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26.6.08

Programa de estímulo à indústria alheia

Um artigo da ADITAL sobre os locautes na Argentina, além de interessante por si só, me faz pensar na Lei Kandir, que isenta de ICMS os produtos básicos (commodities) destinados à exportação. Isso é, que funciona basicamente como o contrário das retenções argentinas. Poderia ser chamada de "estímulo à desindustrialização," ou de "estímulo à indústria alheia." Graças à diferença é que, eg, desde 96 o Brasil tem aumentado a exportação de soja bruta, enquanto a Argentina aumenta a exportação de soja semi-processada.

Mais uma confirmação de que o PSDB, apesar do nome, não deu "guinada à direita" nenhuma, mas sempre foi neoliberal, a lei é curiosa por estar no barco da estrutura de imposto brasileira, concentradora e cara, que nunca é questionada com muita vontade pelos partidos de esquerda e centro-esquerda. A não ser que a Heloísa Helena ou o Genoíno tenham discursado em defesa do seu fim quando eu não tava olhando.

Seria uma bandeira econômica da esquerda social-democrata muito mais convincente, relevante, e transformadora do que o leitmotif de concordar com a FIESP sobre a queda da taxa SELIC. E poderia inclusive gerar uma saudável dissenssão nas fileiras do grande capital brasileiro, ao jogar os interesses dos exportadores de matérias básicas contra os interesses industriais.

25.6.08

Escrevendo errado por linhas retas

É problemática, moralmente, a iniciativa do governo espanhol de estender aos migrantes legais, se quiserem voltar para suas terras de origem, todos os benefícios a que teriam direito se ficassem sem emprego por lá mesmo. De certa forma, é a versão institucionalizada do "sopão nazi," cantinas para sem-teto operadas por radicais de extrema-direita em que ostensivamente se anunciava que a "comida identitária" incluía porco. (Isso é, excluía muçulmanos e judeus.)

Ninguém é prejudicado pelas duas medidas. Pelo contrário, tanto migrantes legais num caso quanto a maioria, cristã, dos sem-tetos europeus, no outro, se beneficiam diretamente, e indiretamente até os imigrantes ilegais e sem-teto muçulmanos (pela liberação de recursos - trabalho ou sopa - que antes iam pro grupo beneficiado diretamente).

Mas...bem, noves fora o efeito negativo prático (o reforço da xenofobia), é moralmente lícito fazer uma coisa boa por um motivo perverso?

20.6.08

Brincando de Smithsonian

Tá, minha brincadeira de "ah se eu tivesse grana" não é interessante pra ninguém mais. Mas em compensação eu arrumei um monte de links maneiros. Clica sem ler, a esmo. (Não são os sites oficiais da coisa mencionada, na maior parte dos casos)


 


Então, se eu tivesse a fortuna do Carlos Slim Helú:


 


 


 


6bn de dólares vão pra renovação da Biblioteca Nacional.  Um concurso arquitetônico internacional seria feito para escolher uma proposta de renovação e uso dos edifícios, que incluiriam o presente, o Palácio Gustavo Capanema , e o quarteirão entre a Beira-Mar, a Presidente Wilson, e a Presidente Antônio Carlos, que seria reformado ou arrasado, à escolha do projeto.  Além disso, seriam construídas ou adaptadas unidades regionais em Porto Alegre, São Paulo (na região do Anhangabaú ), Goiânia, Recife e Belém.  Seriam 2bn em prédios, e 4bn num fundo de renovação permanente do acervo. Arquitetura líquida pro prédio novo do Rio, estilo internacional pra São Paulo, neomoderna em Goiânia, high-tech no Recife e verde em Belém e PoA.


 


Outros 8bn de dólares seriam distribuídos igualmente entre  UFF , UFRJ , UFAM , UERJ , UCAMFiocruz, UFABC, e PUC-SP .  Façam o que quiserem com o dinheiro.


 


Com 10bn, seria criado o Instituto Carioca de Tecnologia, imitação barata do MIT , distribuído pela zona portuária  e ao longo da Presidente Vargas, incluindo alojamentos para estudantes naqueles sobrados atrás da Marechal Floriano, e uma biblioteca central no prédio art deco que tem na Santa Luzia. A princípio, não teria matérias de humanas, só exatas, biológicas (não médicas) e aplicadas.


 


1bn iria para a criação, onde hoje se encontra o gasômetro, de um aquário público  de grandes dimensões (o maior do mundo , hoje, é o de Osaka , que custou uns 170 milhões), e para sua manutenção. A idéia é algo que teria um caráter mais sério do que o da SeaWorld (nada de shows, em geral), mas teria um número grande o bastante de atrações interativas (fora os sempre populares túneis dentro de aquários gigantes) para ser atraente em si. 


 


1bn para a ampliação do Rio-Zôo , incluindo as compensações pela área hoje ocupada por presídio , exército , etc, e um mergulhão substituindo a avenida Bartolomeu de Gusmão.


 


1bn para a reforma geral  do Museu Nacional, incluindo a construção de grandes salões subterrâneos para a área de paleontologia, para a reserva e para estacionamento (as duas primeiras ligadas diretamente ao palácio da boa vista), e de um prédio pequeno para a área administrativa e letiva.


 


0.5bn para a criação do Museu da Intolerância, em São Cristóvão, focado na escravidão brasileira, mas com direito a exposições sobre outros horrores como o Holocausto, Ruanda, Bósnia, etc, sobre outras escravidões, inclusive as atuais ou as da Roma Antiga, sobre a Passagem Atlântica e sobre o racismo e preconceito étnico.


 


1bn para o Museu da África, na Gamboa, parte em moldes similares aoMuseu Afro-Brasil, mas com muito mais sobre a África propriamente dita.


 


1bn para um museu de transportes na Estação Barão de Mauá, da antiga Leopoldina.


 


2bn para os museus da praça Mauá. Um do mar, no píer, e um das Índias no prédio da Portus. Ao lado do museu do mar, no lado direito do píer, talvez fosse o caso de se construir uma marina.  O museu do mar seria acima de tudo um museu de ciências, com todos os experimentos e informações tendo algo a ver com o mar, mas utilizando o tema para falar de processos físicos, de geologia, de biologia, etc. (E incluindo, claro, a forma como a pesca industrial está esvaziando o mar).  O das Índias teria como tema central o império colonial português, e partiria daí pra contemplar a evolução das rotas de comércio no mundo, as trocas entre Brasil e África, as artes e sociedades do Oceano Índico, a construção das naus, de onde vieram as árvores das ruas do Rio de Janeiro...


 


2.5bn para enterrar as oficinas do metrô e as linhas de trem da Central do Brasil e da linha 2 até o ponto onde se separam os ramais norte e oeste,  e construir um parque por cima, incluindo a reforma (com um grande teto de vidro sobre as plataformas) da Central, e a criação de uma estação de trêm e ônibus integrada (com o espaço de veículos enterrado) no lugar da atual (e vergonhosa) estação de São Cristóvão.


 


1bn para o "Museu dos mil povos," perto da Luz. Falando não apenas da imigração brasileira, passada e corrente, mas também de todos os movimentos migratórios no mundo, dos coiotes na Frontera mexico-americana aos Velhos Crentes russos no Mato Grosso e na Bolívia, passando pelos chineses no Tibet e israelenses nos territórios ocupados, pela imigração balcânica na Suécia, pelos armênios na França... Com um centro de apoio ao imigrante e uma Casa da Bolívia anexos.


 


1bn para o Museu Geográfico Brasileiro, no Eixo Monumental. O museu teria um saguão de entrada sobre uma gigantesca maquete do Brasil, com pele de lcds flexíveis pra poder projetar diferentes dados na pele da maquete, e falaria de todo tipo de questão ligada à geografia, da geofísica aos deslocamentos diários de grupos humanos. O museu teria também um programa itinerante, focado não em cidades mas em quilombos e áreas indígenas. 


 


6bn para a Universidade do Nordeste, a ser criada em Natal, com uma ênfase nos cursos de história, física, neurologia , paleontologia , e em engenharia especificamente na geração de energia de fontes alternativas .


 


6bn para a Universidade do Mercosul, em Asunción, que começaria suas atividades com grupos formados por professores convidados das principais universidades de todos os países do bloco, para determinar necessidades e possibilidades; um dos campos de atuação de ponta iniciais seria o sistema dos rios Paraguai-Paraná, outro seria línguas sul-americanas, outro ecologia.  


 


1.6bn para a aquisição, reforma e conversão em habitação social  (de preferência através de aluguel social, não de casa própria) de prédios e sobrados  em centros urbanos . O Brasil, com um dos maiores déficits habitacionais do mundo, não utiliza de maneira significativa essas duas alternativas, muito mais baratas e interessantes do que a construção de casas próprias de má qualidade na PQP .


 


1.4bn para a revitalização dos rios São Francisco e Paraíba do Sul. Nâo "plantar árvores," mas um processo em que as prioridades e processos seriam decididos em colaboração com as comunidades ribeirinhas, e que incluiria a aquisição de terras hoje destinadas ao agronegócio, ou nas mãos de latifundiários, para a criação de reservas de desenvolvimento sustentável (tá, a palavra mais usada do milênio. No caso, quer dizer reservas públicas, inalienáveis, sob administração da comunidade local).


 


.5bn para o Jardim Botânico do Rio de Janeiro (façam o que quiserem com a grana).


 


.25bn para a Pinacoteca do Estado de São Paulo (idem)


 


.25bn pro MAM-RJ (ibidem)


 


.5bn para a criação, em Manaus, de um museu e centro de estudos sobre o Rio Amazonas. Sem arquitetura preferida. O museu incluiria um aquário, obiviamente.


 


2bn para comprar cinemas antigos Brasil afora (começando pela Cinelândia do Rio) e pôr os ditos-cujos, reformados, pra passar filmes velhos e novos (inclusive animação) a preço de custo. Nas cidades grandes, cada um com uma especialidade; por mim o Metro Boavista passava filme alemão, o Cine Imperial japonês, o Pathé francês, etc.


 


1bn para o Museu da Ciência, próximo à estação Santo André da CPTM. Cópia barata, evidentemente, de La Villette.


 


.6bn para restaurar o campo de Santana, fazendo um mergulhão na Presidente Vargas naquela altura (e o concomitante desvio do metrô).


 


50 M para uma estação de barcas em São Gonçalo.  Arquitetura líquida.


 


400 M para a construção de uma estação central de trens em São Paulo, porque a idéia de usar a Luz, com suas quatro pistas e três plataformas, desse jeito é burrice. De preferência próxima à Luz, porque assim dá pra ter integração com as linhas 1 e 4 do metrô, e tendo uma torre com relógio em cima.


 


600 M para a construção de dois arranha-céus: um no Catete-Glória, utilizando os planos do Gaudí para um hotel (originalmente previsto pra ocupar a área em que hoje tá sendo construída a Torre da Liberdade), outro na avenida Paulista, com concurso de arquitetura, que deveria ter pelo menos 800 metros. Tá, podem falar de charuto, mas eu sempre achei que faltava um bom mirante à ex-terra da garoa. Pra respeitar as tradições arquitetônicas locais, pode pôr uma antena, com estrutura de sustentação à torre Eiffel, em cima.


 


400 M para a construção de uma rede de albergues para mendigos "inteligentes," que seriam pagos, na base de um ou dois reais por noite, e teriam projeto feito de modo a minimizar os custos de manutenção e higiene, se tornando o mais perto possível de auto-sustentáveis.


 


 


Em todos os prédios a ser construídos acima, o concurso de arquitetura tem 10 jurados, cada um dando nota de um a cinco. Além disso, quem fizer o projeto dentro do estilo preferido (que não seria divulgado) ganha cinco pontos, quem for de país subdesenvolvido ganha mais cinco, quem for da América do Sul mais cinco. Os cinco primeiros colocados ficam abertos à votação pública (pela internet, ou valendo o quádruplo em urnas no local) por um mês, e o primeiro lugar nessa votação soma mais dez pontos, o segundo lugar cinco pontos.


