas de Marianne que você acha em cidadezinhas francesas.



Fair and balanced

Não, não é a Fox News. É a União Européia, nas palavras de seu presidente José Manuel Barroso (sim, o presidente da UE é portuga).

A União Européia e o Canadá, em particular, têm liderado o movimento pelo "pagamento igual" pelo qual os países mais pobres aguentariam parte da conta de diminuir o aquecimento global. E uma parte desproporcional da conta, obviamente, ou melhor, uma parte proporcional às emissões correntes. Noves fora as emissões totais dos países ricos ainda serem ligeiramente maiores do que as dos países remediados, e as emissões per capita ainda serem vastamente maiores.

Que tal fazer um trato, então, seu Barroso? Ao invés de os governos dos países fudidos e mal pagos da África pagarem a conta, que tal certas entidades sediadas nesses países fazerem isso diretamente. Afinal, enclaves de extração de recursos naturais, isolados do resto do país fisica e economicamente, são responsáveis por boa parte das emissões de gases do efeito estufa dos países em desenvolvimento. E remetem os lucros pra suas sedes na Europa e outros países desenvolvidos. No resultado final, o PIB do país aumenta, sem que um ceitil tenha ido parar nas mãos de qualquer habitante dele, exceto meia dúzia de políticos e tecnocratas. OK, e jagunços.

(O Brasil faz isso internamente, com o Sul Maravilha e Brasília pagando de "desenvolvidos." Um exemplo disso é a produção de alumínio na Amazônia.

17.9.09

Mais cristalino que cajuína

Rush Limbaugh diz o que muito conservador por aí tá fingindo que não diz.

com vídeo e tudo.


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Serra finalmente é forçado a apoiar publicamente a Yeda - aquela que suicidou o assessor que ia dar com a língua nos dentes.


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Posso repetir o gráfico do orçamento das IFES sob o príncipe dos sociólogos?

15.9.09

Pingos nos is

"Meu amigo Serra daria um bom presidente" - Frase da Soninha em entrevista recente. Ela sublinhou, ainda, que Serra é de esquerda e odeia o neoliberalismo.

Muita gente boa acredita nisso. Serra é ligado pela imprensa aos "desenvolvimentistas" e já ouvi até quem disesse que ele estaria "à esquerda da Dilma." E afinal ele foi militante de esquerda na juventude, né?

Pois bem, não, não é nem um pouco. Noves fora Serra ter sido parte do governo neoliberal de FHC durante todos os seus oito anos, ele como prefeito e governador de SP foi de direita, e radical. Mês passado, sancionou a lei abrindo caminho para a privatização (via OS) do sistema de saúde estadual. Revogou, assim que entrou na prefeitura, os programas de habitação social no centro de SP, para substituí-los por um projeto de concessão da área à iniciativa privada. Está construindo a "nova marginal," que vem a ser uma versão piorada da freeway de Paulo Maluf. Fala em "direitos humanos para os humanos direitos."

Ah sim, e pra deixar bem claro.

A opinião do secretário de meio ambiente do estado de Sâo Paulo sobre o ambientalismo: aqui e aqui.

A entrevista do secretário do emprego e das relações trabalhistas do estado de São Paulo no site do Olavo de Carvalho, que aliás é ele quem financia: aqui. E aqui a proposta dele contra a crise econômica.

Do secretário de educação, é só lembrar que ele foi ministro da educação no governo FH

Se alguém quiser votar no Serra, discordo mas nada contra. Se quiser votar no Serra achando que está votando em alguém de esquerda, ou que entre ele e a Dilma não há diferença ideológica, vai fazer papel de otário.

11.9.09

Barack HUSSEIN Obama

Assim como quando um operário virou presidente do Brasil, alguns anos antes, a eleição de um negro para a presidência dos EUA deixou certas pessoas em polvorosa. O nível dos ataques dirigidos contra Obama pelos republicanos não para de cair, e chegou nesse texto delicioso que achei:


1) The koran commands muslims to kill those who turn away from the islam. Barack Hussein Obama admits he was a muslim at one time. He claims he left it but if he did why didn't his parents, family, friends, ect., kill him?

