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29.4.09

Alguém vai ficar (mais) rico...

O governo de São Paulo estuda a concessão, começando pela linha 8, da CPTM. Imagino que dê muito certo, tanto do ponto de vista financeiro quanto da qualidade do serviço. Como no Rio.

Estadão

A Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) de São Paulo vai conceder a uma empresa (ou grupo empresarial) a responsabilidade de assumir por 30 anos a renovação e reforma da frota de trens e a execução de serviços de manutenção nas composições de uma de suas linhas, por meio de Parceria Público-Privada (PPP). A concorrência será internacional e, na prática, uma forma de terceirização.


Três grupos e empresas estrangeiras - Hyundai Roten, Mitsiu e Mitsubishi, todos fabricantes de trens e material ferroviário - já demonstraram interesse em participar. Dependendo do resultado, o projeto poderá ser estendido a outras linhas.


A proposta inicial contempla a Linha 8-Diamante (Júlio Prestes-Itapevi), de 35 quilômetros, a mais rentável do sistema de trilhos. Com movimento diário de cerca de 392 mil passageiros, responde por 22% da arrecadação com as passagens. Apesar do grande movimento, a linha atualmente opera com trens antigos, herdados da extinta Ferrovias Paulistas S.A. (Fepasa), uma das empresas que deram origem à CPTM. As composições, de origem franco-brasileira, rodam desde 1978.


A CPTM, por enquanto, não dá mais detalhes sobre o projeto, alegando segredo de edital, mas diz que o processo, aberto em outubro, faz parte do plano de expansão e modernização do sistema na Grande São Paulo. O tema é mostrado em propaganda do governo na TV como uma das principais realizações da gestão José Serra (PSDB).


28.4.09

Descascando o PAC I - o TAV

A oposição e a grande mídia procuram o tempo todo achar no PAC alguma "corrupção," palavra mágica que invalida tudo que passar perto (como no caso do ProUni, no qual 170 ricos entre 400.000 beneficiados provavam que o programa não presta). Ou "atrasos" num programa monstro que, na prática, é praticamente toda a formação de capital fixo do governo federal, e boa parte das esferas inferiores.

Deixando de lado essas besteiras de uma oposição que só quer o poder por si só e de uma mídia burra a ponto de estampar carta-corrente na primeira página, ainda há muito o que criticar de verdade nos projetos de infraestrutura do governo federal. Assim, e pra ver se tomo vergonha na cara e volto a postar regularmente aqui, começo hoje a falar mal dos maiores projetos do PAC, um por post.

Pra começar, e falando mal do PAC como um todo, adianto minha crítica com relação a todos eles: são projetos "Brasil grande," em que a realização da mega-obra é um fim-em-si e seus efeitos são apenas os diretos (transporte, irrigação ou o que seja), sem que haja um planejamento verdadeiro, apontando as consequencias do projeto. Isso apesar da própria Dilma ter contado a bravata de que agora haveria, ao contrário do que acontecia nos governos FH, Itamar e Sarney, planejamento econômico. É uma meia verdade: o que há em contraponto ao período anterior, quase tão importante quanto, é governo (ao invés de cleptocracia). Planejamento...mómenos.

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1 - o TAV Rio-Campinas.


Muita gente critica o TAV como obra "faraônica." Bem, grande é, sem dúvida. São 31bn de reais, no barato.

O projeto: Trem-bala, em linha dedicada a ser construída, com oito estações:
Rio (Central do Brasil ou Leopoldina)-Galeão-(Resende OU Volta Redonda)- São José dos Campos - Guarulhos - São Paulo (Luz ou a construir) - Viracopos - Campinas

O grosso dos 31bn seria gasto nas "obras de arte," mais especificamente em túneis e viadutos para subir a serra das araras e em trechos em túnel dentro do Rio de Janeiro e de São Paulo, mais o preço de se desviar ou afundar linhas férreas e estradas por onde ele passasse.

A tecnologia propugnada seria o trem convencional, com velocidades de pico de 300Km/h, o que representa hoje a média da malha "bala" francesa e japonesa (algumas linhas desses dois países chegam a 350Km/h de velocidade operacional. A velocidade média ficaria em 260Km/h, com paradas de cinco minutos e operação das sete da manhã à uma da manhã. O tempo da Leopoldina à Luz, portanto, seria de pouco menos de três horas. O preço estimado ficaria em torno de R$120 a preços de hoje.

