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17.5.16

Ajuste sinistro

Convencionou-se, no Brasil, que responsabilidade fiscal é um tema "de direita." Soluciona-se todos os problemas do Brasil seja com a eliminação da corrupção e incompetência (tema que irmana todos que não são, naquele momento, governo), seja com a "auditoria da dívida," que depende de não entender como funciona uma dívida pública e achar que foi um contrato de dívida emitido lá atrás pelo FH ou pelo JK que ainda está sendo pago.

E no entanto, dá pra fazer o ajuste fiscal tão sonhado pelos economistas de direita de uma forma bastante diferente da normalmente assumida. O Brasil - já é quase consenso - é um país em que os impostos indiretos, que pesam mais sobre os mais pobres e atrapalham a economia, são os principais, enquanto os diretos, que pesam sobre renda e patrimônio e portanto sobre os mais ricos, são acessórios. Para inverter essa lógica E fazer o ajuste nas contas públicas, é só

1) Aumentar impostos diretos (IRPFITRITDIPTU (estes últimos subnacionais)). O ITR hoje não morde nem um bilhãozinho; é menor do que o IPTU arrecadado por São Paulo ou pelo Rio. O IRPF para alguém entre os 5% mais ricos não vale 17% (contra 34% nos EUA, que não são exatamente comunistas). O ITD tem alíquota máxima de 8%, vs., de novo nos EUA, 40%. O IGF, que ainda não existe fora da constituição, renderia mais uns trocados. Aumentar o preço da gasolina, sim, que transporte individual motorizado não precisa de subsídio público. Transformar a CIDE numa taxa de carbono, e razoavelmente pesada. 

2) Quando o ajuste tiver sido feito desse jeito, e a necessidade de segurar as pontas tiver passado, cortar os impostos indiretos federais o máximo possível, e incentivar que estados e municípios façam o mesmo. Com sorte, extinguir o IPI, pelo menos, quiçá o ISS, diminuir bastante o ICMS (e unificá-lo num IVA nacional, sempre cobrado no destino). Pode-se até estabelecer a regra de redução dos impostos indiretos já na legislação que aumenta os progressivos. Coisa do tipo "a cada ano, deverão ser feitas desonerações permanentes em tais e tais impostos, equivalente à média do aumento real de arrecadação dos últimos três anos."

Presto: Ajuste nas contas públicas feito com bônus estrutural. 

O bônus não é pequeno. Noves fora a diminuição dos indiretos aumentar a competitividade da economia brasileira, a desigualdade, que se reduziu com a implantação dos benefícios sociais e o crescimento maior de regiões mais pobres (boa parte da desigualdade brasileira é a desigualdade regional), parou de descer nos últimos anos, devido aos limites dessa política. Ora, nos EUA a diferença entre a desigualdade pré e pós impostos é de 0,11 Gini. Isso é 0,11 de diferença a mais do que no Brasil. Sim, os impostos brasileiros não fazem diferença alguma na desigualdade. Admita-se que é um mal continental... reparem no gráfico: a desigualdade latinoamericanaé maior "no mercado" realmente, mas ela fica muito maior depois que os impostos progressivos e benefícios idem fizeram a sua parte na Europa.



A longo prazo, aliás, a redução da desigualdade também é um projeto de responsabilidade fiscal.  E o aumento do ITR pode servir como instrumento de reforma agrária.

É claro, pode ser perguntado, como faz o Ciro Gomes, se isso "dá bilhão." E a resposta é, muito claramente, sim. Vamos fazer umas continhas:

O ITR, hoje, não dá nem um mísero bilhão, cobrado sobre propriedades que valem um trilhão de reais. Se aumentarmos a alíquota média pra 1,5%, estamos falando de 15 bilhões de reais. Para 3% (em linha com o fato da maioria das terras estarem hoje com latifúndios), 30bn.

A alíquota média do IRPF para os 5% mais ricos está abaixo de 20%. Se aumentarmos para 30%, em linha com o IRPF cobrado pelo governo federal americano (muitos estados americanos também dão sua mordida), a arrecadação adicional pode ser de 60bn. Se além disso acabarmos com a isenção sobre dividendos, coisa em que o Brasil é quase único no mundo, são outros 60bn.

Comparado a esses números, o imposto sobre grandes fortunas é até modesto - seriam por volta de 6bn.

Para resolver a penúria estadual, ao invés de enfiar bizarros juros simples retroativos na União, a proposta (até modesta, comparada com a maioria dos países) de aumento do ITCMD renderia 20bn.

Estamos falando de um ajuste de no mínimo, dando um desconto de 30% em todas as previsões acima, 120bn. Bem mais do que o ajuste proposto pelo governo interino, e sem afetar a imensa maioria da população.

"E não vai cortar nada?" Bem, primeiro acho uma falácia falar em cortar gastos (assim, de baciada; aumentar a eficiência do gasto público sempre é bom) "pelo ajuste." Um gasto público deve ser cortado se for desnecessário, com ou sem ajuste, e se é necessário não pode ser cortado, com ou sem ajuste; usar o ajuste de desculpa para cortar os gastos que você queria cortar de qualquer jeito é hipocrisia. Mas pode deixar que tem uns gastoszinhos que, bem, eu cortaria com a desculpa do ajuste:

O ministério da Defesa gasta 81bn; é um dos maiores orçamentos de defesa do mundo, maior que o de Israel. E em troca temos forças armadas er... não tão boas quanto as de Israel, digamos. O principal dos problemas é o enorme gasto de pessoal, inchado pelas pensões e pelo oficialato, e portanto difícil de resolver de chofre - mas o fim do alistamento obrigatório e a redução do contingente grande de recrutas pra metade dessa quantidade de militares profissionais já ajudaria. Uma revisão do oficialato também - o Brasil tem 29 generais e almirantes, contra 39 dos Estados Unidos. Nos EUA, um vice-almirante comanda uma esquadra; aqui, há 18 vice-almirantes, e não há 18 navios de combate principais na marinha brasileira. (São oito fragatas mais o porta-aviões que mal sai do cais.)  E o problema do muito cacique pra pouco índio continua quando se desce a escada. É difícil dizer quanto seria poupado pela revisão, mas 20bn (deixando dez para o aumento do investimento e custeio) tá de bom tamanho. Além disso, para o ajuste emergencial, daria para vender as vastas áreas militares já inúteis para a defesa nacional e encravadas em áreas caras das capitais. Só o campo de futebol do forte de Copacabana ou o forte da Urca já dariam bilhão. Cada. Isso tudo, claro, assumindo que as forças armadas são mesmo necessárias, num nível melhor que o de hoje. Se você considerar que não há nenhum cenário de invasão plausível, e mal há possível, pode cortar logo 60bn, mantendo só uma força de autodefesa básica, com princípios baseados em defesa antiaérea, bateria de costeira, e treinamento de guerrilha, ao invés de tanques e porta aviões que ninguém sabe pra que serviriam. E ainda diminui o golpismo.

O governo também segue subsidiando hidrocarbonetos, sob a desculpa do estímulo à atividade econômica e aos transportes. Ora, é um subsídio pra lá de mal focado: se queremos subsidiar atividade econômica, subsidie-se aquela área específica.  São outros 30bn por ano...

Ok, temos 210bn de ajuste, à sinistra. Nada disso é indiscutível, claro - mas seria interessante se fosse mais discutido pela esquerda, ao invés desta defender que responsabilidade fiscal é besteira. Até porque tudo isso é, ou talvez devesse ser, para a esquerda bem-em-si. 

