Hoje é o aniversário do primeiro terremoto a atingir Lisboa. O segundo foi chamado de "o" grande terremoto de Lisboa, em 1755, e curiosamente teve quase exatamente a mesma potência do terremoto de Port-au-Prince de 2010. O terremoto, e os tsunami e incêndio que se lhe seguiram, arrasaram quase completamente a cidade e boa parte do sul de Portugal. Talvez as pessoas que falam do terremoto como uma "oportunidade" para o Haiti tenham em mente o que significou o grande terremoto de Lisboa para Portugal; se for o caso, acho melhor tirar o cavalinho da chuva, já que não há liderança política nativa se destacando na reconstrução, como o fez o marquês de Pombal, que com o crédito oriundo disso virou praticamente o ditador do país (o rei por sua vez ficou tão abalado pelo terremoto que nem coragem para entrar em prédios nunca mais teve).
Também graças ao terremoto, e a Pombal, Lisboa se viu reconstruída em linhas retas iluministas, quase um século antes que isso acontecesse em Paris, e ao contrário do que aconteceu em Londres, onde graças à barafunda jurídica a reconstrução após o grande incêndio de 1666 seguiu o traçado das ruas medievais. (Em Lisboa, não houve muita barafunda jurídica simplesmente porque a maioria tanto dos registros contidos nos arquivos reais quanto dos donos de terrenos havia ido pro beleléu.) No desenvolvimento ulterior de Portugal e seu império, é só lembrar que sem o terremoto Pombal não teria capital político para expulsar os jesuítas, proibir as manufaturas na colônia, revogar os éditos de pureza de sangue, a proibição do uso de língua geral no Brasil, ou a mudança da capital pro Rio. (É, o hômi fez tudo isso.)
Finalmente, a devastação causada pelo terremoto, ainda mais ocorrido no dia de todos os santos, chocou profundamente a sociedade européia da época. Voltaire, em particular, dedicou um poema e o Cândido ao terremoto. O choque foi comparado por Adorno, Benjamim, Habermas Singer e outros intelectuais do pós-guerra aos efeitos do Holocausto sobre sua própria geração (ok, na verdade a maioria deles foi menos modesta e falou dos efeitos sobre "a história" ou "a mentalidade" européia.)
Alguém lembrará do terremoto de Port-au-Prince, daqui a 255 anos?
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