2) Obama said the muslim call to prayer is "one of the prettiest sounds on Earth at sunset," and recited "with a first-class Arabic accent" the opening lines: allah is Supreme! I witness that there is no god but allah!" (In islam this phrase is called "the Shahadah" and reciting this phrase officially makes you a muslim.)

3) Obama's claims of conversion to Christianity only arose after he became politically ambitious.

4) Obama has never received baptism. He is not been born again. He cannot claim to be a Christian.

5) The islamic doctrine of taqiyya encourages adherents to deny they are muslim if it advances the cause of islam.

6) Obama believes in socialism, an antiChristian worldview.

7) Obama uses the muslim pronunciation for "Pakistan" rather than the correct American one.

8) Obama has chosen the Secret Service code name "Renegade". "Renegade" conventionally describes someone who goes against normal conventions of behavior, but its first usage was to describe someone who has turned from their religion. It is a word derived from the Spanish renegado, meaning "Christian turned muslim."

9) Obama received widespread vocal support from muslims during his campaign. Why would they vote for him unless they knew he was one of their own? (islam forbids obedience to political leaders if they are not muslim.)

10) Obama used his muslim middle name when sworn in as President.


(Confesso que li "coreano" ao invés de "Alcorão" na primeira linha)

10.9.09

Rodízio só de massa

O Instituto Estadual do Meio Ambiente do Rio, INEA, avisou que estuda fazer um rodízio de indústrias em Caxias. A notícia é meio estranha pelo fato de escolher Caxias; apesar da fama, o município não é o que mais sofre com poluição no estado, e olha que o estudo do IBGE foi feito antes da inauguração de uma siderúrgica gigante na Zona Oeste, e vários novos terminais de minério em Itaguaí.

O rodízio, como estratégia pra controlar a poluição, é tão imbecil quanto o rodízio de automóveis em São Paulo. Afeta indiretamente, e portanto de maneira difícil de controlar, o universo a ser modificado. Assim, em SP o rodízio provocou transtornos a empresas e pessoas de classe média e baixa, fez com que a classe alta passasse a comprar apartamentos de seis vagas na garagem (incentivando o megacondomínio), e no trânsito...fez diferença não. Aliás, como fica essa alegação de problemas em Caxias que teriam que ser resolvidos por uma medida alucinada dessas, em relação à autorização dada pelo próprio INEA, em tempo recorde, para a Thyssen-Krupp fazer uma megasiderúrgica no lugar que já era o mais poluído do estado?

A solução em ambos os casos é bem mais simples:

Em Caxias (ou outros lugares poluídos, incluindo São Paulo): imponha-se um teto de poluição. Quem quiser poluir mais do que esse teto paga. O teto baixa todo ano. Créditos podem ser negociados livremente entre as empresas.

Em São Paulo (e outros lugares poluídos e com problema de trânsito, incluindo Caxias): imponha-se pedágio urbano para circular na área interna da cidade. Qualquer carro que saia da garagem dentro da zona central, ou adentre a zona central, paga tantos reais por dia. (Em Londres, uns 30 se bem me alembro.)

9.9.09

Innumeracy parte 333

A Folha de São Paulo, no caderno de Dinheiro de hoje, anuncia que "Empresário do país trabalha 2.600 horas por ano para o fisco."

Alegadamente, segundo o Banco Mundial.


Acostumado com as mancadas da Folha, inclusive as de má-fé (como a ficha corrida da Dilma e a notícia de que "obra do PAC utiliza trabalho escravo, sobre uma obra que foi autuada pelo governo federal antes de começar o PAC), achei que tinha algo de errada na alegação de que o "empreendedor" brasileiro trabalharia o equivalente a 65 semanas por ano só pra pagar o fisco, ainda mais pensando num ano de 52 semanas.

Então que medida é essa, já que necessariamente não é a alegada pela folha? É o tempo, em horas/homens, necessário para que uma companhia que seja

Is a limited liability, taxable company. If there is more than one type of limited liability company in the country, the limited liability form most popular among domestic firms is chosen. The most popular form is reported by incorporation lawyers or the statistical office.
Started operations on January 1, 2007. At that time the company purchased all the assets shown in its balance sheet and hired all its workers.
Operates in the country’s most populous city.
Is 100% domestically owned and has 5 owners, all of whom are natural persons.
Has a start-up capital of 102 times income per capita at the end of 2007.
Performs general industrial or commercial activities. Specifically, it produces ceramic flowerpots and sells them at retail. It does not participate in foreign trade (no import or export) and does not handle products subject to a special tax regime, for example, liquor or tobacco.
At the beginning of 2007, owns 2 plots of land, 1 building, machinery, office equipment, computers and 1 truck and leases 1 truck.
Does not qualify for investment incentives or any benefits apart from those related to the age or size of the company.
Has 60 employees - 4 managers, 8 assistants and 48 workers. All are nationals, and 1 manager is also an owner.
Has a turnover of 1,050 times income per capita.
Makes a loss in the first year of operation.
Has a gross margin (pretax) of 20% (that is, sales are 120% of the cost of goods sold).
Distributes 50% of its profits as dividends to the owners at the end of the 2nd year.
Sells one of its plots of land at a profit during the 2nd year.
Has annual fuel costs for its trucks equal to twice income per capita.
Is subject to a series of detailed assumptions on expenses and transactions to further standardize the case. All financial statement variables are proportional to 2007 income per capita. For example, the owner who is also a manager spends 10% of income per capita on traveling for the company (20% of the expenses are purely private, 20% for entertaining customers and 60% for business travel).


consiga prepare, file and pay (or withhold) 3 major types of taxes and contributions: the corporate income tax, value added or sales tax and labor taxes, including payroll taxes and social contributions. Preparation time includes the time to collect all information necessary to compute the tax payable and to calculate the amount payable. If separate accounting books must be kept for tax purposes—or separate calculations made—the time associated with these processes is included. This extra time is included only if the regular accounting work is not enough to fulfill the tax ac counting requirements. Filing time includes the time to com­plete all necessary tax forms and file the relevant returns at the tax authority. Payment time is the hours needed to make the payment online or at the tax office. Where taxes and contributions are paid in person, the time includes delays while waiting.


Como indicador, é indevidamente complexo e questionável, como em geral o são as medidas do tipo do Banco Mundial. Mas reflete uma realidade: há burocracia demais no Brasil (se menos do que a indicada pela estatística, que ignora que a maioria das empresas de pequeno porte no Brasil paga SIMPLES). E nem de longe se compara ao que foi alegado pela Folha, que ainda por cima confundiu a coisa com as medidas ridículas do IBPT sobre "quantas horas se trabalha só para pagar impostos."

Ah sim, a Folha podia ter incluído na reportagem, já que menciona que a Colômbia do tudifófi Uribe é o melhor reformador da América Latina, o resto dos primeirões da turma:

Top 10 Reformers

1 - Rwanda

2 - Kyrgyz Republic

3 - Macedonia, FYR

4 - Belarus

5 - United Arab Emirates

6 - Moldova

7 - Colombia

8 - Tajikistan

9 - Egypt

10 - Liberia

3.9.09

Velha da garrafa de vinagre

Uma das coisas que sempre lamentei foi o fato de o Rio de Janeiro não possuir um aquário público decente. E sempre sou a favor da devolução da rua aos pedestres, que nunca deveriam ter sido dela expulsos. Então por que não posso me empolgar com as duas notícias de ontem, sobre aquário marinho no porto e pedestrianização da Rio Branco?

Bem, é que o diabo, como se sabe, mora nos detalhes. Eu queria um aquário bem maior, e no gasômetro, mas não é isso que me faz desgostar do aquário no antigo armazém da Cibrazem. É que o projeto

a) Não passou por concurso de arquitetura. E é além de horrível medíocre.

b) Tem uma concepção estranha prum projeto anunciado como parte de um processo de "revitalização" de uma área. Metade da área total do prédio será destinada a estacionamentos, e pelo que dá pra ver a idéia é que as pessoas cheguem de carro ou no máximo de van de excursão, e não, em hipótese alguma, a pé.

c) Será gerido por atores privados, com dinheiro público.