Ao contrário de muita gente por aí, não creio que a obra em si e de si seja mau negócio. Pelo contrário: fora as desapropriações, acho que seria um raro caso de linha de trem que poderia ser rentável por si só, com juros nem tão baixos. As passagens principais (Luz-Leopoldina) seriam atraentes mesmo a preço idêntico ao da ponte aérea (700R$, segunda e sexta), já que a ponte tem atraso médio de meia hora, e outra meia hora de check-in, e meia hora no táxi, e quinze minutos de embarque além do horário, e quinze minutos taxiando ou esperando autorização. Efeito total: o tempo da ponte é o mesmo do trem. Além das passagens principais, o trem seria, efetivamente, o trem de aeroporto pro Galeão, Guarulhos e Viracopos. A metade do preço do táxi, o preço pra Guarulhos seria de 40R$, e poderia capturar uma boa metade dos 18 milhões de passageiros de Guarulhos, mais seus familiares. E a Dutra concentra mais de metade dos roubos de carga de alto valor agregado do Brasil, o que oferece um belo filé de transporte de carga à noite.

Passagens, então, e número possível de passageiros por ano, pros trechos mais rentáveis:

Leopoldina-Galeão: 25R$ x 2M = 50
Leopoldina-Luz: 120R$ x 8M = 960
São José-Luz: 50R$ x 2M = 100
Guarulhos-Luz: 30R$ x 15M = 450
Luz-Viracopos: 40R$ x 1,5M = 60
Luz-Campinas: 60R$ x 2M = 120
Os outros trechos, pela demanda existente e sem contar indução, não chegam juntos a 30. Deixemo-los de lado, inda mais porque seriam baratos mesmo.

Total de renda: 1,74bn a.a. - e isso é com um preço comparável ao serviço de ônibus de primeira classe, o que subestima a atratividade do trem-bala.
Custo operacional come uns 500 milhões por ano, na pior das hipóteses (é quanto custa, com salários e montanhas japoneses, pra manter um trem bala de tamanho equivalente num país com terremoto).
1,24bn por ano pra compensar o custo da construção.
Subsídio estatal de só um terço da obra, pensando em juros razoavelmente altos. E isso porque os números que tô usando são pra lá de conservadores. Na prática, preços ainda capazes de lotar a linha aumentariam isso aí pra uns 2,5bn a.a., o que cobriria inteiramente, sem subsídio estatal e com lucro de 100 milhões por ano o custo. Com subsídio estatal, poderia se praticar os preços acima e aumentar imensamente a movimentação atual de gente em todos os trechos.


Isso dito, as considerações:


1- 31bn de dólares num projeto que, ultimamente, é indutor de desenvolvimento, na região mais desenvolvida do Brasil? Tá certo que é impossível sonhar, num modelo político fragmentado não só porque é federação, com algo parecido com as metrópoles regionais de equilíbrio francesas, ou com as tecnopolein soviéticas (que , ok, também não deram certo), mas também não precisa de continuar ajudando, com verba tirada de todo mundo num modelo de impostos regressivo, a concentração, né?

2- Sumpaulo, a região metropolitana oficial, tem 19 milhões de habitantes. Há já quem defenda que, por critérios como os que são adotados mundo afora, a baixada santista e o vale do paraíba paulista já sejam parte da região metropolitana "real." O trem bala, com passagem em 20 minutos entre o centro de Campinas ou São José e o de São Paulo, consolidaria de vez essa realidade, além de estimular a suburbanização (com o que ela inevitavelmente tem de degradação ambiental) de todo o vale do Paraíba. O emergente carioca também, teria que decidir entre uma casa na Barra e na serra.

3- Ao contrário do alardeado, a economia de carbono proporcionada pelo trem-bala vai ser de mais ou menos zero. Apesar de a economia dele propriamente dita ser enorme em relação à ponte aérea (mesmo considerando que a maioria da energia virá de termoelétricas no Rio). É que, ao gerar uma concorrência para esta, inevitavelmente diminuirá o preço da passagem. E, ironicamente, o trem-bala viabilizaria seu principal concorrente, uma "ponte aérea" Rio-Campinas.

4- Rio e São Paulo são cidades ricas, mas as estações propostas estão em bairros degradados - a Cracolândia em SP e o vazio entre São Cristóvão e o Porto, no Rio. Ao fazer delas pólos de movimentação de gente com grana, o TAV faria mais do que os absurdos programas de revitalização via shopping center dos governos cleptocratas do Rio e São Paulo. Por outro lado, a dita localização pode afastar gente, principalmente porque poucos turistas de negócios estariam dispostos a encarar (com mala!) o metrô na hora do rush.

5- O preço do projeto poderia muito bem ser empregado, com um período de desenvolvimento mais longo, para desenvolver nossa própria tecnologia de trem bala ao invés de pagar a empresas estrangeiras que já estão envolvidas em escândalos por aqui.