22.1.16

Impostos IV - Herança

O imposto sobre heranças é uma das maiores conquistas liberais, apesar de em geral se associar liberais apenas ao corte de impostos. Isso porque uma das premissas básicas do liberalismo - a de que haja algum nível de, se não igualdade, paridade de oportunidades - é minada pela transmissão intergeneracional de riqueza. Em algum momento, o acúmulo intergeneracional significa, de facto, uma diferença intransponível, mesmo depois de abolidos os privilégios hereditários de jure que faziam com que só alguém que fosse um fidalgo (um filho de alguém, literalmente) pudesse carregar uma arma de fogo ou espada, usar roupas vermelhas, ou sapatos ridículos. O imposto sobre as heranças serve de freio a essa trasmissão intergeneracional. Claro que o Thor Batista vai continuar sendo bilionário herdando qualquer proporção maior do que 3% da fortuna paterna, mas para a grande massa das classes média e alta, o imposto aumenta notavelmente a mobilidade social.

É um ponto em que acho que não fui claro o suficiente nas outras defesas de aumento de impostos sobre patrimônio e renda: esses impostos são bens em si, e não um jeito de o Estado aumentar sua arrecadação (e com isso cortar impostos que são prejudiciais à economia, como IPI e quejandos). Um imposto que diminua a vantagem de um fidalgo moderno significa mais mobilidade social, o que imagino que seja universalmente considerado uma coisa boa. Entre o imposto sobre herança e o ITR, a reforma agrária se daria pela lógica tributária, sem precisar de desapropriação do INCRA. O IRPF alto gera incentivos à doação e à poupança. Um imposto sobre dividendos alto incentiva o reinvestimento de lucros na própria empresa. (No Brasil, ao contrário, dividendos são obrigatórios.)

Então, vamos comparar o imposto sobre a herança no mundo e aquele no Brasil?

Brasil: Federal 0%, estaduais de 0 a 8% - mais comum sendo por volta de 4.
EUA: Federal até 55%, estaduais entre 0 e 10% - mais comum sendo uns 6
França: até 60%
Alemanha: até 50%
Reino Unido: até 40%
Rússia: até 13%
China: não há. (Outro ponto importante: é o Estado que garante a transmissão de bens e direitos; a taxa cobrada sobre essa transmissão é mais legítima que qualquer outra por causa disso. Na China, essa transmissão não é tão segura assim...)

2.7.14

Mais médicos mais caros, ou, de como a desigualdade é um problema financeiro

Em meio à disputa sobre o programa Mais Médicos, uma das questões mais citadas pelos defensores do programa foi o alto valor das bolsas pagas aos médicos participantes, chamados pelos seus detratores de "escravos." Com efeito, as bolsas que o governo pagará aos médicos situariam alguém entre os 3% mais ricos dos assalariados (caso representassem salário bruto, e não líquido). Mesmo o quinhão do custo dos médicos cubanos que ficará com os próprios, de 4.000 reais, situariam os cubanos entre os 10% mais ricos. Entretanto, não se viu, numa cena política pródiga de jacobinos, ninguém que considerasse esses valores demasiado altos, senão para ironizar os médicos que os desprezavam. Não deixa de ser curioso compará-los com os valores pagos a médicos que praticam a residência obrigatória no serviço público em outros países: eles vão de nada (Itália) a um pouco menos da renda per capita (Reino Unido), em geral. No Brasil, a "escravidão" vale dez rendas per capita.

Não se trata, aqui, de enfatizar o quão generosa é a oferta do governo (e registre-se que em outros países com serviço compulsório especificamente voltado para áreas carentes, a oferta pode ser muito mais generosa em outros quesitos, como preferência para especialização). O governo não está sendo generoso, mas oferecendo o mínimo possível. Isso porque o tal salário de dez mil reais líquidos não é significativamente superior à renda média dos egressos de medicina - dependendo de a quem você pergunta, entre 20% e 50% maior. Os médicos são considerados arrogantes e insensíveis por não se candidatarem ao Mais Médicos, mas você aceitaria ganhar 20% a mais do que ganha em São Paulo para trabalhar num lugar em que só se chega em lombo de burro ou canoa? O comportamento dos conselhos de medicina é francamente deplorável, mas essa equação simples, feita pela maioria dos médicos que nem protagonizaram cenas de racismo explícito para ser contra, nem se juntaram ao programa, é bastante razoável. A pergunta poderia ser "por que no Brasil dez  rendas per capita são insuficientes, e no Reino Unido menos de uma é razoável, como salário para um médico ou outro profissional qualificado"? E o que creio é que a resposta a essa pergunta é necessária para qualquer projeto de Brasil, e que ela é simples. Chama-se desigualdade.

É necessária porque o ponto em comum de todas as múltiplas e díspares reinvindicações que foram às ruas em Junho de 2013 é que não querem algum tipo de estado minarquista, mínimo, em que os fracos não têm vez e o darwinismo social impera. Pelo contrário, mesmo aqueles que reclamavam de altos impostos reinvindicavam, ao mesmo tempo, sistemas públicos de saúde e educação melhores. Ora, a não ser que a idéia seja reinivindicar uma versão contábil de "sejamos realistas, reinvindiquemos o impossível," essa conta não bate, nas condições atuais - a não ser que a idéia seja o "desenvolvimento" como panacéia, e bem, mesmo descontando aqueles dos marchantes que são contra o desenvolvimentismo, os que são a favor tampouco sabem de verdade como conseguir esse mítico desenvolvimento rápido. São poucos os países que conseguiram pular de patamar de renda, e a maioria em situações de crise aguda infinitamente mais graves do que as do Brasil de hoje e/ou com a ajuda direta das potências centrais, por suas próprias razões geopolíticas. E com enorme sacrifício do povão enquanto o desenvolvimento não chegava, no mais das vezes.

Então, se desenvolvimento é algo que não se gera apenas com vontade, e se o que se quer é mais dinheiro pra saúde e educação, precisamos de mais impostos sobre o dinheiro que há, ou mais eficiência ao gastá-los, ou os dois. E eficiência no gasto não é algo que depende apenas da qualidade ou da honestidade de nossos gestores públicos; como tanta coisa, depende também de fatores estruturais e infraestruturais. Os estruturais, como a péssima lei de licitações, são relativamente mais fáceis de enfrentar. Com os infraestruturais, voltamos ao problema do primeiro parágrafo. Médicos são apenas uma das diversas categorias de profissionais altamente educados necessárias para um estado moderno funcionar, principalmente na provisão de saúde e educação aos seus cidadãos (em outros campos do estado, os profissionais não são menos educados, mas são em menor número). E profissionais desse nível de educação ocupam um local proporcionalmente alto na escala de rendimentos. O resultado inevitável - poder-se-ia quase dizer aritmético - disso é que quanto mais ampla essa escala, quanto maior a desigualdade, mais caro é o Estado para um mesmo patamar de serviços. A desigualdade brasileira torna o Estado menos eficiente, faz com que seja mais difícil prover saúde e educação. Não é apenas uma questão de justiça.

Não é um processo muito complicado. A expectativa de renda de uma pessoa não é ilimitada (como proposto por algumas escolas econômico-filosóficas) mas, empiricamente, ancorada numa noção de renda justa que tem muito a ver com a renda observada do mesmo estrato social. Médicos, advogados, e professores, e outros profissionais, parte de uma elite social por um zilhão de motivos (inclusive a reprodução intergeneracional de seu capital social ostensivamente meritocrático), e tem suas expectativas de renda balizadas pelo seu entorno. O Estado, portanto, (como qualquer empregador) a longo prazo terá o salário médio de seus profissionais qualificados puxado para a média dos salários de elite, ou bem terá que conviver com a insatisfação crônica desses profissionais e, no limite, o abandono por parte deles das carreiras públicas. E agora vou além do que falei sobre o desenvolvimento: não adiantaria de nada aumentar o PIB, porque esse balizamento é em boa parte feito comparativamente, e não em termos absolutos. A vida material de alguém de classe média-média hoje é bem mais abastada do que a de alguém mais rico em 1900; isso não muda suas classificações. A desigualdade brasileira baliza expectativas de desigualdade também - é a indignação com um professor ganhando o mesmo salário de alguém com menos educação, frequente mesmo entre quem se considera de esquerda. Aliás, fazendo uma enquete informal com amigos que se definem como de esquerda ou até socialistas, a diferença de renda considerada razoável entre um professor universitário e um de 1º grau é de 3x, e entre este e um faxineiro, de outras 4x. Dá mais do que a diferença entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres na maioria dos países do mundo (entre o prof. universitário e o faxineiro), e coisa próxima à diferença entre os 20% mais ricos e a média da população (entre o prof. universitário e o escolar) no Brasil. Mesmo acha errada a diferença de renda baliza suas expectativas de renda nela.