 


PS Arquitetura high-tech é isso http://www.centrepompidou.fr/Pompidou/Accueil.nsf/tunnel?OpenForm e isso http://baugeschichte.a.tu-berlin.de/bg/lehre/veranstaltung_dokumentation.php?det_id=125&veranst_id=18&veranstaltung=vorlesung&semester=


 


Arquitetura líquida é isso http://www.sr.se/diverse/appdata/isidor/images/news_images/1278/30714_366_220.jpg ou  isso http://vcity-c825.uibk.ac.at/liquidarchitecture/menu_projekte.html pro Rio, já foi sugerida usando o estilo a Cidade do Sexo. Que, obviamente, quando saiu das idéias de um arquiteto para a cabeça do prefeito, foi transferida de Copacabana para a Gamboa. Afinal, Copacabana é lugar de cidadãos de bem(ns).

19.6.08

Irmãs na areia

Uma reportagem do NY Times( fala sobre como as grandes petroleiras estão salivando por lucrativos negócios sem licitação ou concorrência no Iraque.

Faz sentido. Há algum tempo, a tônica dos negócios do setor petroleiro mundial tem sido a saída das Irmãs (bem, do que sobrou delas) do negócio de exploração primária, com cada vez mais campos nas mãos de empresas estatais. Até a esperança latinoamericana gorou, com a PdVSA e a Petrobrás voltando à ativa, e a Argentina e a Bolívia virando bagunça.

Claro que as irmãs ainda têm, nos negócios de refino e distribuição, lucros gigantescos. Mas estão, cada vez mais, alijadas do filé que é "furar poço," como diria o Severino. Sobrou, por enquanto, o caro petróleo submarino da África Ocidental, mas não é o bastante pra todas. Assim, o Iraque, com seu petróleo bom e fácil de extrair, é realmente a última esperança delas.

No Blood for Oil...

18.6.08

Não voltou porque não foi embora

Já tem quem diga que o crime cometido pelo tenente representa uma "volta do AI-5." Besteira. O crime foi denunciado, está sendo investigado, e muito provavelmente será punido. A reação do Estado à atrocidade cometida é até muito melhor do que a que normalmente ocorre em situações semelhantes - não custa nunca lembrar dos milhares de mortos pela polícia brasileira todo ano, muitos com requintes de crueldade.

As condiçóes que tornaram possível a atitude do tenente é que são vergonhosas e sistêmicas. A saber:

1 - O uso do exército para policiamento. Esse uso só pode ser considerado natural num país em que o uso da polícia como exército de ocupação foi generalizado. Exército não é polícia, não funciona como polícia, e não coíbe o crime. Serve para matar inimigos, não manter a ordem. A escala do problema do uso do exército, no caso, é até pequeno comparado ao uso da polícia militarizada. Isto é, não faz diferença o exército ou a polícia fazerem o policiamento, já que a polícia virou exército, mas a polícia está agindo como exército em uma área muito maior.

2 - A cultura corporativa do exército brasileiro, que continua, apesar de estarmos no mais longo e profundo período democrático da história brasileira, sendo a cultura de um exército golpista. Antidemocrática e antipopular. Não se questiona um superior, ainda mais quando se trata de impor a autoridade da Arma perante civis. Se os soldados fossem ensinados a prezar as leis e instituições brasileiras (nem precisava pensar que pobre era gente), teriam recusado a ordem do tenente.

3 - O crime de "desacato." Como o de "apologia ao crime," não tem lugar numa sociedade democrática. Se não estiver impedindo a autoridade de fazer seu trabalho, o cidadão tem, sim, todo o direito de xingar como quiser até o presidente da república. Mesmo que não fosse usado como desculpa para prender quem não fez nada ou justificar comportamento truculento de policiais e soldados, o crime de desacato seria um absurdo.

15.6.08

Brooooother Sun and Siiiiiiiiister Mooon...

Duas coisas reafirmaram minha fé na humanidade nas últimas horas. Uma delas é, provavelmente, mais patética do que inspiradora, e só prejudica as pessoas envolvidas sem nenhuma vantagem: foi constatar, numa madrugada fria, a quantidade de mendigos dormindo ao lado de estátuas que abriam mão de um cobertor para jogá-lo sobre os ombros da estátua. A fraternidade, pelo visto, é mais básica do que querem os darwinistas sociais. O que poderia ser mais desinteressado do que agasalhar uma estátua?

A outra é mais prática, e mostra que, mal e mal, alguma resistência ao estado de controle ainda é possível: trata-se da quantidade de notícias como essa aqui, sobre como os vizinhos de asilados na Europa têm se mobilizado para impedir que o Estado, uma vez processados e negados os pedidos de asilo, mande os pobres coitados de volta para de onde quer que eles tenham fugido.