6- O tamanho mínimo, pelo manual, para uma pista de decolagem de um boeing 737 é de 2Km para o modelo 737-100, 2,4Km para os demais modelos. As quatro pistas do Santos Dumont e de Congonhas têm 1.260, 1.323, 1.435 e 1.940 metros. E apesar das pistas menores, o SDU é o menos arriscado, já que dá pra arremeter, ou simplesmente cair de barriga na água (se o pouso for no sentido norte-sul); em Congonhas não há espaço pra erro nenhum. Ou seja, no momento, toda decolagem ou pouso na ponte aérea é uma operação de risco que vai contra o manual. O acidente da TAM em 2007 não foi um infortúnio, foi um milagre. Milagre de que não haja um daqueles por ano. Um trem-bala permitiria que o razoável fosse feito: só podem pousar nos respectivos aeroportos aviões em cujo manual tenha escrito distância de pista igual à das suas respectivas pistas. Vá, uma vez e meia. A Embraer agradece, e passagens aéreas caem no Brasil inteiro conforme o duopólio pense no que fazer com esse bando de Boeing na mão.


Conclusão? Eu, pelo menos, acho que sou a favor, principalmente pelo item 7. Mas em documento oficial algum vi isso tudo ser levado em consideração. Muito menos quantificado.

23.4.09

Erudição

Notinha da Folha de São Paulo noticia a criação, pela UNESCO, da excelente Biblioteca Digital Mundial. A Folha destaca que "entre as preciosidades estão obras como 'O Conde de Genji,' do século 11, considerada(sic) um dos romances mais antigos do mundo, e o primeiro mapa que menciona a América, de 1507, realizado pelo monge alemão Martin Waldseemueller."

O Conto de Genji, também conhecido pelo nome em japonês Genji Monogatari, é frequentemente citado como sendo o primeiro romance do mundo, apesar dessa alegação ser controversa. Diversas obras gregas podem ser consideradas romances, e ganham do Genji Monogatari por vários séculos, então quem quer manter a alegação às vezes qualifica como "primeiro romance psicológico," "primeiro romance com profundidade narrativa" ou quetais.

O mapa de Waldseemueller não é o primeiro que menciona a América, é o primeiro mapa a utilizar a palavra, América para referir-se às novas terras descobertas, que até então eram chamadas de "Índias."

20.4.09

Finalmente

Sempre reclamei por aqui do papel de megafauna carismática da Amazônia. Em nome dela, até advogar abertamente pela destruição do cerrado e da caatinga se faz - isso sem mencionar a falácia da "pastagem degradada," que sói ser gado pastando no cerrado pouco alterado.

Pois bem, finalmente parece que isso pode ter alguma chance de mudar.


O governo pretende ampliar as metas de redução do desmatamento, hoje válidas apenas para a Amazônia, para biomas como o Cerrado e a Mata Atlântica. Essas metas deverão ser incluídas na primeira revisão do Plano Nacional sobre Mudança do Clima, em abril de 2010. Além de enfocar biomas que despertam tradicionalmente menos atenção do que a floresta amazônica, a extensão do plano aumentará a credibilidade do Brasil nas discussões internacionais sobre o aquecimento global, acredita o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc.

A intenção é estabelecer também metas para o Pantanal, o Pampa e a Caatinga. Ainda não há definição sobre os números para a queda do desmatamento. No caso da Amazônia, o plano prevê reduzir em 70% a derrubada da floresta amazônica até 2017, em etapas graduais.

Uma das situações mais preocupantes é a do Cerrado, que preserva 60,4% de sua vegetação original, em diferentes graus de conservação. Mas o ritmo de desmatamento tem sido três vezes superior ao da Amazônia: em apenas seis anos, desde 2002, perdeu 10% de sua cobertura nativa - 1,5% ao ano. Espalhado por 11 Estados e o Distrito Federal, o Cerrado tem sido ocupado pelo plantio de soja, algodão, milho e, mais recentemente, cana de açúcar. Também abriu espaço para a criação de gado e fornece parte do carvão vegetal de origem irregular para siderúrgicas.

Na semana passada, o Ministério do Meio Ambiente deu o primeiro passo. Dois satélites - o americano Landsat e o japonês Alos - serão usados para monitorar todos os biomas. Até março de 2010 estarão prontos os mapas das alterações antrópicas desde 2002 nas áreas remanescentes. "Ter monitoramento e ter série são pré-requisitos para estabelecermos metas de emissão. A Caatinga, o Cerrado, o Pantanal, o Pampa e a Mata Atlântica exigem o mesmo cuidado que a Amazônia", disse Minc.

Outra provável novidade nos próximos meses é uma atualização do inventário brasileiro de emissões de gases causadores do efeito estufa. O último, lançado em 2004, fazia um mapeamento que tinha como base o ano de 1994. Foi ali que surgiu um número frequentemente usado nos debates no Brasil sobre aquecimento global: o de que a mudança de uso do solo - basicamente a derrubada e queimadas nas florestas - representa em torno de 75% de todas as emissões brasileiras de gases estufa à atmosfera. O novo inventário se baseará nas emissões de 2004 e deverá ser divulgado até o fim do ano.




Só uma correção: o inventário de 2004 não é só "último," é também o único.