Vamos fazer uma simplificação tosca para a conta de como isso afeta as finanças públicas ficar mais fácil: Falemos de duas nações, Laputa e Houyhnhn. Em ambas, os funcionários públicos qualificados - médicos, professores universitários, promotores, auditores, e quejandos - representam 5% da população. Em ambos, os governos têm como prioridade o bom funcionamento dos serviços públicos, então o salário médio de seus funcionários está em linha com suas expectativas, isso é, em linha com os rendimentos do quintil (20%) mais rico da população. A diferença é que em Laputa, o quintil mais rico ganha 3,6x mais que o PIB per capita, enquanto em Houyhnhn, mais igualitária, o quintil mais rico ganha apenas 1,7x o PIB per capita. Pois bem, para fazer funcionar a contento sua máquina pública, Laputa gastará 18% do PIB só em salários de funcionários qualificados, enquanto Houyhnhn gastará 8,5% do PIB com os mesmos funcionários. Laputa e Houyhnhn são os nomes de países visitados por Gulliver, mas os dados de desigualdade são os do Brasil e do Japão, respectivamente.

Vamos lá: o simples fato de a desigualdade ser menor no Japão faz com que seu governo, para prover os mesmos serviços aos cidadãos, possa ter uma carga tributária 10% menor. O equivalente a desonerar o tal "setor produtivo" de toda a arrecadação direta estadual brasileira. Não é uma discussão pequena, em tempos em que hospitais erguidos não funcionam por falta de médicos, e universidades novas não conseguem achar professores. Na mesma tradição da direita que, previdente, pretende reformar a previdência pensando no longo prazo, os efeitos de uma redução de 10% na carga tributária no longo prazo não podem er subestimados. Sem coração de banana, sem questões abstratas de justiça, sem o medo de madame Guilhotina que já anima alguns megaempresários mundo afora. E quais seriam as ferramentas apropriadas para diminuir a desigualdade? Oras, impostos sobre a renda e patrimônio das pessoas físicas. Não é uma discussão teórica, é o que foi feito no mundo pós-guerra, e funcionou. É simples e calculável. O imposto sobre grandes fortunas, um aumento do IRPF, do imposto sobre a herança, do IPTU, não são apenas jeitos de se arrecadar mais dinheiro para o governo, mas jeitos de fazer esse dinheiro render mais.

28.2.13

Impostos II - o Imposto Territorial Rural

Existe um abaixo-assinado no momento que conclama as pessoas a votarem por uma proposta de limite à propriedade da terra. Com ressalvas, assinei o mesmo. Mas ele é completamente desnecessário. Por que? Porque a grande concentração de terra pode ser coibida sem se mexer no direito à propriedade, simplesmente através do artifício de se cobrar impostos - foi como os grandes latifúndios europeus foram destruídos, aliás, e note que as reformas agrárias diretas em lugares como Japão e México passaram por convulsões sociais, e não por processos costumeiros de democracias liberais.

No post anterior, eu comento sobre o imposto de renda pra pessoas físicas, que arrecada patéticos 70bn de reais, uma proporção mínima do total arrecadado pelo governo. Pois bem, o ITR é muito, muito, muito pior. Para se ter uma idéia, enquanto o município de São Paulo arrecada coisa de 4,6bn de IPTU, o Brasil arrecada de ITR exatos R$ 454.622.399,00 Todos os proprietários de terras no Brasil, juntos, pagaram por suas propriedades menos de um quinto do que foi arrecadado com as loterias da Caixa. Menos do que foi arrecadado com tarifas de embarque em aeroportos. Quando você tem um dos impostos básicos sobre a propriedade arrecadando menos do que taxas de embarque, você tem um problema.

No papel, o ITR seria até mais progressivo que o imposto de renda. Ele tem, afinal, tarifas que vão de zero (proprietário residente e trabalhando, só ou com a família, na própria propriedade rural, com menos de 50 hectares) a 20% (propriedades com mais de 5.000ha). O probleminha aí no meio foi o combate ao "latifúndio improdutivo." Eu já havia reclamado antes por aqui desse adjetivo que fez com que o problema do latifúndio se deslocasse do seu domínio socioeconômico para um "atraso" técnico-econômico, que faz com que a reforma agrária no Brasil ande a passos de cágado. Ora, essa mentalidade fez com que o ITR fosse compensado por um "grau de utilização," que daria direito a descontos na alíquota, criando assim, ao invés das alíquotas simples, uma matriz, assim:



"Grau de Utilização" é simplesmente a porcentagem da terra arável (isto é excetuando mata nativa e congêneres) efetivamente aproveitada em atividades produtivas. Isso realmente é problemático para o "latifúndio improdutivo," que justamente por conta disso vem cada vez mais desaparecendo no Brasil. Por outro lado, como grandes proprietários têm, não apenas mais recursos para utilizar a terra, mas também melhores advogados para alegar que estão utilizando a terra (ou que a não-utilizada está na categoria isenta de impostos), a progressividade do imposto, para além daquela isenção familiar que não aparece na tabela, fica definitivamente diminuída, com o imposto de grandes proprietários mais ou menos igual ao dos pequenos, na prática. E esse imposto é de 0,4%.

Claro que isso oficialmente. Na prática, como no caso do IPTU, o valor oficial da terra é bem menor que o valor de mercado - ou alguém acha que o total das propriedades rurais do Brasil vale pouco mais de R$100bn? Mas mesmo sem o caro e controverso processo de atualização dos valores da terra, a arrecadação do imposto poderia aumentar substancialmente, simplesmente reconhecendo-se A) que a terra "improdutiva" não é, ao contrário do pregado pelo projeto da alta modernidade, inútil, e que pelo contrário a plena utilização da terra é em si problemática para o meio ambiente e o valor futuro da propriedade, e B) que o latifúndio é um problema em si, e não apenas quando improdutivo.

Eliminando-se o Grau de Utilização e fixando-se as alíquotas assim:

isenção para agricultura familiar
até 50ha 0,05%
50-200 0,20%
200-500 2,30%
500-1.000 4,00%
1.000-5.000 9,5%
5.000+ 20,00%

teríamos um ITR arrecadando mais de 18bn por ano - e, mais importante, nivelaríamos um pouco as condições entre pequenos e grandes proprietários. E o imposto de 20%do valor da terra ao ano praticamente "proibiria" as propriedades de mais de 5.000ha, ou 50Km2.

Atualização: achei as tabelas de valor de pastagens e lavouras. São respectivamente 2700 e 5500R$/ha em média no Brasil como um todo. São 180Mha de pastagens e 64Mha de lavouras. Dá valores de 486 bilhões e 352 bilhões. Somados, 838 bilhões de reais. Com uma arrecadação de 454 milhões, tem-se que a alíquota média cobrada é de 0,05% E não é porque a maior parte dessa terra tá na mão de minifúndios familiares. Muito pelo contrário:


(Tabela tirada daqui )

 E subestimei horrivelmente a possibilidade de arrecadação - levando pra 4% de média já seriam uns 30 bilhões por ano. Dilma não luta de tudo que é jeito pra aumentar a folga no orçamento? Atualizar as tabelas de valor de terra não depende do Congresso, e já renderia uns 3 bilhões no mínimo.