Bem, qualquer esmola é esmola, mesmo esse aquário é melhor que aquário nenhum. Mas não é o aquário dos meus sonhos... (No gasômetro, com o triplo do tamanho do tanque principal, e inteiramente público.)

Quanto à Rio Branco, o projeto em si (que é velho) não tem problema algum. (Quem acha que vai dar nó no trânsito superestima o fluxo próprio da Rio Branco). Problema tem que afundar partes da Rio Branco é tão caro quanto o projeto de afundar a Marginal, e com um retorno em termos urbanísticos muito menor. Não é como se o Rio estivesse nadando em dinheiro; num momento em que o saneamento básico é deficiente em toda a zona oeste, será que enterrar bilhões pra deixar a Rio Branco mais chique é uma prioridade?

Talvez seja por isso que a prefeitura mente falando em parque de "2 milhões de metros quadrados." (Algo entre a Quinta da Boa Vista e o Ibirapuera.) De verdade, a Rio Branco, da Candelária ao Aterro, tem 1.350m x 35m. Nas contas do Eduardo Paes, 1350x35 = 2.000.000; um parque de 2Km2 centrado naquele trecho da Rio Branco teria que incluir todo o terreno entre a Av. Paraguai e a Antônio Carlos.

Divertido é que O Globo repete a informação sem pensar, e complementa com o número de vezes que isso seria o Campo de Santana...

28.8.09

Wishful thinking

da Preta Gil, na capa da Marie Claire:

"Preta Gil enfim conhece o sucesso."


da prefeitura de São Paulo

"Menos da metade dos usuários de ônibus fretados paulistas passou a utilizar metrô ou trens da CPTM, ao contrário do que havia previsto a Secretaria Municipal dos Transportes antes de implementar a restrição. "


do governo de São Paulo

"Avelleda afirma, porém, que essa reavaliação não está relacionada à recente publicação do projeto do trem-bala Rio-São Paulo. Segundo ele, há a garantia de que não serão vendidas viagens entre São Paulo - com saída na estação do Campo de Marte -, e o aeroporto de Guarulhos. "O trem-bala não vai fazer viagens de São Paulo a Guarulhos.

Assim o projeto é complementar e não concorrencial. A parada em Guarulhos é de quem vem de Campinas ou do Rio de Janeiro", diz ele. Fontes da iniciativa privada que acompanham o projeto federal dizem desconhecer a existência de um acordo nesse sentido." (O trecho Guarulhos-São Paulo seria o mais lucrativo, e o segundo de maior faturamento, de um eventual trem-bala.)

20.8.09

Toro toro toro - marítimas II

Quando amigos meus do Rio vêm pra São Paulo, quase sempre falam em "comer sushi na Liberdade." E eu tenho que explicar pra eles que não tem sushi bom e barato na Liberdade, ou melhor, que não há relação nenhuma entre sushi e a Liberdade, pra mal ou pra bem. (Na verdade existe um excelente sushi no bairro, o Yassu.) Isso porque, quando os imigrantes japoneses vieram pra cá, não existia sushi como conhecemos hoje. O que era chamado de sushi à época era um peixe fermentado junto com arroz, mais ou menos similar ao surströmming sueco, feito com peixes de segunda que assim eram preservados por mais tempo. Longe da idéia de asseio que se tem quando pensa em sushi hoje em dia, o sushi era conhecido pelo fedor. O Akutagawa Ryunosuke, dos primeiros grandes escritores "à ocidental" japoneses, adorava, mas sacaneia o sushi de então o tempo todo - numa passagem narra como um cego sabia que estava chegando à cidade pelo cheiro das barraquinhas de sushi em torno do portão, proibidas de circular dentro da cidade; em outra, compara o cheiro ao de um rato morto.

