O viaduto Perimetral é um monstrengo de concreto que liga o Aterro do Flamengo ao seu primo-irmão viaduto do Gasômetro, e por ele aos acessos de saída do Rio de Janeiro, na Avenida Brasil e na Ponte Marechal Ditador Costa e Silva (nome compartilhado pelo outro primo da Perimetral, o Minhocão de São Paulo). Faz parte de um projeto do auge do planejamento rodoviarista, de se criar a "perna litorânea" de um anel viário de grande capacidade no Rio. Por isso, e por criar um túnel escuro e sujo numa área que após sua construção se esvaziou tanto de população quanto de atividade econômica, ficou por muito tempo no ideário progressista como ao mesmo tempo culpado por essa decadência e ´símbolo máximo (no Rio) do pensamento rodoviarista, em que se dá ao carro a primazia, não apenas dos deslocamentos, mas da própria forma da cidade. (Bem entendido, o carro vai de mão em mão com a especulação imobiliária, pela extensão que dá à forma urbana.)
Esta noção é mais razoável do que a primeira, porque a decadência da região portuária do Rio tem mais a ver com a decadência do próprio porto, e com a migração (por conta da revolução no transporte) de sua atividade dos cais de 1910, cortados pela Perimetral, à ponta do Caju; ao contrário do que ocorre em São Paulo, aonde o Minhocão cortou áreas residenciais e comerciais, a Perimetral cortou uma área já dedicada à atividade industrial e de movimentação de carga pesada. O barulho e poluição do tráfego expresso não afastariam atividades elas próprias geradoras intensas de barulho e poluição; em Santos, as zonas próximas ao porto são em sua maioria zonas degradadas justamente pelo barulho e poluição.
Pois bem, a mesma perimetral rodoviária, hoje, é defendida por gente progressista, incluindo o candidato Marcelo Freixo, agora que o prefeito planeja sua demolição como parte de um projeto de "revitalização" do Porto, trocando a vocação da área para moradia, turismo, e escritórios. Argumenta-se que sem a rodoviária terá-se um "nó no trânsito." Ora, este é o supra-sumo do argumento rodoviarista, a contraparte lógica do que pautou sua construção. E - logicamente, já que Eduardo Paes é um tecnocrata de direita, pouco inclinado a questionar a lógica rodoviarista* - tecnicamente errado. A Perimetral, hoje, é uma parte de uma das duas alternativas de deslocamento entre o Centro do Rio e o conjunto de viadutos e vias expressas de saída da cidade: pela orla ou pela Avenida Ditador-Presidente Vargas.
A orla consiste da Perimetral, uma via expressa tipo zero, sem cruzamentos nem sinais com duas faixas por sentido, conectando-se ao Aterro do Flamengo ao sudoeste, e abaixo dela a Rodrigues Alves, uma avenida de três faixas por sentido, com sinais e cruzamentos, conectando-se à Praça Mauá ao sudoeste; ambas conectam-se a leste ao viaduto do Gasômetro. Ora, no novo modelo a ser implantado pela Prefeitura, uma Rodrigues Alves expressa, tipo zero, sem sinais nem cruzamentos, substituirá a Perimetral, enquanto uma nova avenida, ainda sem nome, substituirá a atual Rodrigues Alves; graças a um conjunto de túneis, ambas terão exatamente os mesmos acessos do conjunto viário atual, mas com uma faixa expressa por sentido a mais.Fazendo a conta: hoje temos 2+2 linhas expressas e 3+3 locais; em 2016, teremos 3+3 exp, 3+3 locais, e o mesmo traçado em termos de acessos.
Em outras palavras: o encampamento do argumento rodoviarista pela esquerda está tecnicamente, faticamente errado, além de representar uma contradição do discurso passado, sem passar pela autocrítica (eu, pessoalmente, mantenho o velho discurso e seria a favor da derrubada da Perimetral SEM alternativa viária expressa - a região já é próxima ao metrô e à supervia, e terá sistema de VLT para os deslocamentos internos a partir da Central).
Não que não haja muito o que criticar nas circunstâncias nas quais se dá a derrubada da Perimetral, numa operação urbana que, como suas equivalentes havidas em outras cidades, de Barcelona a Buenos Aires, tem como objetivo a inserção da cidade num modelo em que os turistas e os executivos globais prosperam e os outros, quando não pitorescos, permanecem excluídos. A operação é transparente como uma folha de granito, e transfere atribuições públicas a uma companhia privada. A gentrificação que é parte integrante dela expulsa moradores da área.** A perimetral poderia ser, com custo equivalente ao de sua demolição, reaproveitada como viaduto metroviário. Os largos terrenos vazios e próximos ao centro também seriam ótimos para fazer moradia social de alta densidade, ignorada pelo projeto. E por aí em diante.
Até por essa abundância de motivos para criticar o projeto, não dá para deixar de perceber a grita contra o fim da Perimetral, em que a esquerda irmana-se ao Otavio Leite, como um antinomismo, uma redefinição de hay gobierno soy contra em que se a direita faz algo, sou contra. Não importa o quê. Do mesmo modo, as remoções de casas de áreas de risco são criticadas não apenas pela truculência e falta de transparência, mas pela própria remoção, pondo em aspas "área de risco," como se a existência de moradias em áreas de risco, e até sua prevalência, não fosse reconhecida e criticada, principalmente no período das chuvas. Afinal, um dos grandes fatores que levam à criação de uma favela em determinada área é justamente a indesejabilidade daquela área para quem pode morar em lugar melhor, entre outros fatores pelo risco climático-geológico.
De novo: não se trata, aqui, de defender o tecnocrata reacionário, com seus "choques de ordem" e sua cidade global para os cidadãos globais, que muito flexivelmente se alçou à prefeitura como mosqueteiro da CPI do Mensalão, junto com ACM Neto e Heloísa Helena, para em seguida governar unha-e-carne com o governo federal. Mas o antinomismo, em que tudo que ele faz é errado por definição, é uma renúncia à crítica, e não uma crítica. É, como os satanismos da vida, tanto os ingênuos de metaleiros e medievos quanto o satírico de Anton LaVey, uma condição subordinada, em que se é tão-somente espelho invertido do que se opõe; é se deixar pautar, ainda que negativamente, pela direita. Se Otavio Leite vencesse, a Perimetral voltaria ao seu status anterior de chaga urbana?
Pior: o antinomismo faz com que seja tanto mais fácil ignorar completamente a esquerda. Afinal, em termos de poder real, não há comparação entre as forças envolvidas. A direita pode abdicar do convencimento e se dedicar tão-somente à demonização do adversário porque é o lado da quiriarquia, o lado do poder por definição - e aí está o problema da minha própria crítica ao antinomismo, o de que a crítica ponderada não pode nunca se confundir com o apoio ou composição. Ponderada não quer dizer menos radical, apenas mais complexa. Não é fácil, nem um pouco. Nem poderia ser.
*Aliás, muito pelo contrário: habilmente usou a construção de corredores de BRT para integrar à malha de transporte público da cidade a Zona Oeste - em si acertada e necessária - como boi de piranha para erigir túneis rodoviários que servissem também a automóveis particulares, em especial o da Grota Funda, ambição antiga de todos os prefeitos cariocas, abrindo novas áreas à especulação imobiliária.
**Esclareça-se: o problema da gentrificação não ocorre quando um morador ou comerciante vende a própria casa ou comércio e vai para o subúrbio morar num lugar melhor. Se assim fosse, quem o põe em pauta seria, como querem os liberais, um apologista da pobreza. O problema é quando os aluguéis aumentam de maneira desmesurada, expulsando gente sem propriedade nenhuma. E na maioria das favelas brasileiras, bem como em boa parte dos bairros da zona portuária do Rio, a casa própria não é exatamente comum...
PS para reconhecer algum mérito até no modelo rodoviarista, foi graças a ele, sob o udenista Lacerda, que o Rio ganhou seu maior parque público, numa cidade carente de parques: o Aterro do Flamengo, que por sua vez foi complemento de uma via expressa que prolonga a Perimetral até as portas de Copacabana.
PPS se o choro pela Perimetral é ridículo, outros marcos do Rio de Janeiro estão sendo postos abaixo na maior desfaçatez, ante a omissão ou participação ativa dos governos estadual e municipal. Há o museu do Índio do Maracanã, que foi sede do Rondon e antes disso do Ministério da Agricultura e tem 154 anos, a antiga embaixada da Áustria que foi a primeira casa modernista da cidade, a fábrica da Brahma ao lado do Sambódromo que foi a primeira fábrica de cerveja de grande escala do Brasil...
Auferre, trucidare, rapere, falsis nominibus imperium; atque, ubi solitudinem faciunt, pacem appellant.
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29.10.12
A morada do poder
Em meio a toda a profusão de mapas de votação mostrando uma distância bem nítida entre as preferências eleitorais da periferia pobre (esquerda, menos no Rio) e do centro rico (direita, menos no Rio) das capitais brasileiras, achei curiosa a falta de distância entre os endereços dos candidatos propriamente ditos. Pensei nisso, ontem, ao ver a dúzia de carros de satélite próximos ao apartamento do Haddad (que vota na frente da minha casa). O Paraíso, aonde eu e Haddad moramos, é quase na ponta leste do setor sudoeste paulistano, em que se concentra a burguesia tradicional (há bolsões burgueses em cada região da cidade, que nesse sentido é bem descentralizada, bem como na sua região metropolitana, com direito a subúrbio à americana em Cotia e Mairiporã). Quase na ponta oeste está o Alto de Pinheiros, bairro onde fica a mansão de José Serra. Nem São Paulo é excepcional nesse quesito; pelo contrário, ainda está "bem distribuída." No Rio, Freixo e Paes moram em bairros vizinhos, Leblon e São Conrado. Em Salvador, Pelegrino e ACMinho moram no mesmo bairro, e uma velhinha artrítica não teria problemas em percorrer a distância que lhes separa.
Resolvi, então, conferir a distância (as the crow flies) entre os principais candidatos em algumas cidades, bem como o metro quadrado de seus bairros:
Resolvi, então, conferir a distância (as the crow flies) entre os principais candidatos em algumas cidades, bem como o metro quadrado de seus bairros:
São Paulo: Haddad: 11.806. Serra: 8.278
Rio de Janeiro: Paes 11.514. Freixo: 18.332
Salvador: Pelegrino e ACMini: 3.377
Belo Horizonte: Marcio Lacerda: 7.812. Patrus Ananias: 4.998.
E daí isso tudo? E daí nada. A maioria dos candidatos a prefeito de capital já são políticos, e políticos ganham muito bem; no caso são todos de classe média, e de origem classe média, mas nesse sentido a política brasileira está bem mais democrática do que a americana, por exemplo (Obama, de família classe média-alta, é uma exceção pra baixo; Clinton gostava de dizer que nasceu num trailer park, a favela deles, mas se mudou pruma mansão antes de aprender a falar). É só curiosidade mesmo. A informação mais relevante desses números é o abismo entre os valores de cada cidade.
26.10.12
Homens invisíveis
Um excelente artigo do Leonard Pitts desce o malho no vice-governador da Carolina do Sul, que num acesso de honestidade comparou os pobres a vira-latas, e fala de como falta voz e consciência de si aos pobres nos EUA. E estava lendo sobre a história ambiental da China, especificamente sobre a história do uso da água por lá, e descobri que até hoje o governo chinês resiste a se utilizar dos recursos hídricos tibetanos, apesar do Tibete sozinho ter um potencial hidrelétrico mais ou menos equivalente ao do Brasil inteiro, e um quase-nada de gente.
As duas coisas juntas me pensaram nas vantagens de se ser colônia de verdade sobre ser colônia de fato. Afinal, numa colônia de verdade, a dominação, e portanto a responsabilidade - chame de noblesse oblige, se quiser - ficam evidentes, enquanto no caso de locais em situação de exploração mas sem laços oficiais, abundam as declarações compungidas de que "esquecemos" a região. A China não quer enfiar as garras no Tibete porque sabe que, com o enorme movimento Free Tibet (principalmente derivado do carisma do Dalai Lama, e da atração que uma versão pasteurizada do budismo exerce em Hollywood), se fizesse isso seria atacada por fazê-lo no mundo inteiro, sem contar a resistência local. Pelo contrário, as transferências de riqueza se dão no sentido China-Tibete. Enquanto isso, no coração histórico da própria China, na região das Três Gargantas, faz uma megausina que inclusive é maior do que precisaria ser por razões de prestígio nacional. (Na área do lago, poderiam ser feitas, ao invés de uma usina de 18Gw, três de 7Gw, a custos ambientais, humanos e financeiros menores, mas aí nenhuma delas seria a maior do mundo.)
Enquanto isso, no Brasil não se tem nenhum problema em explorar regiões remotas no interesse das regiões dominantes. Pelo contrário, principalmente em São Paulo mas também no resto do Sul-Sudeste, pessoas têm a noção bizarra de que "sustentam" o Norte-Nordeste. E tome-lhe Belo Montes e Jiraus e Carajás, num esquema de exploração de recursos minerais bem colonial. Assim como, nos EUA, famosamente as pessoas superestimam em 4.000% o valor da ajuda externa doada pelo país, e acham que eles que transferem riqueza aos países subdesenvolvidos.
No ocaso do colonialismo, quando começou-se a desenvolver algum tipo de consciência, a transferência de riqueza ainda ia no sentido colônia-metrópole, mas em grau menor do que atualmente; do mesmo jeito, os estados de bem-estar derivaram, todos, de uma consciência de classe forte e da vontade da elite de apaziguar as massas famélicas. (Nesse sentido, o Brasil, com um estado de bem-estar aparecendo neste momento histórico, talvez seja uma exceção.)
Não é que der esmola atrapalhe a revolução, nem que se os franceses jogassem críquete com seus servos como nós não teria havido esse problema. Mas é que, sim, uma igualdade oficial e uma comunidade imaginária podem ser obstáculos para igualdade e comunidades reais. Talvez os governadores de Rondônia e do Pará não fossem tão amigáveis à construção de hidrelétricas se estas se destinassem a alimentar um país estrangeiro. (As subestações recebedoras de Belo Monte ficarão em Nova Iguaçu-RJ e Estreito-MG; as de Jirau e Santo Antônio em Araraquara-SP, e a de Itaipu em Mogi das Cruzes-SP.)