17.10.12

Carta aos reaças II

Sou - creio - meio chato na tecla de se reduzir a desigualdade através do aumento dos impostos de renda e patrimônio. Isso porque acredito que a igualdade é um bem-em-si; o golfo social entre eu e outros privilegiados, de um lado, e a massa maior do outro me incomoda mais até do que o golfo entre eu e os "1%" do movimento Occupy wall street. Mas existe um motivo bom, liberal-ortodoxo em economia, para reduzir a desigualdade, e que não tem nada a ver com socialismo, fraternidade, ou outras questões de bichinha coração de banana. É que a desigualdade aumenta os custos do Estado. E, afinal de contas, reduzir custos, especialmente os do Estado, é uma das bandeiras mais velhas do liberalismo. Foi a bandeira da criação do semanário inglês The Economist, cujo nome antedata a profissão de economista, e se refere à frugalidade.

Não é um processo muito complicado. A expectativa de renda de uma pessoa não é ilimitada (como proposto por algumas escolas econômico-filosóficas) mas, empiricamente, ancorada numa noção de renda justa que tem muito a ver com a renda observada do mesmo estrato social. As consequencias disso para o gasto do Estado se devem ao número de profissionais altamente qualificados que são necessários para a manutenção dos serviços públicos, desde a implantação de princípios ostensivamente meritocráticos para a burocracia de Estado na Prússia e na França (ok, e bem antes disso na China). Esses profissionais, parte de uma elite social por um zilhão de motivos (inclusive a reprodução intergeneracional de seu capital social ostensivamente meritocrático), e tem suas expectativas de renda balizadas pelo seu entorno. O Estado, portanto, (como qualquer empregador) a longo prazo terá o salário médio de seus profissionais qualificados puxado para a média dos salários de elite, ou bem terá que conviver com a insatisfação crônica desses profissionais e, no limite, o abandono por parte deles das carreiras públicas.

Vamos fazer uma simplificação tosca pra exemplificar a conta: Falemos de duas nações, Laputa e Houyhnhn. Em ambas, os funcionários públicos qualificados - médicos, professores universitários, promotores, auditores, e quejandos - representam 5% da população. Em ambos, os governos têm como prioridade o bom funcionamento dos serviços públicos, então o salário médio de seus funcionários está em linha com suas expectativas, isso é, em linha com os rendimentos do quintil (20%) mais rico da população. A diferença é que em Laputa, o quintil mais rico ganha 3,6x mais que o PIB per capita, enquanto em Houyhnhn, mais igualitária, o quintil mais rico ganha apenas 1,7x o PIB per capita.* Pois bem, para fazer funcionar a contento sua máquina pública, Laputa gastará 18% do PIB só em salários de funcionários qualificados, enquanto Houyhnhn gastará 8,5% do PIB com os mesmos funcionários.

Vamos lá: o simples fato de a desigualdade ser menor em Houyhnhn faz com que seu governo, para prover os mesmos serviços aos cidadãos, possa ter uma carga tributária 10% menor. O equivalente a desonerar o tal "setor produtivo" de toda a arrecadação estadual brasileira. Não é uma discussão pequena, em tempos em que hospitais erguidos não funcionam por falta de médicos, e universidades novas não conseguem achar professores. Na mesma tradição da direita que, previdente, pretende reformar a previdência pensando no longo prazo, os efeitos de uma redução de 10% na carga tributária no longo prazo não podem er subestimados. Sem coração de banana.


*Sâo as razões brasileira e japonesa, respectivamente.

2.5.12

Brasil País do Chá II

A única menção ao imposto de renda no site do PSoL é um projeto para isentar o gasto com livros técnicos. (Ie subsidiar a educação privada.) A proposta progressiva de impostos se resume ao imposto sobre grandes fortunas. O PDT só fala em impostos progressivos de maneira genérica. No site do PT, até fala-se sobre o tema aumento de imposto de renda, mas de concreto, só a isenção de participação nos lucros por trabalhadores. PSB: Niente.

Guglando, vê-se dúzias de projetos de isenções, alguns revogando isenções, mas nenhum aumentando as alíquotas de impostos sobre renda e propriedade (IRPF, ITR, ITCMD, IPTU). O governo petista diminuiu os impostos sobre ganhos de capital e não aumentou nenhum imposto, fora taxas de importação.

Nem o governo de centro-esquerda nem nenhum dos partidos de esquerda com alguma projeção, com exceção do PSTU, defende aumento de imposto de renda, que dirá algo comparável ao possível futuro presidente da França, que pretende levar a alíquota máxima para três vezes a brasileira (hoje é o dobro).

Enquanto isso, meu aumento na prestação do plano de saúde foi inteiramente pago pelo Leão, e a conta de luz brasileira tem os encargos mais caros do mundo.

Depois o país do Tea Party são os EUA. Aqui eles nem gritar precisam - apesar de toda a ladainha da imprensa sobre "carga tributária" (ladainha feita de meias-verdades, já que aumento de carga não quer dizer aumento de impostos), político nenhum pensa em aumentar impostos individuais.

26.4.12

2+2=?


No post anterior sobrehttp://sambadoaviao.blogspot.com/2010/03/rabeira.html> imposto de renda, comentei que em outros países as alíquotas de imposto de renda haviam caído, conquanto ainda fossem em geral bem maiores do que no Brasil. Pois bem, a Economist nos fez a gentileza de mostrar essa queda em forma gráfica. (A alíquota máxima brasileira é de 27,5%, um pouco abaixo do México.)
Ah sim, curiosamente, a evolução tem uma correlação inversa fortíssima com a evolução do índice de Gini dos mesmos países. Que coisa.

14.9.11

País do chá

Uma das coisas que sempre me surpreendem no debate público brasileiro é a quase total ausência de propostas de aumento de impostos nele. Pelo contrário, parece que todos interiorizaram o discurso do (desonesto grupo de lobby de tributaristas) IPT e seu impostômetro, e exorcizam a malfadada carga tributária. Mas quando se fala em diminuir o déficit fiscal, ninguém fala em aumentar impostos, só em cortar custos. Quando se fala em aumentar as possibilidades de ação do governo, ninguém fala em aumentar impostos para fazer isso. Mesmo quando se fala em aumentar impostos, é na ficção de uma "CPMF," um imposto que seja invisível e carimbado. Ora, a "classe média" brasileira, isto é, os 20% mais ricos, ainda pode sustentar um bom aumento de imposto (que não seja para pagar a mesma coisa que os outros quintis de renda). Não vou me estender sobre isso porque clicando na tag "impostos" aí embaixo vai ter um monte de posts sobre o assunto. E tanto a direita (que se reinvindica fiscalmente responsável) quanto a esquerda (que quer aumento da presença do estado e abatimento dos juros) teriam todo o interesse em aumentar esses impostos. Até a indústria teria esse interesse - zerar o déficit público significaria um abatimento rápido da taxa de juros.

Em outras palavras, os partidos brasileiros, todos, repetem o mantra do TEA party americano. Não aumentar os impostos. OK, alguns até falam - mas são sempre impostos que acham que não caem em ninguém, seja pela sua invisibilidade (CPMF) ou por atingirem apenas meia dúzia de pessoas míticas ("imposto sobre grandes fortunas"). IRPF a níveis americanos pós-Bush (44% de alíquota máxima, dependendo do estado) que é bom, necas. O que é mais curioso ainda num momento em que, internacionalmente (e curiosamente) você tem um monte de bilionários pedindo para pagar mais imposto, como o Bill Gates, o Warren Buffet e o Luca di Montezemolo, dono da Ferrari. Então por que diabos nem o PSoL fala em aumento do IRPF, e entra na prática no discurso da classe média sofrida?

(Aliás, podiam aproveitar a revisão do IRPF para eliminar o financiamento público de saúde e educação privadas para a classe média. Tem dependente? Teu desconto é x. Pronto. Se você quer fazer plano de saúde é problema seu.)

20.6.11

Quem paga mais?

Segundo o estudo da UHY - sindicato internacional de contadores, o brasileiro que levar 200.000 anuais de salário bruto está bem melhor do que seus iguais em outros países. O que faturar 25.000, nem tanto. A carga tributária (contando previdência) sobre o primeiro é de 26% de sua renda, sobre o segundo 15,9%. No primeiro caso, é a quinta mais leve dos países pesquisados, no segundo está ali pelo miolo, entre as mais pesadas.