O sushi como no-lo conhecemos, em que o principal ingrediente posto em cima ou dentro do arroz é o peixe cru, obviamente, depende da invenção da geladeira, e ficou realmente popular no Japão ao longo dos anos 20. E com essa popularidade, especialmente depois que o Japão ficou rico no pós-guerra, alguns peixes que antes eram completamente ignorados pelos pescadores japoneses viraram vedetes culinárias. O principal deles foi o atum azul - que já era pescado no Mediterrâneo desde a antiguidade, mas não era considerado peixe que se apresentasse pelos japoneses. Aliás, nem no Mediterrâneo - ele era salgado ou defumado pra ser vendido como proteína barata, como o bacalhau no Mar do Norte.

O atum de sushi não é o mesmo peixe que o atum enlatado; são espécies inteiramente diferentes. O atum enlatado enquanto nada se chama cavala, e é bastante abundante mundo afora. O atum propriamente dito, azul ou amarelo, também é extremamente comum - o problema é que, depois que inventaram o sashimi, a pesca dele ficou um tiquito demais. Quanto demais? Mais de três milhões e meio de toneladas de atum pescado demais. Pra por isso em perspectiva, isso quer dizer que tiram do mar atum o suficiente pra soterrar uma cidade do tamanho de Campinas. Todo ano. E aí, bem, o bichinho* tá em extinção.

Foram feitas várias tentativas, pelos diversos Estados em cujas águas se encontra atum e pelas organizações internacionais, de se controlar a pesca do atum, especialmente a do atum azul austral, o mais ameaçado. Todas elas foram ignoradas pela pesca industrial (pisconegócio?), seja na cara dura e através de suborno, seja através de maneiras criativas, como no mediterrâneo, em que atuns juvenis são capturados e engordados até chegarem ao tamanho mínimo para o abate. Fala-se dos pobres marinheiros capturados pelos piratas somalis, mas boa parte desses marinheiros estavam na Somália justamente porque, faltando Estado, lá podiam capturar atum impunemente. Pirataria também, de certa forma.

Hoje, o equipamento das frotas atuneiras está bem longe dos labirintos da Sicília etrusca. São navios de 200m de comprimento com fábricas internas e frotas de aviões com equipamento sensor para idenfiticar os cardumes. Faz sentido, já que um atum pode rodar até mil dólares o quilo no mercado de peixes de Tsukiji, em Tóquio. E, perversamente, quanto mais o peixe vai chegando perto da extinção, mais fica caro e vai aumentando o incentivo para pescá-lo a qualqur custo. Um dia, vai chegar ao ponto do bacalhau, que já foi o peixe mais abundante do mundo e hoje custa, por baixo, cem reais o quilo. (Do bacalhau verdadeiro, Gadus morua, chamado de bacalhau porto no Brasil. Os outros bichos vendidos como bacalhau no Brasil são de outras espécies.)

Duas notinhas pra chamar pro Brasil esse lamento de alguém que continua comendo maguro e se sentindo culpado por isso:

1. O governo criou uma secretaria, agora ministério, para incentivar a pesca. Inda se fosse a aquicultura...porque as águas brasileiras, pobres em pescado à exceção dos extremos sul e norte, já são sobrepescadas. É como se criassem um ministério da lenha pra incentivar o desmatamento.

2. A marinha, tão preocupada com hipotéticos e inúteis submarinos nucleares, não tem meios de impedir que três quartos da pesca em águas profundas no litoral brasileiro sejam praticados, ilegalmente, por barcos estrangeiros. Custaria, para adquirir esses meios, mais ou menos o preço de um dos quatro submarinos convencionais comprados da França.




*O "bichinho" na verdade é um monstro que pesa até meia tonelada e consegue passar dos 70Km/h, ou ficar meses a fio nadando a 40Km/h. Pense nisso da próxima vez que enfiar um sashimi na boca.

18.8.09

Marítimas

Depois de alegar que um submarino de setenta metros não cabe num dique de 200, agora a Marinha diz, pra defender a decisão do Nelson Jobim, que

Quanto ao aspecto apresentado como curioso, de a França não empregar o Scorpène, de fato, não só a França, mas nenhum dos países ocidentais que operam submarinos de propulsão nuclear, como os Estados Unidos, o Reino Unido, a própria França e a Rússia, empregam submarinos convencionais. Apenas a China opera ambos os tipos de submarinos.