As duas coisas juntas me pensaram nas vantagens de se ser colônia de verdade sobre ser colônia de fato. Afinal, numa colônia de verdade, a dominação, e portanto a responsabilidade - chame de noblesse oblige, se quiser - ficam evidentes, enquanto no caso de locais em situação de exploração mas sem laços oficiais, abundam as declarações compungidas de que "esquecemos" a região. A China não quer enfiar as garras no Tibete porque sabe que, com o enorme movimento Free Tibet (principalmente derivado do carisma do Dalai Lama, e da atração que uma versão pasteurizada do budismo exerce em Hollywood), se fizesse isso seria atacada por fazê-lo no mundo inteiro, sem contar a resistência local. Pelo contrário, as transferências de riqueza se dão no sentido China-Tibete. Enquanto isso, no coração histórico da própria China, na região das Três Gargantas, faz uma megausina que inclusive é maior do que precisaria ser por razões de prestígio nacional. (Na área do lago, poderiam ser feitas, ao invés de uma usina de 18Gw, três de 7Gw, a custos ambientais, humanos e financeiros menores, mas aí nenhuma delas seria a maior do mundo.)
Enquanto isso, no Brasil não se tem nenhum problema em explorar regiões remotas no interesse das regiões dominantes. Pelo contrário, principalmente em São Paulo mas também no resto do Sul-Sudeste, pessoas têm a noção bizarra de que "sustentam" o Norte-Nordeste. E tome-lhe Belo Montes e Jiraus e Carajás, num esquema de exploração de recursos minerais bem colonial. Assim como, nos EUA, famosamente as pessoas superestimam em 4.000% o valor da ajuda externa doada pelo país, e acham que eles que transferem riqueza aos países subdesenvolvidos.
No ocaso do colonialismo, quando começou-se a desenvolver algum tipo de consciência, a transferência de riqueza ainda ia no sentido colônia-metrópole, mas em grau menor do que atualmente; do mesmo jeito, os estados de bem-estar derivaram, todos, de uma consciência de classe forte e da vontade da elite de apaziguar as massas famélicas. (Nesse sentido, o Brasil, com um estado de bem-estar aparecendo neste momento histórico, talvez seja uma exceção.)
Não é que der esmola atrapalhe a revolução, nem que se os franceses jogassem críquete com seus servos como nós não teria havido esse problema. Mas é que, sim, uma igualdade oficial e uma comunidade imaginária podem ser obstáculos para igualdade e comunidades reais. Talvez os governadores de Rondônia e do Pará não fossem tão amigáveis à construção de hidrelétricas se estas se destinassem a alimentar um país estrangeiro. (As subestações recebedoras de Belo Monte ficarão em Nova Iguaçu-RJ e Estreito-MG; as de Jirau e Santo Antônio em Araraquara-SP, e a de Itaipu em Mogi das Cruzes-SP.)
24.10.12
Os muitos genocídios guaranis-kaiowá
Os índios brasileiros vêm sendo vítimas de genocídio há - pelo menos - 400 anos. Digo 400, não 500, porque o primeiro grande ato de genocídio europeu nas américas, através da transmissão das doenças euro-afro-asiáticas, foi involuntário. O segundo, longe das terras tupiniquins, foi bem voluntário, a extinção dos taínos pela família Colombo. No século XIX, o romantismo levou a que muitas famílias da aristocracia brasileira ganhassem nomes aludindo a índios - é o caso de um certo ex-candidato a vice-presidente - mas essa simpatia era por índios mantidos num passado mítico, equivalentes nativos dos teutônicos que povoavam, na mesma época, as fantasias de Wagner. Os índios de verdade, vivos, continuaram a ser mortos em profusão; ainda havia matas e índios em boa parte da superfície dos estados do Sul e Sudeste até os anos 1930.
Essa ligação entre matas e índios ajudou, na crista da onda do ecologismo dos anos 80, a solidificar a noção dos direitos à terra dos índios e outras populações tradicionais, no Brasil e no mundo. Não diminuiu a pressão contra em nenhum momento, mas houve passos importantes, como a homologação contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol, face a uma quase rebelião do governo do estado de Roraima, no Brasil, ou a conquista do imenso e gélido território de Nunavut pelos inuit. Foram ganhos em face de um genocídio cotidiano. Sim, cotidiano: o aumento das populações índigenas como um todo no Brasil na última década esconde em si um sem-número de grupos que foram sendo extintos, à custa de requintes de violência física e social. É um genocídio cotidiano, que gera bem pouca atenção e atende interesses de fazendeiros, mineradoras, empreiteiras, e governos. Em parte para testar essa visibilidade, está aí a hidrelétrica de Belo Monte, próxima da reserva indígena mais famosa do Brasil, que não me deixa mentir. Se o resultado tivesse sido protesto em massa, o resto do projeto de aménagement da Amazônia teria sido congelado; como foi a indiferença maciça, vai avançando. E o projeto amazônico, em que conluiam governo e agronegócio, é parte de uma contrainvestida maior, em que herdeiros da guerra fria de ambos os lados se unem contra o inimigo maior que é a natureza e os povos tradicionais, que não cabem nas utopias totalizantes. Depois podem discutir se a utopia de toga branca será capitalista ou socialista; urge que antes ela seja de engenheiros.