Aviso: pelo estudo, poderia-se crer que a carga tributária brasileira é progressiva. Só que mesmo o pobre-coitado que leva só míseros 32.000 reais líquidos pra casa no final do ano, coitadinho, ainda está entre os 20% mais ricos da população. Então esse imposto "progressivo" brasileiro só o é dentro do universo dos 20% mais ricos; quando se diz que a carga brasileira é regressiva, está se falando de uma comparação entre grupos maiores. E, claro, mesmo dentro desse grupo restrito, a comparação não leva em conta incentivos tributários ao investimento...

26.4.11

Impostos III - o IPTU

A imprensa brasileira nunca se cansa de fazer invectivas, geralmente se apoiando no IBPT, contra a carga tributária. Noves fora que o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário é um grupo de lobby e propaganda de advogados tributaristas, o que nunca é mencionado, o curioso é que o tom das matérias sempre é acusatório ao governo federal. E nos oito anos do governo Lula, com exceção da majoração do IOF para operações exteriores recente, não se viu nenhum aumento de imposto federal. Pelo contrário, o que houve foi uma redução gradual de alguns impostos, incluindo aí o imposto de renda de pessoa física.


Enquanto isso, os estados de São Paulo e Minas Gerais, cujos governos são cantados em verso e prosa como o supra sumo da moderna, eficiente, e limpinha administração pública, são esses sim responsáveis por seguidos aumentos de impostos. Alguns chegam a ser obscenos, como a guerra fiscal que majora o ICMS de produtos que não são produzidos no próprio estado (a contrapartida imbecil de redução de imposto o faz quanto a importados que entram por seus portos). Outros são simplesmente um aumento de imposto para fazer caixa. E além do aumento propriamente dito, inventaram uma esperteza chamada antecipação de imposto. É assim: ao invés de pagar o imposto apenas depois de vender a mercadoria, o comerciante tem que pagá-lo no ato de sua aquisição prévia. Vale para quaisquer produtos adquiridos de outros estados, bem como certas categorias de produtos (eg bebidas). Na prática, para os comerciantes, tem todo o efeito de um aumento de 8-10% no imposto.


Agora, Kassab quer, na mesma linha, antecipar o IPTU de construção e reforma em São Paulo;. Isto é, pretende que você comece a pagar por um imóvel antes que ele fique pronto. A medida, obviamente, desestimula (como o fazem os impostos sobre produtos como o ICMS) a atividade econômica, já que aumenta o custo do investimento. Por algum motivo, não vi muita grita contra da Míriam Leitão ou do pessoal da Folha.


E olha que eu, pessoalmente, sou extremamente a favor do aumento e da progressividade do IPTU, e da sua utilização como instrumento de estímulo a determinadas práticas. Só que ao contrário do que o Kassab (que só quer fazer caixa) está fazendo. O IPTU, hoje, responde por uma fatia da arrecadação da maioria dos municípios brasileiros menor do que a do ISS, além de não ser progressivo. Há até um monte de gente alegando (e às vezes sendo confirmado pelo juiz) que o IPTU progressivo é inconstitucional, mas como o argumento deles é de que qualquer imposto progressivo é inconstitucional, e o imposto de renda está aí, prefiro ignorá-los.


O problema do IPTU pagar pouco no Brasil está dividido em duas partes: uma, menos importante, é que a alíquota em si é, comparando com outros países, geralmente baixa. Nos EUA, onde é em geral fortemente progressivo (como era, até o Reagan, o IRPF), o IPTU varia entre 0,2 e 4% - no Brasil, gravita em torno de 1%; a outra, muito pior, é que, como no caso já mencionado do Imposto Territorial Rural, os valores das propriedades para cobrança do IPTU estão, quase sempre, enormemente defasados. Agora vou defender o Kassab - quando ele tentou atualizar os valores do IPTU, aí sim viu-se uma gritaria da imprensa, principalmente da Folha de São Paulo. O resultado final é que um apartamento de 350.000 paga 600 reais por ano de IPTU - menos, provavelmente, do que qualquer outra conta paga mensalmente pelo cidadão. Ou seja, o sujeito paga mais por eletricidade OU por telefone do que por: recolhimento de lixo, ruas asfaltadas, trânsito, escolas fundamentais, comida vistoriada pela vigilância sanitária, hospitais, limpeza de ruas, centros culturais, iluminação de ruas, parques... garanto que se o Ibirapuera fosse privado, muita gente pagaria 50 reais por mês só pelo acesso a ele, e entretanto paga-se hoje 50 por mês por ele mais tudo isso.


E o pior - ao arrecadar pouco, o IPTU também perde força quando usado (como já começou a ser feito em algumas cidades brasileiras) como instrumento contra a especulação imobiliária. O aumento do IPTU para lugares mantidos vazios morderia bem mais se o IPTU já fosse um pouco mais alto; do jeito que está, passa de muito pouco para pouco. Aliás, o IPTU fortemente progressivo serviria até, ao desestimular um pouco a valorização excessiva, para conter um pouco a especulação imobiliária tão malvista por aí...

8.2.11

Diamantes da rainha

Uma das jóias da coroa do sistema educacional e cultural brasileiro é o "Sistema S," especialmente os SESCs do estado de São Paulo. Não há quem não elogie algo como o SESC Pompéia, da arquitetura do local à qualidade dos eventos e cursos disponíveis ali, e os cursos do sistema S são geralmente considerados dos melhores cursos técnicos disponíveis no Brasil. Neste exato momento, o sistema, graças a uma correção de custos que poderia ser acertada com o governo, é a grande esperança da presidenta Dilma para cumprir sua promessa de expandir a quantidade de vagas no ensino técnico, de que o Brasil tem necessidade urgente.

E pur, este post é uma chamada à sua dissolução, ou pelo menos à sua refundação. Porque o sistema S, criado inicialmente pelo Estado Novo, o sistema coaduna bem com os ideais fascistas-corporatistas daquele período. Afinal, tire-se a ditadura e a xenofobia, e o fascismo nada mais é do que a expressão máxima do dito de que "o que é bom para a GM é bom para os Estados Unidos." É o corporatismo, em que a disputa entre grupos na sociedade é sublimada (ou antes reprimida a ferro e fogo, na realidade), e empresas e estado formam um todo contínuo a tutelar trabalhadores felizes. Assim, a contribuição legalmente obrigatória ao sistema é gerida, não pelo estado, sequer por órgãos independentes colegiados, mas pelas respectivas associações empresariais. O SENAI/SESI é gerido pela CNI, eg.

Qualquer um que não subscreva ao ideal do estado corporativo fascista pode, imagino, perceber sem muita dificuldade os problemas envolvidos em se entregar o principal sistema de educação profissional do país aos empresários da área, sem controles externos (governo e trabalhadores têm apenas um arremedo de controle na estrutura do sistema S, que é presidido estatutariamente pelas confederações patronais). Ou de se entregar a uma entidade dirigida pro empresários, sem controle externo, dinheiro de impostos. Mas a coisa não para por aí. A administração do SESC é descentralizada - que bom, não? Não, porque isso inclui a arrecadação e o dispêndio. Assim, os estados mais ricos e com mais emprego formal gozam de mais dinheiro (público) tanto para o ensino técnico quanto para atividades recreativas e culturais.

O resultado é mais uma faceta de um Brasil profundamente desigual: não apenas o nosso sistema de arrecadação e dispêndio concentra (hoje menos) riquezas nas mãos de classes sociais mais ricas, mas também nas mãos dos estados mais ricos; e o SESC é objetivo de fundos complementares do governo, periodicamente. Ao contrário da maioria dos países, em que regiões mais ricas subsidiam as mais pobres num esforço de equalização, no Brasil é o contrário.