Mais uma vez, a afirmativa passa do campo da discussão pro da ópera bufa. Bisoiando na internet, em cinco minutos se descobre que a Rússia opera 18 submarinos convencionais da classe Kilo e está preparando outra classe convencional.

Vamos deixar de lado a China, já mencionada por eles e que pode-se dizer que opera submarinos convencionais porque são mais baratos. A Rússia, mesmo enquanto potência mundial, continuou se dedicando a fazer submarinos convencionais, ao contrário dos membros ocidentais do clube dos cinco. Por que isso? Ou, melhor dizendo, por que os outros só usam submarinos nucleares? Afinal, ao contrário do Brasil, alguma estratégia militar eles têm pra justificar isso, e não só "urrú, vou compensar o tamanho minúsculo do meu pênis."

Submarinos têm quatro usos possíveis. Dois podem ser cumpridos por submarinos diesel-elétricos melhor do que por um nuclear, um pode ser cumprido melhor por um nuclear, e um exclusivamente por submarinos nucleares. São eles, pela ordem acima: atacar navios mercantes, atacar navios de superfície inimigos, caçar submarinos de mísseis balísticos, e carregar mísseis balísticos.

Isso porque submarinos convencionais podem desligar o gerador diesel e usar só a bateria para operar, e assim são - além de mais baratos - muito mais silenciosos quando em estado de alerta. Um submarino nuclear não pode desligar o reator, senão explode. Mas o submarino balístico, que tem que ficar literalmente meses a fio submerso, pra ser perdido pelos inimigos até quanto ao oceano em que está, tem que ser nuclear. E pra caçar um submarino nuclear, você precisa de outro, até porque um submarino nuclear consegue correr bem mais rápido do que um convencional.

Resumindo, como eu já disse no último post sobre isso: a única coisa que faz com que um submarino nuclear seja uma boa idéia é para uma guerra nuclear.

No caso dos EUA, com um orçamento militar do tamanho do PIB da Argentina e com dúzias de submarinos balísticos/caça-balísticos, simplesmente ficou mais fácil usar os submarinos caça-balísticos também pros primeiros dois papéis. Aliás, a superoferta de grana deles é tão grande que até usando caríssimos submarinos balísticos como baterias de tomahawks eles tão - um papel que qualquer bote com meia dúzia de tubos em cima poderia desempenhar.

No caso da dobradinha Marianne-Britannia, pode-se ver que os submarinos deles são todos dedicados ao fim do mundo da guerra nuclear. Não servem pra o que seria a função de um submarino brasileiro, a defesa ou ataque costeiros. Por isso que eles só têm os nucleares. Enquanto isso, a Rússia prevê defesa costeira e ataque ao comércio estrangeiro com submarinos - ergo, possui e desenvolve submarinos convencionais.

Claro que tudo isso é acadêmico, já que nada do que a Marinha está comprando tem serventia prática, assim como não a têm os Rafales que a Força Aérea quer comprar. Enquanto isso, o Brasil continua sem ter os navios-patrulha e radares necessários para vigiar direito a costa contra pescadores ilegais, navios mercantes que soltam óleo, o tráfico e contrabando ribeirinhos na Amazônia, e outras coisas realmente úteis para a sociedade. Porque isso não rende tanta grana sem licitação, nem compensa o micropênis.

Enfim, nada que mude a história das gloriosas forças armadas brasileiras.



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Só eu que sou burro? Porque um catamarã rápido, do tipo que é usado em pencas de lugares mundo afora, carregando carros e passageiros, faria o serviço centro do Rio - Angra em duas horas (parada na Barra da Tijuca nos primeiros 20 minutos), e Santos-Ubatuba em duas horas e meia (parada em Ilhabela aos 105 minutos). Enquanto isso, as classes média e alta paulistana e carioca se apinham em engarrafamentos de mais de quatro horas (Rio-Angra) ou até dez horas (SP-Ubatuba).