Neste momento, felizmente, uma instância específica desse genocídio - a morte dos guarani-kaiowá, cujas terras são invadidas por fazendeiros, assim como o são as terras de grupos próximos - ganhou bem mais visibilidade, basicamente graças a um feliz mal-entendido vagamente racista. Explico-me: o manifesto dos guaranis-kaiowás alertando para sua breve extinção, resultado natural de resistir até o fim, foi confundido, nas redes virtuais, principalmente a partir do artigo de Eliane Brum na Época que falava em "declaração de morte," como uma disposição para o suicídio coletivo como ato de protesto. O inaudito de um tal protesto chamou a atenção, e foi explicado pela diferença da "cultura índia" e reforçado pela realidade dos altos índices de suicídio na reserva (e em reservas tradicionais oprimidas mundo afora). Com uma pequena ajuda de quem viu no caso uma cause cèlebre antipetista, apesar da reserva ter sido homologada por Lula e proibida por Gilmar Mendes, com o processo parado, ou antes andando a passo de jabuti, no STF desde então.
Sim, felizmente. Se é verdade que Dilma não é atriz principal, como se lhe quer atribuir, deste drama específico, o é dos muitos dramas no entorno da Volta Grande do Xingu, e pretende ser de muitos outros ainda Amazônia afora. E muita gente de poder bem mais sólido que o dela também. Os muitos xingamentos no twitter, desta vez, podem não dar em nada, mas talvez sejam o embrião de alguma coisa.
Essa ligação entre matas e índios ajudou, na crista da onda do ecologismo dos anos 80, a solidificar a noção dos direitos à terra dos índios e outras populações tradicionais, no Brasil e no mundo. Não diminuiu a pressão contra em nenhum momento, mas houve passos importantes, como a homologação contínua da reserva indígena Raposa Serra do Sol, face a uma quase rebelião do governo do estado de Roraima, no Brasil, ou a conquista do imenso e gélido território de Nunavut pelos inuit. Foram ganhos em face de um genocídio cotidiano. Sim, cotidiano: o aumento das populações índigenas como um todo no Brasil na última década esconde em si um sem-número de grupos que foram sendo extintos, à custa de requintes de violência física e social. É um genocídio cotidiano, que gera bem pouca atenção e atende interesses de fazendeiros, mineradoras, empreiteiras, e governos. Em parte para testar essa visibilidade, está aí a hidrelétrica de Belo Monte, próxima da reserva indígena mais famosa do Brasil, que não me deixa mentir. Se o resultado tivesse sido protesto em massa, o resto do projeto de aménagement da Amazônia teria sido congelado; como foi a indiferença maciça, vai avançando. E o projeto amazônico, em que conluiam governo e agronegócio, é parte de uma contrainvestida maior, em que herdeiros da guerra fria de ambos os lados se unem contra o inimigo maior que é a natureza e os povos tradicionais, que não cabem nas utopias totalizantes. Depois podem discutir se a utopia de toga branca será capitalista ou socialista; urge que antes ela seja de engenheiros.
Neste momento, felizmente, uma instância específica desse genocídio - a morte dos guarani-kaiowá, cujas terras são invadidas por fazendeiros, assim como o são as terras de grupos próximos - ganhou bem mais visibilidade, basicamente graças a um feliz mal-entendido vagamente racista. Explico-me: o manifesto dos guaranis-kaiowás alertando para sua breve extinção, resultado natural de resistir até o fim, foi confundido, nas redes virtuais, principalmente a partir do artigo de Eliane Brum na Época que falava em "declaração de morte," como uma disposição para o suicídio coletivo como ato de protesto. O inaudito de um tal protesto chamou a atenção, e foi explicado pela diferença da "cultura índia" e reforçado pela realidade dos altos índices de suicídio na reserva (e em reservas tradicionais oprimidas mundo afora). Com uma pequena ajuda de quem viu no caso uma cause cèlebre antipetista, apesar da reserva ter sido homologada por Lula e proibida por Gilmar Mendes, com o processo parado, ou antes andando a passo de jabuti, no STF desde então.
Sim, felizmente. Se é verdade que Dilma não é atriz principal, como se lhe quer atribuir, deste drama específico, o é dos muitos dramas no entorno da Volta Grande do Xingu, e pretende ser de muitos outros ainda Amazônia afora. E muita gente de poder bem mais sólido que o dela também. Os muitos xingamentos no twitter, desta vez, podem não dar em nada, mas talvez sejam o embrião de alguma coisa.
17.10.12
Carta aos reaças II
Sou - creio - meio chato na tecla de se reduzir a desigualdade através do aumento dos impostos de renda e patrimônio. Isso porque acredito que a igualdade é um bem-em-si; o golfo social entre eu e outros privilegiados, de um lado, e a massa maior do outro me incomoda mais até do que o golfo entre eu e os "1%" do movimento Occupy wall street. Mas existe um motivo bom, liberal-ortodoxo em economia, para reduzir a desigualdade, e que não tem nada a ver com socialismo, fraternidade, ou outras questões de bichinha coração de banana. É que a desigualdade aumenta os custos do Estado. E, afinal de contas, reduzir custos, especialmente os do Estado, é uma das bandeiras mais velhas do liberalismo. Foi a bandeira da criação do semanário inglês The Economist, cujo nome antedata a profissão de economista, e se refere à frugalidade.