A solução nem é particularmente complicada: demova-se as confederações patronais de sua liderança automática para fazê-las serem apenas parte do conselho que elegeria livremente a administração, junto com os trabalhadores e o governo federal; faça-se com que a arrecadação seja nacional, e distribuída entre os SESCs estaduais numa base per capita - não dos trabalhadores registrados no setor, mas da população (ou, para realmente inverter o hoje praticado, per capita ponderada pela renda inversa).

E este último ponto é o problema principal, e insanável, do SESC a meus olhos: para ele, o cidadão e o trabalhador se confundem. Só é cidadão quem produz. Admita-se, é mais razoável do que o cidadão-consumidor ou até o cidadão-contribuinte, mas ainda assim é problemático, de um ponto de vista humanista - e mais ainda ao se lembrar que se está falando, não de todo mundo que trabalha, mas daqueles inseridos em relações de trabalho formais, o que ainda está longe de representar a maioria da sociedade brasileira. E quando contrastado o sistema S com a penúria de ofertas educacionais e culturais de baixo custo na sociedade brasileira em geral, fica inevitável a idéia de que o SESC cria uma clivagem a mais entre proletários e lumpens - pelo menos originalmente, de forma deliberada.

15.9.10

Propostas que ninguém vai ler I - Impostos progressivos

Recentemente, o sindicato do funcionários da Receita apresentou ao presidenciável socialista Plínio de Arruda Sampaio uma proposta que eles chamaram de "reforma tributária progressiva." A proposta me chocou um pouco porque, noves fora eliminar algumas distorções e falhas de nosso sistema tributário,* (o que eu apóio), de progressiva ela não tem muito. Pelo contrário, quando fala da distribuição tributária propriamente dita, cai no velho chavão de que o trabalhador assalariado é vítima do imposto de renda que deve ser "atualizado" (eles querem dizer diminuído; atualizado ele já é, anualmente).

Ora, o imposto de renda de pessoa física, o famoso leão, é, no Brasil, banguela de marré de si. Vejamos como (atenção: números chatos adiante).

Muita gente acredita na bobagem de que "alguém que ganhe logo menos do que a alíquota do imposto de renda vai perder dinheiro se ganhar mais, porque vai ser taxado em mais. Como diria o Morbo do Futurama, não é assim que funciona. Você continua sendo taxado à mesma alíquota sobre o dinheiro ganho até x; a alíquota superior só incide sobre os ganhos acima de x. Fazendo a hipótese de que você fosse taxado em 10% acima de 100 reais, e 50 acima de 200, alguém que ganhe 300 pagaria

0% sobre os primeiros 100
10% sobre os 100 entre 100 e 200 = 10
50% sobre os últimos 100 reais = 50

No total, 60 reais, ou 20%, apesar de um terço de sua renda já estar na alíquota de 50%. Ora, é claro que no Brasil, ao contrário de outros países, a alíquota máxima não chega nem perto disso, e é de 27,5%. As alíquotas brasileiras são:

0% até R$ 1.500
7,5% de 1.500 até 2.246
15% de 2.246 até 2.995
22.5 de 2.995 até 3.743
27,5% acima de 3.743 reais por mês.

Ora, quem é o "pobre trabalhador assalariado" que paga isso? Vamos dar uma olhada nos decis de renda domiciliar per capita no Brasil (isto é, qual a renda média em cada 10% da população), em R$:

MÉDIA GERAL 1.078
10% mais pobres: 208
293
366
488
586
732
947
1327
2225

Em outras palavras, quem paga imposto de renda está entre os 20% mais ricos da população brasileira. Não só isso; alguém que ganhe 2.500 reais, ou seja mais do que a média dos 10% mais ricos, pagará

0% de 1500 + 7,5% de 746 + 15% de 244 = R$ 93, ou um pouco mais de 4% de sua renda, no total. Ou um pouco menos que uma assinatura de tv a cabo média.

Mesmo se você der todos os descontos possíveis e imagináveis nessa conta, resta a evidência de que menos de um quarto da população ativa sequer declara, quanto mais paga imposto de renda. São 24 milhões de declarações para uma PEA de uns cento e poucos milhões de pessoas.

Não parece tanto assim, né? Claro que alguém que ganhe mais que 2.500 vai pagar mais, mas mesmo no limite não tanto assim. E alguém pra quem uma alíquota de imposto de renda ou duas acima dos 27,5% faria diferença percentual é alguém que, definitivamente, não vai morrer de fome por conta dessas novas tarifas; no máximo vai ter que reduzir a idade dos vinhos ou aumentar a idade dos carros.

Por isso que eu, ao contrário do sindifisco, proponho não só não "atualizar" a tabela do imposto de renda de pessoas físicas como também inserir mais duas alíquotas

35% acima de 7.000
45% acima de 14.000

Com essa mudança, que afetaria coisa de 5% da população, poderíamos ver a arrecadação do Imposto de Renda de Pessoa Física dobrar, de 65bn para 130bn. (Hoje, o IRPF constitui menos de um terço do imposto sobre a renda, e cerca de um oitavo das receitas correntes da União, excluídas as receitas da seguridade social. Ou um quinze avos do total de tributos e contribuições.) Isso permitiria, se a idéia fosse não alterar a carga tributária, zerar o IPI. Lembrando que os produtos que tiveram o IPI zerado seletivamente durante a crise viram um aumento de 15 a 30% a.a. na sua produção...

*Apesar de uma delas, a de cobrar IPVA de lanchas e aviões, me incomodar um pouco do ponto de vista lógico - o IPVA não tem a função de justiça social ou arrecadação, mas de pagar pelas ruas, estradas, e engenharia de trânsito. Não existe infraestrutura pública grátis que jatinhos e lanchas possam utilizar.

2.8.10

Os trilhos e a locomotiva

O Globo e o Estadão denunciam, apoiados em estudos do IBMEC: com os 36 bilhões do trem-bala entre o Rio e Campinas daria para construir mais de 200Km de metrô. A preocupação dos dois com transporte urbano é tocante, apesar de não se estender à denúncia da conversão, acertada entre a prefeitura do Rio e o Comitê Olímpico Internacional, do que seria uma ligação por trilho por uma autopista com ônibus rápidos, de modo a permitir que esta fosse usada pela "família olímpica" e carros privados, mas tudo bem.

O que é um pouco curioso é que o grande amigo dos diretores do Globo e do Estadão, o governo de São Paulo, alardeia para quem quiser ouvir (e para quem não quiser também, com um investimento quase bilionário em publicidade) que, ao custo de 20 bilhões, está construindo 16Km de metrô. Enquanto o Globo consegue pagar menos de 180 milhões por Km de metrô, o governo de SP paga 1.250 milhões, só míseros 1.070 milhões a mais. Talvez fosse o caso de as famílias Marinho e Mesquita avisarem a seus amigos no governo onde estão comprando metrô baratinho - espero que não seja no camelô ne na Daslú.

Outra curiosidade dessa construção de metrô é que ela é alardeada como uma prova da eficiência do governo paulista. Ora, é antes uma prova do dinheiro disponível. Afinal, São Paulo não é apenas o estado mais rico do Brasil, tanto em termos da riqueza total quanto da por cabeça: é também o beneficiário de uma legislação fiscal no mínimo curiosa. Responda rápido: qual o governo estadual brasileiro que recebe mais dinheiro da produção de petróleo? Se respondeu Rio de Janeiro, errou: o Rio recebe royalties que valem mais ou menos uns dois terços do valor que São Paulo recebe de ICMS.

O ICMS, maior imposto cobrado no Brasil, é regulado pela Lei Kandir. Incide sobre a venda ou circulação de qualquer bem ou serviço, e é cobrado na origem, isto é, no local de produção, com a única exceção, explícita, de produtos energéticos (petróleo e eletricidade) e lubrificantes. Ora, isto quer dizer que, quase explicitamente, beneficia São Paulo (e em menor escala, Santa Catarina) em detrimento do resto da federação. Se essa cláusula fosse eliminada, a arrecadação de São Paulo diminuiria em 16 bilhões por ano - quase, anualmente, o total investido em metrô ao longo destes últimos oito anos. O Rio ficaria com a maior fatia disso, 10bn. Espírito Santo, Paraná e Pará ganhariam pouco mais de um bilhão cada; e os outros 2 bilhões iriam para o resto da federação.

