Pesquisar este blog

6.5.11

Momento Regina Duarte

Não é exagero, hipérbole ou histeria dizer que Aldo Rebelo e a bancada ruralista da qual ele faz parte querem acabar com o código florestal, não reformá-lo. O pior nem são os muitos pontos em que a proteção diminui diretamente, ou a anistia aos crimes anteriores, é que o texto da lei proposta por ele é um caso, que não chega infelizmente a ser único, de lei na qual, ao invés de tentar se fechar a interpretação da lei engenhosa (o loophole, como dizem os gringos), faz questão de os abrir ao máximo. Pontos como a isenção de reserva de mato para pequenas propriedades, a classificação da produção de alimentos como "relevante interesse social" que permite ignorar a lei, ou a regulamentação a nível estadual... cada um permite, por si só, o desmatamento de 100% das propriedades rurais em todo o Brasil, do Monte Roraima à Lagoa dos Patos. É de longe a coisa mais importante que ocorre no Congresso brasileiro nos últimos anos, e é até curioso como não causa um décimo da indignação de um escândalo mequetrefe como o mensalão, ou as mordomias do Sarney, ou até as movimentações do Kassab.

Por outro lado, dá pra dizer que a única coisa estranha desse código anti-florestal é que ele demorou muito para aparecer. A bancada ruralista é de longe a mais coesa e poderosa do Congresso, aliás muito mais coesa em suas votações e negociações do que qualquer partido. Isso até deixa a nu o funcionamento da maioria dos partidos brasileiros (com a exceção dos de esquerda e, cada vez menos, do PSDB), que é o de coligações mais ou menos estáveis de blocos de poder estaduais, ligados a caciques. Esses blocos se juntam para conseguir mais poder para seus líderes, e é só. Podem seguir o alinhamento que for necessário, a qualquer dado momento (não à toa, o PSD de Kassab já foi interpretado como "Partido do Serra e da Dilma"), apesar de serem em geral pró-governo e pró-capital. Ao contrário, a bancada ruralista é suprapartidária na medida em que diferentes líderes estaduais (portanto cada um em um partido, para poderem conduzir sua rivalidade nas urnas) reconhecem seus interesses comuns ligados ao latifúndio e ao agronegócio. E é coesa, e segue negociações; se a Kátia Abreu ou o Blairo Maggi assumirem um compromisso em nome da bancada, haverá muito menos desertores do que se Temer ou Sarney falarem algo em nome do PMDB, ou mesmo se Serra e Aécio o fizerem em nome dos tucanos. E tem cada vez mais força - segundo o DIAP, subiu de 122 para 142 deputados na câmara, sem contar agregados.

Até agora, a bancada tinha concentrado sua enorme força na obtenção de benesses arrancadas aos contribuintes, diretamente ou via Banco do Brasil. Assim, deixou o campo livre para que a legislação ambiental brasileira não apenas fosse sendo escorada, como até se aprimorass, como quando áreas de vegetação menos densa começaram a ser protegidas também, ao longo dos anos 90 e 2000; anteriormente, como na época de Dom Diniz, apenas as florestas eram protegidas. Enquanto a indústria garantiu que o Brasil continuaria sendo centro de custos e poluição, vetando normas mais restritivas para si, a bancada ruralista deixou passar a imposição de regras justas para o campo, cada vez mais efetivamente fiscalizadas. Agora chegou a hora da reação. É assustador pensar nisso, mas a devastação do código florestal que desmata antes mesmo de ser aprovado pode ser só o primeiro tiro.

Nenhum comentário: