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11.7.12

Corrupto e incompetente

Morador da Terra da Garoa há seis anos, trouxe meu voto para cá apenas neste ano, procurando dar uma ínfima contribuição contra a dupla que tudo proíbe. Assim, perdi a oportunidade de pela primeira vez na vida ver uma eleição a prefeito do Rio minimamente decente; até o tecnocrata de direita que concorre à reeleição é melhor do que a média. Não que eu votasse nele, claro - votaria no Freixo, que até herói de filme é. Mas confesso, não votaria tão empolgado não. Até pretendo doar dinheiro pra campanha, mas sem tanta empolgação. Isso porque o Freixo padece do mal comum na política de achar que a virtù superará os obstáculos; não há propostas concretas, do tipo chato de ler e que envolvem "aumentar imposto tal ou cortar gasto tal para aumentar o outro gasto assim ou assado." 

Que fique claro: Freixo não é a Heloísa Helena, que, como se fosse a segunda vinda de Fernando Collor, tinha sua campanha alicerçada no governo ser "corrupto e incompetente" (Collor, o primeiro, berrava isso como se fosse mantra em seus comícios), abandonando qualquer proposta de esquerda. Ele merece minha doação porque fala de outro modelo de cidade também. Mas não explica como chegar lá - "a cidade tem muito dinheiro," disse em entrevista recente. E, bem, não é verdade que a cidade tenha muito dinheiro, pelo menos não sobrando. A intervenção de maior vulto que se fala em abandonar, a reforma da Zona Portuária, está sendo conduzida com dinheiro privado alicerçado em recebíveis imobiliários e de direito de construir; fosse cancelada, a Prefeitura não ganharia um ceitil.

Mencionei, há uns posts atrás, o tal gráfico pelo qual metade do orçamento federal brasileiro iria para o pagamento da dívida, que confunde rolagem com gasto. A confusão é como se alguém não pagasse a conta do cartão e passasse a contabilizar em suas despesas mensais, não os juros do cartão, mas o total devido, todo mês. Vendo o gráfico, tem-se a ilusão de que governar é fácil, com a virtù de nosso lado; é apenas a maldade de gente que privilegia banqueiros que faz com que não transformem o país/estado/cidade numa nova Cocanha. Enquanto isso, o Brasil de verdade tem déficit nominal, o que significa que o mantra da esquerda (petista, psolista, ou outra) de "diminuir o superávit primário" pode ser traduzido por "contrair mais dívida" ou, no longo prazo, "dar mais dinheiro a banqueiros." O único jeito de parar com isso seria declarar uma moratória - o que resultaria em uns 2% do PIB, ou 8% do orçamento federal, a mais. E uma enorme quebradeira de empresas em todo o país, para não falar dos cidadãos com contas nos bancos, que quebrariam com essa enorme moratória.

Do mesmo jeito, Heloísa Helena explicou como trataria greves em seu governo: "no meu governo não haverá greves, porque será um governo de trabalhadores!" Ora, isso significaria aumentar indefinidamente o salário de gente que já ganha dez, quinze vezes a renda média brasileira. De uma elite restrita, e não dos proletários. Há greves justas - como a atualmente em curso, que paralisou praticamente todo o sistema federal de ensino - e greves nem tão justas, como as que anunciam o Itamaraty, agências reguladoras, e o Ministério Público. Estes, aliás, foram os maiores lobistas pela alteração, em 2010, dos salários de presidente, ministro, e deputado, já que o salário a que postulam é maior do que o salário presidencial de 2010. É justo que a diferença de salário entre um barnabé e o cargo de presidente da república seja inferior a 50%? E que a diferença de salário entre o mesmo barnabé e um faxineiro, por outro lado, seja de 20x? E não há mesmo dinheiro o bastante (não haveria nem que o tal gráfico não fosse mentiroso) para nivelar o salário do faxineiro pra cima tanto assim.

O governo pode até ser "corrupto e incompetente." Mas o governo não é só quem lhe chefia. E geralmente mesmo esses chefes não são tão corruptos e incompetentes assim - há exceções, claro, como o próprio Collor, mas nem Dilma nem Lula, nem FHC, nem sequer o Sarney são o bicho papão pintado. Marcelo Freixo, que investigou milícias, deve saber disso bem, pelo menos empiricamente. Espero que saiba, também, que só virtù não basta; que haverá greves em seu governo, que terá que lidar com gente desagradável, que não há muito dinheiro sobrando, que frustrará seus eleitores mais apaixonados.

Sim, tô sendo otimista.


Atualização de 28/9: Bueno, por um lado o PSoL chamou ao seu palanque aliadas de fora. Por outro, essas aliadas são justamente representantes da corrente udenista da política, Marina Silva e Andréa Gouvêa Vieira (esta representa o primeiro convite à direita pelo PSoL de que tenho notícia). E Freixo disse, "- Eu respondo todo dia a mesma pergunta. Todos me perguntam, se eu for eleito, como vou governar com a Câmara. Mas a pergunta não é essa. A pergunta é: como a Câmara vai sobreviver ao nosso governo? A Câmara vai ter que mudar o perfil. E vocês vão ser fundamentais nisso." O que não é tão grave quanto o "não vai ter greve" da Heloísa Helena, mas também não é legal.

Por outro lado, como Freixo também disse, em entrevista ao Valor, que "[Os eleitores da Zona Sul e da elite] são menos reféns do poder econômico das campanhas e conseguem driblar o efeito maciço da campanha rica," id est, "rico vota consciente ao contrário de pobre," sinceramente, meu ânimo com o Freixo tá cada vez arrefecendo mais. Parabéns pelo maciço ao invés de massivo, pelo menos.

2 comentários:

Marcus Pessoa disse...

A melhor parte do post é "tô sendo otimista", hehehe.

Mas eu acho que há sim um ganho financeiro enorme se houver um combate efetivo à corrupção, que é um ralo grande de dinheiro.

Já conheci casos de prefeitos aqui no Pará que viraram lenda só porque não roubavam, e com o dinheiro que tinham dava pra fazer coisas que nenhum outro fazia.

thuin disse...

Bem, aí é o caso da escala Collor de corrupção e/ou incompetência (ou, possivelmente, Garotinhos e Cesar Maia também). Mas não vejo essa escala de roubo nos governos atuais brasileiros dos quais tenho mais informações.