É isso mesmo: o estado mais rico do Brasil recebe, por lei, um subsídio especial tirado dos outros estados. Um pobre consolo é que, pelo menos, os estados mais afetados negativamente por essa cláusula são, com a exceção do Pará, também ricos. Por outro lado, essa situação mudará com as novas hidrelétricas amazônicas, acrescentando Rondônia à lista.

Nem essa situação é nova, no Brasil. São Paulo não ganhou sua preponderância econômica devido ao acaso nem à virtude quase-racial do povo paulista ainda ensinada em algumas escolas. O Brasil, longe de "tirar dinheiro dos homens de bem do sudeste para sustentar os vagabundos nordestinos," sempre tem transferido renda, via governo nacional, dos estados mais pobres para os mais ricos, desde o fim do século XIX. Tome por exemplo os imigrantes: aprendemos na escola que os primeiros imigrantes, destinados a substituirem os escravos, comeram o pão que o diabo amassou, o que é verdade. O que é menos mencionado é que a imigração, parte de uma política de branqueamento racial deliberada, era subsidiada pelo governo nacional. E que após essa primeira leva, os imigrantes receberam vantagens econômicas diretas do governo nacional e daquele da província de São Paulo.

Outras transferências abundam: assim, na República Velha, a função principal do governo federal parecia ser garantir os lucros dos cafeeiros. Quando começou a industrialização pesada sob o Estado Novo, as instalações ficaram todas no Rio e em São Paulo. Os subsídios à indústria se intensificaram com Juscelino, e novamente, numa visão curta da eficiência do investimento, se incentivava a indústria do sudeste e o extrativismo em outras regiões; assim, mesmo coisas alegadamente destinadas a promover outras regiões funcionavam como as ajudas externas americanas destinadas a minas na Guiné; a zona franca de Manaus é uma meia exceção.

O sudeste brasileiro é a região mais rica, e dentro dele São Paulo é o estado mais rico, por vários motivos. Um dos pouco mencionados, e dos mais importantes, é que o governo brasileiro não transferia renda regressivamente apenas no campo do indivíduo, mas também entre regiões. Isso agora está começando a mudar, com a atuação do BNDES direcionada a novos empreendimentos industriais no nordeste e o bolsa família. Mas só começando. Assim, não é de se surpreender que enqunato nos EUA o estado mais rico, Maryland, tenha uma renda (70.000USD) de um pouco menos do que o dobro do mais pobre (37.000, Mississippi), no Brasil essa diferença é de um pouco menos de cinco vezes. (SP R$ 22.000, Piauí 4.500). A diferença entre a renda per capita do Sudeste, excluída Minas Gerais, e a do Brasil é similar à diferença entre Maryland e o Mississippi, o que é ainda mais grave se levarmos em conta o quanto a região, com quase um terço da população brasileira, distorce o dado nacional.

Por isso que, mais uma vez, digo: menos mal que, pelo menos, sejam atualmente o Rio e o Paraná os financiadores do metrô de São Paulo. Pelo menos não é o Piauí.

10.3.10

Rabeira

Situando o que disse ontem sobre por mim aumentarem os impostos sobre a renda e o patrimônio, uma comparação da alíquota máxima de imposto de renda no Brasil com alguns outros países (incluindo nos outros países, quando for o caso, impostos de renda subnacionais - aliás uma outra idéia boa, substituir o ICMS por impostos de renda estaduais):


Rússia: 13%
República Tcheca: 23%
Brasil: 27.5%
México: 28%
Índia: 30%
Argentina: 35%
França: 40%
Portugal: 43%
EUA: 43%
China: 45%
Itália: 45.2%
Japão: 50%
Canadá: 53%
Alemanha: 53%
Finlândia: 53.75%
Dinamarca: 59%
Bélgica: 61%
Noruega: 62%
Suécia: 77%

(Em vários dos países europeus acima, quase todos, os impostos foram reduzidos bastante nos anos 90 e 2000. A maior redução foi na Finlândia, em que o imposto nacional máximo caiu de 60 para 30, enquanto os regionais se mantiveram em 22.)
(Em quase nenhum dos países acima se tem a dedução de imposto de renda pelo acesso a serviços médicos e educacionais privados; em compensação, na Europa há deduções para filhos.)

9.3.10

Palavrões III - Carga tributária

Faz alguns anos que se pode ler, em todos os grandes jornais brasileiros, diatribes contra a (sempre crescente) "carga tributária." A intensidade dessas diatribes aumentou quando o governo federal passou a ser de um grupo que não goza das simpatias do oligopolio da mídia, claro, mas mesmo no período FH podia-se ler os artigos anunciando sua subida, às vezes num tom quase apocalíptico. Só que a maioria das pessoas - incluindo os jornalistas que escrevem isso, não sabe direito o que é "carga tributária," só que é "ruim." Então, por partes:

1) "Carga tributária" é usado no lugar de "impostos" quando se tenta auferir o que mudou na arrecadação sem que o governo fizesse nada. O Governo aumenta ou diminui impostos; a carga tributária pode aumentar, por exemplo, num ano em que muita gente sobe de renda e passa a pagar mais imposto de renda. Ou diminuir num ano em que o contrário aconteça. Quando se lê sobre "o governo ter aumentado a carga tributária,´" isso é um artifício retórico, quando não é ignorância vinda da inércia mesmo.

2) O artifício retórico é por conta de os maiores grupos de lobby do Brasil - a Febraban, a Fiesp, e a CNA - sempre quererem menos impostos, por motivos óbvios. E pelo Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, que principalmente depois da eleição do sapo barbudo virou queridinho da imprensa. Ora, o IBPT é um "instituto" que vende serviços tributaristas. Tem interesse na histeria sobre impostos pelo mesmo motivo pelo qual uma empresa de segurança tem interesse na histeria sobre segurança. E é francamente desonesto. Exemplo: ele calcula a carga tributária de modo diferente do empregado pelo Ministério da Fazenda. Até aí tudo bem, legitimo (mas engraçado que esse modo mude constantemente, sempre de modo a preservar o valor básico de ela ser maior que a oficial). O que é enganação da braba é que aí eles comparam a carga tributária brasileira (pelos critérios deles) com a de outros países (por critérios iguais aos da Fazenda).

3) Então, falando de impostos. Que impostos federais aumentaram nos últimos oito anos? Nenhum. Voluntariamnete (caso do IPI, do IR, de algumas tarifas) ou involuntariamente (caso do IPMF), o governo federal tem diminuído seus impostos nos últimos anos. Alguns governos estaduais, principalmente São Paulo, Rio, e Rio Grande do Sul, têm compensado com aumento dos impostos estaduais, é verdade. Por outro lado, a imensa maioria dos municípios tem diminuido impostos.

4) E finalmente: quem disse que aumentar impostos é axiomaticamente ruim? Eu queria muito que se aumentasse os impostos sobre a renda e o patrimônio no Brasil. Mais duas alíquotas de IR e IPTU e ITR progressivos já bastava. Só pra lembrar: nos EUA, a alíquota máxima de imposto de renda por muitos anos foi de noventa e um por cento. E, ao contrário do que preveriam teorias declaradamente anti-empíricas tipo a curva de Laffer (que pode ser vista no gráfico mais patético de todos os tempos), esses anos foram os de crescimento econômico mais acentuado.

10.11.09

Tobin e Strauss Kahn, no parque se beijam

OK, OK, não é uma taxa Tobin. O Dominique Strauss-Kahn, mulherengo profissional e diretor do FMI nas horas vagas, diz isso com todas as letras.