Não é um processo muito complicado. A expectativa de renda de uma pessoa não é ilimitada (como proposto por algumas escolas econômico-filosóficas) mas, empiricamente, ancorada numa noção de renda justa que tem muito a ver com a renda observada do mesmo estrato social. As consequencias disso para o gasto do Estado se devem ao número de profissionais altamente qualificados que são necessários para a manutenção dos serviços públicos, desde a implantação de princípios ostensivamente meritocráticos para a burocracia de Estado na Prússia e na França (ok, e bem antes disso na China). Esses profissionais, parte de uma elite social por um zilhão de motivos (inclusive a reprodução intergeneracional de seu capital social ostensivamente meritocrático), e tem suas expectativas de renda balizadas pelo seu entorno. O Estado, portanto, (como qualquer empregador) a longo prazo terá o salário médio de seus profissionais qualificados puxado para a média dos salários de elite, ou bem terá que conviver com a insatisfação crônica desses profissionais e, no limite, o abandono por parte deles das carreiras públicas.
Vamos fazer uma simplificação tosca pra exemplificar a conta: Falemos de duas nações, Laputa e Houyhnhn. Em ambas, os funcionários públicos qualificados - médicos, professores universitários, promotores, auditores, e quejandos - representam 5% da população. Em ambos, os governos têm como prioridade o bom funcionamento dos serviços públicos, então o salário médio de seus funcionários está em linha com suas expectativas, isso é, em linha com os rendimentos do quintil (20%) mais rico da população. A diferença é que em Laputa, o quintil mais rico ganha 3,6x mais que o PIB per capita, enquanto em Houyhnhn, mais igualitária, o quintil mais rico ganha apenas 1,7x o PIB per capita.* Pois bem, para fazer funcionar a contento sua máquina pública, Laputa gastará 18% do PIB só em salários de funcionários qualificados, enquanto Houyhnhn gastará 8,5% do PIB com os mesmos funcionários.
Vamos lá: o simples fato de a desigualdade ser menor em Houyhnhn faz com que seu governo, para prover os mesmos serviços aos cidadãos, possa ter uma carga tributária 10% menor. O equivalente a desonerar o tal "setor produtivo" de toda a arrecadação estadual brasileira. Não é uma discussão pequena, em tempos em que hospitais erguidos não funcionam por falta de médicos, e universidades novas não conseguem achar professores. Na mesma tradição da direita que, previdente, pretende reformar a previdência pensando no longo prazo, os efeitos de uma redução de 10% na carga tributária no longo prazo não podem er subestimados. Sem coração de banana.
*Sâo as razões brasileira e japonesa, respectivamente.
Não é um processo muito complicado. A expectativa de renda de uma pessoa não é ilimitada (como proposto por algumas escolas econômico-filosóficas) mas, empiricamente, ancorada numa noção de renda justa que tem muito a ver com a renda observada do mesmo estrato social. As consequencias disso para o gasto do Estado se devem ao número de profissionais altamente qualificados que são necessários para a manutenção dos serviços públicos, desde a implantação de princípios ostensivamente meritocráticos para a burocracia de Estado na Prússia e na França (ok, e bem antes disso na China). Esses profissionais, parte de uma elite social por um zilhão de motivos (inclusive a reprodução intergeneracional de seu capital social ostensivamente meritocrático), e tem suas expectativas de renda balizadas pelo seu entorno. O Estado, portanto, (como qualquer empregador) a longo prazo terá o salário médio de seus profissionais qualificados puxado para a média dos salários de elite, ou bem terá que conviver com a insatisfação crônica desses profissionais e, no limite, o abandono por parte deles das carreiras públicas.
Vamos fazer uma simplificação tosca pra exemplificar a conta: Falemos de duas nações, Laputa e Houyhnhn. Em ambas, os funcionários públicos qualificados - médicos, professores universitários, promotores, auditores, e quejandos - representam 5% da população. Em ambos, os governos têm como prioridade o bom funcionamento dos serviços públicos, então o salário médio de seus funcionários está em linha com suas expectativas, isso é, em linha com os rendimentos do quintil (20%) mais rico da população. A diferença é que em Laputa, o quintil mais rico ganha 3,6x mais que o PIB per capita, enquanto em Houyhnhn, mais igualitária, o quintil mais rico ganha apenas 1,7x o PIB per capita.* Pois bem, para fazer funcionar a contento sua máquina pública, Laputa gastará 18% do PIB só em salários de funcionários qualificados, enquanto Houyhnhn gastará 8,5% do PIB com os mesmos funcionários.
