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4.4.13

Ao mestre a morte



O descaso do governo do Rio de Janeiro para com a universidade não é novidade para ninguém. Notícias sobre marquises caindo na UERJ são quase recorrentes (aqui mesmo já reclamei), assim como de sucateamento de toda a (minúscula) rede estadual de ensino superior. Mesmo em notícias da própria assessoria de imprensa do governo ele pode ser visto, como nesta matéria sobre a mudança do QG da Polícia Militar para um prédio pertencente à universidade, que diz que com a mudança irá "melhorar o aspecto do prédio, que apresenta má conservação: a pintura das paredes está descascando e há janelas quebradas." A idéia de que o aspecto do prédio possa melhorar com o uso pela própria universidade nem sequer passa pela cabeça do governo estadual.

Não é um descaso de hoje (conta, pelo contrário, décadas), mas contrasta com outras iniciativas pioneiras dos governos do Rio de Janeiro, Distrito Federal, e Guanabara no campo do ensino e pesquisa. Assim, a Universidade do Distrito Federal foi a primeira universidade concebida como tal no Brasil (um pouco antes da USP; a UFRJ foi criada só pra dar diploma ao rei da Bélgica). A UENF, criada por Darcy Ribeiro no norte do estado e que hoje lhe leva o nome, mudou a forma de se estruturar a universidade. E, no governo Lacerda, mais modestamente, sem o nome de universidade, foi criada a ESDI - Escola Superior de Desenho Industrial, inspirada na Bauhaus e na Escola de Ulm, primeira escola de design do Brasil.

A modéstia no nome saiu caro a alguns professores e técnicos da ESDI, uma vez esta incorporada à UERJ em 1975.  Os fundadores Bergmiller, Goebel, Wolner, e Zuenir Ventura,  os professores da segunda geração Leonardo Visconti, Roberto Verschleisser, Arisio Rabin, Uwe Peter Kohnen, além dos mestres de oficina: Walter, Neoci, e Ripper, e Cenira 
Foram incorporados, com o descaso renitente aliado à uma sonsice deliberada, à rede de professores estaduais das escolas, e não à de professores universitários, recebendo, em troca de fazer da sua a melhor faculdade de desenho industrial da América Latina, salário mínimo. Entraram com uma ação na justiça em 1994; a sentença correu em 1996 o Estado valeu-se de sua infinita capacidade de adiar, assegurada pelo Judiciário brasileiro, desde então para adiar seu cumprimento e, especialmente, não pagar os atrasados. A sanha em não pagar aos professores é tanto mais curiosa porque não faz sentido sequer econômico - o valor da manutenção da ação por vinte anos em muito supera o dos atrasados que deveriam ter sido pagos em 96. 

Como os seres humanos são mais frágeis e menos duradouros do que os Estados e as injustiças, já morreram cinco dos professores e técnicos que deram entrada no processo contra o Estado. Entre eles Goebel Weyne (responsável pela programação visual da Novacap, empresa que construiu Brasília), Ulwe Kohnen formado na ESDI e que nela lecionou por 35 anos até sua morte em 2008, e o último, Leonardo Visconti, que morreu este ano, em 17 de março e foi responsável pela identidade visual de empresas como a CSN, a CEG, e o Hemo-Rio, além dos metrôs de Rio e São Paulo.

 
Aparentemente, o governo de Cabral (como antes dele o fizeram os Garotinhos, Marcello Alencar, e Brizola) conta com a morte como sua aliada; parafraseando Keynes, no longo prazo da justiça, estarão mortos todos. 

O INSS e Krypton

Normalmente não ponho experiências pessoais aqui porque elas são, bem, pessoais. Mas o encontro com a junta médica do INSS foi tão bizarro e, ao mesmo tempo, provavelmente tão corriqueiro que achei que merecia ser narrado.


Estou de licença médica, incapaz de ficar em pé ou sentado por mais de duas horas de uma vez (Por isso, também, a falta de posts novos por aqui ultimamente), andar de carro por muito tempo, ou carregar peso; a causa é algum problema na coluna cervical que comprime a medula, provocando dor forte nas pontas dos dedos se descumpro algum dos preceitos listados; pra complicar, também tenho uma coisa chamada condromalácia patelar de tipo III nos joelhos, que significa que, como a do Batman, minha cartilagem do joelho disse tchau. Não é divertido, especialmente quando vou no supermercado e minha namorada com metade do meu peso carrega as compras sozinha. Felizmente não houve, ainda, dano neurológico permanente; saíram hoje os resultados da eletroneuromiografia, que é uma espécie de tortura com agulhões e eletrochoque para medir o estado dos nervos.


Como a licença médica foi renovada, e assim teria mais de 120 dias até seu fim, fui encaminhado a uma junta médica do INSS para a perícia. Ou melhor, teoricamente para a perícia. Ao invés disso, a médica que começou a me entrevistar exigiu os exames de imagem, ignorando o fato de que estes já haviam sido apresentados antes ao INSS e que os exames nos quais se baseava a renovação eram os clínicos. Depois, tirou minha pressão (estava alta - insônia, gripe, e pressão alta basal) e olhou para minhas costas, sem pedir que eu tirasse a camisa. Apertou com os dedos dois pontos na altura do peito (o problema, lembrando, é no pescoço, com reflexos no lombo). Não fez nenhum outro exame clínico (há dúzias de exames clínicos para as condições em que estou). 


Foram chamados os outros dois membros da junta. Me disseram, exaltados, que os exames de imagem "não provavam o que os médicos disseram nos atestados." Quando tentei explicar, fui interrompido duas vezes por um deles, enquanto a outra dizia "não, deixe ele falar." Ao final, disseram que o que eu tinha devia ser "psiquiátrico," por conta da pressão alta.  Uma conclusão, pelo menos, original. Apesar disso, confirmaram a licença, mas reduzindo-a de 4 para 2 meses; explicaram que "se for necessário você pega outro atestado." OK, não discuti para além disso.


Mas fica a indagação: uma perícia médica não deveria envolver, bem, um exame médico? Ao que parece, se meu caso não for excepcional (e não há motivo pra supor que seja), os "peritos" do INSS estão lá para procurar as exatas palavras do atestado num exame de imagem e, não as encontrando, para fazer um arremedo de interrogatório, com direito a good cop - bad cop. Se a idéia não é fazer exame médico de verdade - e não creio que dê pra fazer exame ortopédico olhando-se para as costas vestidas de um paciente e sem nenhum teste de manipulação, a não ser que a médica tenha visão de raios X - o INSS deveria contratar policiais treinados em métodos de interrogatório do que gente que os aprendeu assistindo seriados policiais.