Ainda assim, é interessante que o FMI esteja propondo um imposto internacional, o que até há pouco tempo atrás seria um tabu completo. Pessoalmente, sou mais a favor de uma taxa Tobin de verdade - digamos, 0,005%, o que desestimularia um pouco a especulação, e arrecadaria uns cinquenta bilhões de dólares por ano - por baixo - pra se destinar à ONU, que por enquanto tem que mendigar dinheiro pra agências de pouca importância como o Programa Mundial de Alimentação e a UNICEF.

Alguém não gosta da ONU, ou acha que a turma reaça dos EUA que crê em helicópteros pretos? Tranqs, destine-se ao invés disso os proventos da taxa Tobin pra sanar as dívidas públicas dos países mais pobres, em ordem ascendente de IDH. Dava pra zerar o total em menos de quatro anos. (Hoje em dia, vários dos LDCs dedicam mais de 40% da arrecadação pública ao pagamento de títulos da dívida.)

9.9.09

Innumeracy parte 333

A Folha de São Paulo, no caderno de Dinheiro de hoje, anuncia que "Empresário do país trabalha 2.600 horas por ano para o fisco."

Alegadamente, segundo o Banco Mundial.


Acostumado com as mancadas da Folha, inclusive as de má-fé (como a ficha corrida da Dilma e a notícia de que "obra do PAC utiliza trabalho escravo, sobre uma obra que foi autuada pelo governo federal antes de começar o PAC), achei que tinha algo de errada na alegação de que o "empreendedor" brasileiro trabalharia o equivalente a 65 semanas por ano só pra pagar o fisco, ainda mais pensando num ano de 52 semanas.

Então que medida é essa, já que necessariamente não é a alegada pela folha? É o tempo, em horas/homens, necessário para que uma companhia que seja

Is a limited liability, taxable company. If there is more than one type of limited liability company in the country, the limited liability form most popular among domestic firms is chosen. The most popular form is reported by incorporation lawyers or the statistical office.
Started operations on January 1, 2007. At that time the company purchased all the assets shown in its balance sheet and hired all its workers.
Operates in the country’s most populous city.
Is 100% domestically owned and has 5 owners, all of whom are natural persons.
Has a start-up capital of 102 times income per capita at the end of 2007.
Performs general industrial or commercial activities. Specifically, it produces ceramic flowerpots and sells them at retail. It does not participate in foreign trade (no import or export) and does not handle products subject to a special tax regime, for example, liquor or tobacco.
At the beginning of 2007, owns 2 plots of land, 1 building, machinery, office equipment, computers and 1 truck and leases 1 truck.
Does not qualify for investment incentives or any benefits apart from those related to the age or size of the company.
Has 60 employees - 4 managers, 8 assistants and 48 workers. All are nationals, and 1 manager is also an owner.
Has a turnover of 1,050 times income per capita.
Makes a loss in the first year of operation.
Has a gross margin (pretax) of 20% (that is, sales are 120% of the cost of goods sold).
Distributes 50% of its profits as dividends to the owners at the end of the 2nd year.
Sells one of its plots of land at a profit during the 2nd year.
Has annual fuel costs for its trucks equal to twice income per capita.
Is subject to a series of detailed assumptions on expenses and transactions to further standardize the case. All financial statement variables are proportional to 2007 income per capita. For example, the owner who is also a manager spends 10% of income per capita on traveling for the company (20% of the expenses are purely private, 20% for entertaining customers and 60% for business travel).


consiga prepare, file and pay (or withhold) 3 major types of taxes and contributions: the corporate income tax, value added or sales tax and labor taxes, including payroll taxes and social contributions. Preparation time includes the time to collect all information necessary to compute the tax payable and to calculate the amount payable. If separate accounting books must be kept for tax purposes—or separate calculations made—the time associated with these processes is included. This extra time is included only if the regular accounting work is not enough to fulfill the tax ac counting requirements. Filing time includes the time to com­plete all necessary tax forms and file the relevant returns at the tax authority. Payment time is the hours needed to make the payment online or at the tax office. Where taxes and contributions are paid in person, the time includes delays while waiting.


Como indicador, é indevidamente complexo e questionável, como em geral o são as medidas do tipo do Banco Mundial. Mas reflete uma realidade: há burocracia demais no Brasil (se menos do que a indicada pela estatística, que ignora que a maioria das empresas de pequeno porte no Brasil paga SIMPLES). E nem de longe se compara ao que foi alegado pela Folha, que ainda por cima confundiu a coisa com as medidas ridículas do IBPT sobre "quantas horas se trabalha só para pagar impostos."

Ah sim, a Folha podia ter incluído na reportagem, já que menciona que a Colômbia do tudifófi Uribe é o melhor reformador da América Latina, o resto dos primeirões da turma:

Top 10 Reformers

1 - Rwanda

2 - Kyrgyz Republic

3 - Macedonia, FYR

4 - Belarus

5 - United Arab Emirates

6 - Moldova

7 - Colombia

8 - Tajikistan

9 - Egypt

10 - Liberia

17.7.09

Mais gringos do que os gringos

Já começaram a espalhar fofocas sobre a secretária da receita Lina Vieira. Meio surreais as "acusações," visto que os próprios auditores foram quem reclamou da destituição dela, mas...

De verdade, de verdade mesmo, Lina Vieira caiu por dois motivos. Um por ter incomodado a Petrobrás, ainda por cima no momento em que a empresa virou campo de batalha entre o governo Lula e a oposição. O outro, por ter anunciado em alto e bom som - e posto em prática - o foco nos grandes sonegadores ao invés dos bagrinhos.

Falar mal dos altos impostos virou moda no Brasil. Eu por mim queria era que eles aumentassem. Especificamente, o IPTU, IRPF, e um imposto sobre entrada de capital.

Enquanto isso, a câmara dos deputados dos EUA propõe aumentar o IRPF dos pobrezinhos que ganham mais de 350.000USD por ano em 5,4%. Só pra situar, atualmente a alíquota máxima de IRPF federal nos EUA é de 35%, e estados cobram até 12%. No Brasil, a alíquota máxima é de 27.5%, e estados não cobram nada separado. (O IRPF cobrado pela receita federal é dividido com eles.)


*********************

Vai virar estupro transar - consensualmente - com menores de 18 anos.

26.6.08

Programa de estímulo à indústria alheia

Um artigo da ADITAL sobre os locautes na Argentina, além de interessante por si só, me faz pensar na Lei Kandir, que isenta de ICMS os produtos básicos (commodities) destinados à exportação. Isso é, que funciona basicamente como o contrário das retenções argentinas. Poderia ser chamada de "estímulo à desindustrialização," ou de "estímulo à indústria alheia." Graças à diferença é que, eg, desde 96 o Brasil tem aumentado a exportação de soja bruta, enquanto a Argentina aumenta a exportação de soja semi-processada.

Mais uma confirmação de que o PSDB, apesar do nome, não deu "guinada à direita" nenhuma, mas sempre foi neoliberal, a lei é curiosa por estar no barco da estrutura de imposto brasileira, concentradora e cara, que nunca é questionada com muita vontade pelos partidos de esquerda e centro-esquerda. A não ser que a Heloísa Helena ou o Genoíno tenham discursado em defesa do seu fim quando eu não tava olhando.

Seria uma bandeira econômica da esquerda social-democrata muito mais convincente, relevante, e transformadora do que o leitmotif de concordar com a FIESP sobre a queda da taxa SELIC. E poderia inclusive gerar uma saudável dissenssão nas fileiras do grande capital brasileiro, ao jogar os interesses dos exportadores de matérias básicas contra os interesses industriais.

13.9.05

Quiz

Você tem R$2.900.000.000,00 na mão. Você prefere gastar:


A) Que nem o Palofinho, reduzindo em 2,5% a alíquota de imposto de renda incidente sobre os rendimentos dos 5% mais ricos entre os brasileiros.

B), Que nem a Dilminha, cortando impostos sobre investimentos em energia.

C) Que nem o Furlanzinho, reduzindo impostos sobre itens da cesta básica e da construção civil.


E o divertido é que o Palófi era trotskista, e o Furlan é empresário.