Vamos lá: o simples fato de a desigualdade ser menor em Houyhnhn faz com que seu governo, para prover os mesmos serviços aos cidadãos, possa ter uma carga tributária 10% menor. O equivalente a desonerar o tal "setor produtivo" de toda a arrecadação estadual brasileira. Não é uma discussão pequena, em tempos em que hospitais erguidos não funcionam por falta de médicos, e universidades novas não conseguem achar professores. Na mesma tradição da direita que, previdente, pretende reformar a previdência pensando no longo prazo, os efeitos de uma redução de 10% na carga tributária no longo prazo não podem er subestimados. Sem coração de banana.
*Sâo as razões brasileira e japonesa, respectivamente.
5.10.12
O Xingu é aqui
Bem, aqui não, no Rio.
Em meio ao recrudescimento da conquista pela FIFA do Brasil, nesta semana vimos a mafiosa entidade suíça proibir o tabuleiro da baiana num raio de 2km do estádio Fonte Nova, em Salvador. O absurdo tem vários níveis. Proibir o produto local em prol do patrocinador massificado dentro do estádio já é absurdo, e desmente toda a parolagem piedosa de "sustentabilidade" e "legado social" que a FIFA roubou ao (um pouco menos mafioso) Comitê Olímpico Internacional. Na Alemanha, quando imposição semelhante foi feita em relação à cerveja, algumas das cidades conseguiram rebelar-se contra a possibilidade de ter que beber Heineken. Mas a FIFA foi além do estádio: proíbe que uma atividade tradicional e (até aqui) lícita aconteça nas ruas da cidade. Impõe sua lei a espaços que nada têm a ver com a copa (perdão, com a Copa do Mundo da FIFAtm), a gente que não se interessa por futebol. E - num momento em que a burrice, ao invés de servir de alternativa à malícia como explicação, se alia a esta - propõe um raio que só faz sentido num subúrbio americano para sua imposição. 2km da Fonte Nova inclui quase todo o Centro de Salvador, e todo o centro histórico, além de Comércio, Tororó, Lapinha... enfim, toda a região central da cidade. Quem estabeleceu o tamanho do raio de controle da FIFA das duas uma; ou mora num subúrbio de baixíssima densidade (não é só nos EUA que isso existe), ou não faz idéia do significado de 2km. Enfim, resumindo: não é tão hipérbole assim dizer que a FIFA quer, em 2014, proibir o tabuleiro da baiana.
Em Porto Alegre, o ataque à democracia foi menos radical, mas mais sangrento, e a FIFA pode até lavar as mãos do sangue literalmente derramado. Para defender o boneco representando o mascote da Copa 2014 – que chegou a ser derrubado -, foram deslocados cerca de 60 policiais militares do Pelotão de Operações Especiais (POE) do 9º Batalhão de Polícia Militar, além de tropas da Guarda Municipal. Os policiais jogaram bombas de gás lacrimogêneo, dispararam tiros com munição não-letal e partiram para cima dos manifestantes com seus cassetetes. Os relatos informam que sequer os jornalistas presentes foram poupados. Pelo menos três, que estavam devidamente identificados com seus crachás, foram agredidos: um fotógrafo do jornal Zero Hora, um repórter do Correio do Povo e um repórter da Rádio Guaíba. A lavagem de mãos é óbvia, afinal não foi ninguém da FIFA que mandou a polícia bater no povo para defender um boneco inflável. Et pourtant, se alguém usa de força desmesurada para defender os seus interesses, você é culpado sim. A mesma FIFA que se arroga o poder de proibir a venda de comida na rua em todo o centro de Salvador poderia usar da mesma arrogância para passar um pito no governo que a defendeu com sangue, no mínimo.
Não que tudo que os governos brasileiros façam com a desculpa da Copa do Mundo da FIFAtm seja realmente culpa dela. No Rio de Janeiro, Sérgio Cabral alega que a derrubada do antigo museu do índio, ao lado do Maracanã, é exigência da entidade, que nega. O edifício de 150 anos, que já foi sede do Serviço de Proteção ao Índio, do Rondon, e deixou de ser museu em 1978 quando o museu do índio foi transferido para Botafogo, foi ocupado por um grupo de índios de verdade, de todo o Brasil, que procuram fazer ali um centro cultural indígena. A idéia não foi considerada lucrativa pelo governo do estado, que prefere a área como estacionamento para o Maracanã - que o mesmo governo do estado já anunciou pretender privatizar, com um certo empresário dono de peruca como principal candidato a concessionário. Com shopping center associado, claro.
Não deixa de ser irônico: a FIFA, useira e vezeira em sacrificar a democracia ao lucro, está sendo usada como desculpa para que Sérgio Cabral venda um shopping center a Eike Batista, acobertando uma demolição e uma expulsão que, de outro modo, seriam impalatáveis politicamente. E é uma amostra da integração nacional, nos moldes desenvolvimentistas: índios no remoto Xingu são expulsos para gerar a energia necessária para iluminar o shopping center a ser criado aonde índios costumavam viver, na antiga capital federal.