Acho que mesmo só Santos Dumont-Barra da Tijuca em 25 minutos, com um menos rápirdo, ia fazer sucesso. Ou dois pontos na Barra; um no Jardim Oceânico aos vinte e cinco minutos e outro no Recreio aos quarenta e cinco. Quem vai, hoje em dia, do Recreio ao Centro em três quartos de hora?

5.8.09

Escalas

Enquanto o debate político brasileiro é dominado pela surpreendente revelação de que Sarney é corrupto (só depois de 2003; antes não há o que se olhar), umas coisinhas de somenos importância passam batidas.

Tipo, por exemplo, a tentativa do maior e mais poderoso partido político brasileiro de facto, a bancada ruralista, de acabar de vez com a reforma agrária.

Miudezas.


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A "revitalização" da zona portuária carioca é anunciada faz um quarto de século. Tenho em casa, inclusive, o dossiê criado pelo Instituto Pereira Passos para uma exposição de 1999. Pelosvisto agora pode ser que saia alguma coisa, haja visto o interesse de Dudinha Paes em lucrar com a especulação imobiliária.

O interessante é que a maioria dos projetos de "revitalização" do mundo consiste na verdade de projetos de "gentrificação." Em alguns deles a intensidade de uso do local, definida como uma função da densidade populacional, do quantum de trocas comerciais feitas, e da quantidade de visitantes diários, diminui ao invés de aumentar, e só quem lucra é a especulação imobiliária.

No caso do Rio, logo o Rio tão afeto à exclusão social (que o diga César Maia, que achou por bem fazer uma sala de concertos na Barra da Tijuca), o curioso é que essa lógica pode não acontecer. Isso porque a zona portuária não é simplesmente uma zona empobrecida; é uma zona abandonada mesmo. Os armazéns que uma vez serviram para carga geral não servem mais para as operações portuárias de hoje em dia, e ocupam a maior parte da área; hoje, a maioria é usada por escolas de samba para montagem de carros alegóricos. E o projeto tem surpreendentemente poucas intervenções negativas na área onde moram as pessoas, e surpreendentemente muita preocupação com moradia social.

Algumas coisas relativamente baratas e muito importantes faltam nele, na minha modesta opinião: uma atitude responsável para com a arquitetura. E fazer uma segunda cidade do samba, ou uma expansão da atual, para abrigar as escolas de samba que não conseguiram ir para a atual. Ah sim, e sepultar de vez a idéia de usar os cais da Gamboa e do Santo Cristo para movimentar cargas, e fazer do gasômetro (que está sendo desativado) um aquário público.

E uma coisa ele tem em comum com os projetos acima aludidos: o gasto público. A prefeitura garante que o dinheiro que ela vai gastar virá da cobrança de permissões de construir, mas as maiores obras previstas - novos píeres de passageiros no cais e um túnel substituindo a Perimetral´do aterro até o Moinho Fluminense - serão feitas com recursos da União. Por outro lado, é uma área bastante grande, e já com toda a infraestrutura de transporte e saneamento no lugar (e até superdimensionada). Para desenvolver uma área equivalente "virgem," se gastaria mais do que vai se gastar pra enterrar a Perimetral.

27.7.09

Obama vs. the space cowboys

E o Obama pelo visto roubou os holofotes dos astronautas...

Do Pew Center



Mais a sério, o Obama sozinho respondeu por mais ou menos metade do baque sofrido pela ciência; o timing da pesquisa, afinal de contas, foi meio infeliz nesse sentido, já que ela foi feita menos de um ano depois do evento épico* em questão. Mais interessante é que subiu em nove pontos o "não sei/nenhum." O americano hiperorgulhoso de seu país e/ou tecnófilo vai virar coisa do passado?

*Em cinco cânticos:

Obama e Ron Paul
McCain e Palin
Condoleeza e Petraeus
Johnny Depp
Os quatro cavaleiros do apocalipse

24.7.09

Foi Malufe quem fez!