12.6.08

Curtas

A Folha noticia que 14 de 80 estações de medição de poluição atmosférica em SP registram grau "severo" (o máximo) de poluição. Mais relevante, olhando a tabela que acompanha a reportagem, e não mencionado no texto, é outro dado: a maioria das estações não mede a maioria dos poluentes. Só o ozônio é acompanhado em quase todas elas. Detalhes: 80 é um número ridiculamente baixo, e pra prover todas as estações de todos os medidores, não custaria mais de 200.000 - pro orçamento paulista, dinheiro que se acha no fundo do sofá.


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O Valor noticia que os estados do Nordeste, embora ainda abaixo da média nacional, evoluíram mais rápido na melhoria do Índice de Educação Básica, que aufere o estado do ensino fundamental público no país. Mais vergonhoso, se se ler o gráfico anexo, é que o Rio de Janeiro, com a segunda renda per capita (depois do DF), tenha uma nota quase igual à média nacional, e atrás do Mato Grosso.


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Falando do Mato Grosso, e mostrando por que foi bom a Marina Silva ter voltado ao Congresso, enquanto o Minc faz o ótimo anúncio da redução nos limites de emissão de poluentes, a bancada ruralista pratica o que até o Valor chamou de "política de terra arrasada," apresentando projetos de leis e alterações em leis que simplesmente acabam com toda e qualquer política ambiental ou de regularização fundiária no Brasil, e em particular na Amazônia Legal. E enquanto isso se discute uma merreca como a CSS na primeira página.

10.6.08

O homem branco é um Sísifo

Os bananais em chamas em Camarões permitem aos pentelhos como eu desconfiar do novo fardo do homem branco que cada vez mais é disseminado de mil maneiras primeiro mundo afora. A idéia de que a África esteja na pindaíba porque é "ignorada" pelo mundo, e que esse mundo deveria dar mais atenção a ela para se redimir do colonialismo, esbarra na constatação de que o colonialismo - inclusive armado, afinal pra que diabos serve a Legião Estrangeira? - continua vivo, atuante, e assassino.

Aliás, é exatamente esse probleminha que me faz não gostar da idéia da internacionalização da Amazônia. Não sou nacionalista o bastante pra achar que a posse brasileira sobre aquela área seja mais importante do que o bem-estar dos seus moradores ou a preservação da sua natureza, e sei muito bem que na prática o Brasil trata a Amazônia como uma colônia, também. O diacho é que é muito difícil acreditar na intenção ou capacidade das potências mundiais de tratar a Amazônia de outra forma. Ainda mais sabendo que as ditas-cujas nem preservar o pouco que restou de seus próprios biomas conseguem - as florestas inglesas e alemãs diminuíram mais de 50% no pós-guerra, e a floresta úmida temperada do noroeste americano mais de 80%.

Por outro lado, a real cobiça estrangeira sobre a Amazônia é utilizada da forma mais cara de pau possível por grupos reacionários aqui no Brasil. Porque é necessária muita cara de pau - além de algum racismo - pra dizer que a reserva indígena, sob controle da União, é um corpo estranho, enquanto a terra grilada em associação com conglomerados multinacionais é um baluarte da nação.

E além de cara de pau, a maluquice - achar que o interesse na Amazônia envolveria carregar água pra fora. Mais fácil gastar esse óleo diesel em dessalinizadoras. Se a água da Amazônia for exportada, vai ser como é exportada a água do cerrado brasileiro, ou do semiárido australiano, ou ainda a das pradarias americanas: sob a forma de produtos agrícolas. A produção de óleo de dendê, como na Malásia, nem afetaria o clima, provavelmente caindo na definição Mangabeira Unger de sustentável...

7.6.08

Inventário

Se o Brasil é uma nação "megadiversa" em termos biológicos, em termos etnolinguísticos, é relativamente medíocre. Apesar da enorme área, a densidade de diferenciação étnica, comparada com o Velho Mundo ou mesmo a América Andina e Central, é relativamente baixa.