(Sim, porque a energia de Belo Monte descerá por linhas DC para Furnas (MG) ou Tijuco (SP) diretamente. Não será gerada para a região Norte.)
Atualização: Assustado com a repercussão do causo, o governador da Bahia Jacques Wagner promete que não permitirá a proibição do Acarajé. A ver.
Em meio ao recrudescimento da conquista pela FIFA do Brasil, nesta semana vimos a mafiosa entidade suíça proibir o tabuleiro da baiana num raio de 2km do estádio Fonte Nova, em Salvador. O absurdo tem vários níveis. Proibir o produto local em prol do patrocinador massificado dentro do estádio já é absurdo, e desmente toda a parolagem piedosa de "sustentabilidade" e "legado social" que a FIFA roubou ao (um pouco menos mafioso) Comitê Olímpico Internacional. Na Alemanha, quando imposição semelhante foi feita em relação à cerveja, algumas das cidades conseguiram rebelar-se contra a possibilidade de ter que beber Heineken. Mas a FIFA foi além do estádio: proíbe que uma atividade tradicional e (até aqui) lícita aconteça nas ruas da cidade. Impõe sua lei a espaços que nada têm a ver com a copa (perdão, com a Copa do Mundo da FIFAtm), a gente que não se interessa por futebol. E - num momento em que a burrice, ao invés de servir de alternativa à malícia como explicação, se alia a esta - propõe um raio que só faz sentido num subúrbio americano para sua imposição. 2km da Fonte Nova inclui quase todo o Centro de Salvador, e todo o centro histórico, além de Comércio, Tororó, Lapinha... enfim, toda a região central da cidade. Quem estabeleceu o tamanho do raio de controle da FIFA das duas uma; ou mora num subúrbio de baixíssima densidade (não é só nos EUA que isso existe), ou não faz idéia do significado de 2km. Enfim, resumindo: não é tão hipérbole assim dizer que a FIFA quer, em 2014, proibir o tabuleiro da baiana.
Em Porto Alegre, o ataque à democracia foi menos radical, mas mais sangrento, e a FIFA pode até lavar as mãos do sangue literalmente derramado. Para defender o boneco representando o mascote da Copa 2014 – que chegou a ser derrubado -, foram deslocados cerca de 60 policiais militares do Pelotão de Operações Especiais (POE) do 9º Batalhão de Polícia Militar, além de tropas da Guarda Municipal. Os policiais jogaram bombas de gás lacrimogêneo, dispararam tiros com munição não-letal e partiram para cima dos manifestantes com seus cassetetes. Os relatos informam que sequer os jornalistas presentes foram poupados. Pelo menos três, que estavam devidamente identificados com seus crachás, foram agredidos: um fotógrafo do jornal Zero Hora, um repórter do Correio do Povo e um repórter da Rádio Guaíba. A lavagem de mãos é óbvia, afinal não foi ninguém da FIFA que mandou a polícia bater no povo para defender um boneco inflável. Et pourtant, se alguém usa de força desmesurada para defender os seus interesses, você é culpado sim. A mesma FIFA que se arroga o poder de proibir a venda de comida na rua em todo o centro de Salvador poderia usar da mesma arrogância para passar um pito no governo que a defendeu com sangue, no mínimo.
Não que tudo que os governos brasileiros façam com a desculpa da Copa do Mundo da FIFAtm seja realmente culpa dela. No Rio de Janeiro, Sérgio Cabral alega que a derrubada do antigo museu do índio, ao lado do Maracanã, é exigência da entidade, que nega. O edifício de 150 anos, que já foi sede do Serviço de Proteção ao Índio, do Rondon, e deixou de ser museu em 1978 quando o museu do índio foi transferido para Botafogo, foi ocupado por um grupo de índios de verdade, de todo o Brasil, que procuram fazer ali um centro cultural indígena. A idéia não foi considerada lucrativa pelo governo do estado, que prefere a área como estacionamento para o Maracanã - que o mesmo governo do estado já anunciou pretender privatizar, com um certo empresário dono de peruca como principal candidato a concessionário. Com shopping center associado, claro.
Não deixa de ser irônico: a FIFA, useira e vezeira em sacrificar a democracia ao lucro, está sendo usada como desculpa para que Sérgio Cabral venda um shopping center a Eike Batista, acobertando uma demolição e uma expulsão que, de outro modo, seriam impalatáveis politicamente. E é uma amostra da integração nacional, nos moldes desenvolvimentistas: índios no remoto Xingu são expulsos para gerar a energia necessária para iluminar o shopping center a ser criado aonde índios costumavam viver, na antiga capital federal.
(Sim, porque a energia de Belo Monte descerá por linhas DC para Furnas (MG) ou Tijuco (SP) diretamente. Não será gerada para a região Norte.)
Atualização: Assustado com a repercussão do causo, o governador da Bahia Jacques Wagner promete que não permitirá a proibição do Acarajé. A ver.
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