Pouco após sair o dado de que a poluição em São Paulo é pior ainda do que se pensava, a dupla Serra-Kassab, que já havia encampado a freeway proposta pelo Maluf durante a campanha, só que pior ainda, anuncia um par de projetos viários meio inúteis, ligando trechos do da Zona Oeste entre si (entre Corifeu e Eliseu de Almeida viaduto, entre Vila Andrade e Marginal Pinheiros túnel), ao módico custo de concretar dois parques e gastar R$1,3bn.

O melhor da piada? A obra é parte de uma "operação de revitalização urbana."

23.7.09

Top Secret

A mais nova alegação do Nelson Jobim pra compra sem licitação e superfaturada de submarinos franceses é que a Odebrecht e a estatal francesa DCN é que a falta de licitação se deveu à necessidade de sigilo do projeto. Sigilo. O hômi só faltou bater bumbo. Aliás, tem um mapa razoavelmente detalhado da futura base de submarinos de Sepetiba no número de Julho da revista Portos e Navios. Que, diga-se de passagem, ficaria na mesma área da expansão prevista para o Porto de Itaguaí, e muito mais próxima de olhares curiosos.

Não sou engenheiro naval, muito menos especialista em submarinos. Mas alguns dos outros argumentos (noves fora a própria profusão deles) alegados pela Marinha parecem suspeitos. Um deles é de que o Arsenal de Marinha não comportaria uma obra do porte de um submarino nuclear. Ora, o dique seco do Arsenal de Marinha tem 230x38x14m. O submarino francês nuclear de ataque Barracuda (que não tem nada a ver com o Scorpène, projeto franco-espanhol destinado à exportação para o terceiro mundo) tem 100x8x7m. O Schuka russo, o maior submarino de ataque nuclear do mundo, tem 112x13,5x9,6m. O maior submarino do mundo, o SSBN* Akula, tem 175x23x12m.

A Marinha também alega que a base de Sepetiba é prevista desde 93, e portanto não foi uma inflação de custos do consórcio DCN-Odebrecht. Ora, quem tinha alegado que a base (e o custo dela) eram imposição dos franceses foi o Nelson Jobim. Nas suas palavras, Nós não temos nada a ver com isso. Compramos um pacote pronto. O fato de a França colocar as obras em mãos da Odebrecht tem a ver com um acordo de parceria realizado entre eles

Outro argumento é de que os alemães concorrentes não estariam dispostos a transferir tecnologia. O problema é que eles já fazem isso; só o primeiro dos submarinos vendidos pela HDW ao Brasil foi construído na Alemanha, e eles são orgulhosamente apresentados como exemplo de uma estratégia de "atingir o domínio completo da tríade PROJETO, CONSTRUÇÃO e REPARAÇÃO."

Ah sim. A DCN pelo visto é useira e vezeira.

L'affaire DCN concerne la mise en cause des pratiques de corruption, d'atteintes à la vie privée et d'espionnage, de déstabilisation de ses concurrents mis en place par cette entreprise (possédée à 75 pour cent par l'État) pour obtenir des marchés à l'extérieur[1].

Como o Nelson Jobim, aliás.

Pelo menos no caso da Força Aérea a licitação já está aí há tempos. Mas o Sarkozy não deixou de encher de mimos os parlamentares brasileiros que possam ter alguma influência. Milton Temer, sem nenhuma vergonha, disse que se deixar paparicar no Lutetia por uma empresa interessada numa licitação é um "lobby saudável."

*SSBN quer dizer "perdeu preibói." São os submarinos de mísseis balísticos que ficam passeando por aí, esperando a ordem pra acabar com o mundo. (Um Akula, que é o Outubro Vermelho do filme, carrega 200 ogivas cada uma 10 vezes maior do que a bomba de hiroshima.) Aliás, a única função de um submarino nuclear de ataque como o que o Brasil quer fazer é caçar os SSBNs; pra qualquer outra coisa um submarino convencional é melhor.


PS só eu acho esquisito um desfile militar imperialesco no 14 de Julho? Ainda se fosse no 18 de Brumário...