Bem, mas a área É enorme. E apesar de tudo, nem só o português se fala por aqui, e ele não é tão homogêneo assim. Por isso é uma boa a iniciativa do IPHAN de, finalmente, conduzir um inventário da diversidade linguística brasileira.

5.6.08

Notícias da Maggilândia

O governador Blairo Maggi autorizou a construção, pela empresa Maggi Energia, de uma série de hidrelétricas em Mato Grosso. A empresa foi apenas instada, em atendimento a solicitação da Hermasa (grupo Maggi) a prover as usinas de eclusas.

Não, não é piada. E demonstra o poder que o Maggi tem no estado; por mais que se chamasse Sarney ou ACM de "donos" de seus estados, eles no máximo tinham uma ou outra empresa menor, além do governo. Blairo Maggi tem quase o processo produtivo completo do Mato Grosso, além de uma quantidade incognoscível de terras e do poder político.

Com esse poder todo, o ódio dele pelo ministério do meio ambiente é compreensível. Imagino que tenha ficado pior ainda quando ele começou a soltar os rojões pela saída da Marina Silva, e o Minc não só continuou na mesma linha como ainda por cima sugeriu que a restrição de crédito deixe de se aplicar somente ao desmatamento da Amazônia, mas se extendesse ao Cerrado e Pantanal. Que, afinal de contas, têm sofrido mais com o desmatamento do que a Amazônia.

É um paradoxo: o bioma ameaçado mais famoso do mundo, a Amazônia brasileira, é dos menos ameaçados. Tanto em comparação com outras florestas equatoriais mundo afora (ainda mais agora que as guerras civis da África equatorial estão amainando) quanto com outros biomas brasileiros. Até com outras Amazônias: a situação anda tão braba no Peru, Equador, Colômbia e Venezuela, que cada vez mais o Brasil, sem que isso se note na Metrópole*, está começando a ter um problema de refugiados, principalmente índios expulsos por petroleiras e madeireiras.

Ah sim - falando em Amazônia, o Globo publicou uma matéria sobre o assunto que é quase uma aula de mau jornalismo. Segundo a matéria, o Ministério do Meio Ambiente teria alterado uma resolução do CMN (o que é impossível), a Confederação Nacional da Agricultura é uma entidade sindical - o que talvez seja tecnicamente correto, mas falar de "cumplicidade entre parlamentares e entidades sindicais" deixa parecer que ela é parecida com uma CUT ou Força Sindical - e alega que "especialistas" anônimos dizem que um zoneamento ambiental bem-feito "desagradaria a todo mundo" (bem feito pra quem?).


*Porque a relação entre o Brasil do Sul-Sudeste+Brasília com a Amazônia é de potência colonial.

4.6.08

Pedindo ajuda aos universitários

Na sua tentativa de, a qualquer preço, constituir capital político para uma campanha presidencial em cima de um dos ministérios mais ricos e menos relevantes do Brasil pós-ditadura, Nelsom Jobim dá a entender que pretende fazer uma ampla reforma das instituições militares brasileiras, do alto-comando (que passaria a existir) ao recrutamento (que passaria a existir, de certa forma).

Quanto ao recrutamento, uma das mudanças aventadas é a que instituiria a opção pelo serviço social obrigatório. Não quer servir no exército, pegar em armas, dormir em dormitório, levar esporro de sargento? Ótimo, você vai trabalhar por um ano e meio, uma média de 16 horas por semana, em algum serviço público, recebendo salário mínimo por isso.

Além de achar a idéia ótima (sim, mesmo se for retroativa :P), acho que pode ser uma boa solução pra universidade pública. Veja bem, a universidade pública significa, de certa forma, um subsídio pra quem poderia pagar. Acaba sendo a classe média ascendente que paga por faculdades particulares, enquanto a elite da elite vai para as universidades federais ou pras estaduais paulistas (quando muito, pras PUCs). Mas tornar a faculdade pública paga esbarra em problemas políticos e práticos - estes, relacionados ao custo de um sistema misto, já que obviamente a idéia não é cobrar de todo mundo.

Então, talvez o serviço social obrigatório fosse a solução. Além dos 18 meses a que todo mundo é obrigado, quem se formar em faculdade pública poderia ter mais 18 meses obrigatórios, que podem ser reduzidos em até 2/3 se se aceitar um emprego de tempo integral em local remoto.