A força que ganhou o tema "Belo Monte" depois da adesão de estrelas da Globo à campanha contra a construção da usina comprova, talvez, que a era dos virais da internet ainda não suplantou a dos velhos mídias. Belo Monte, de problema de ecochato e gringo, virou cause cèlebre nacional. E eu, que sou do contra e falava mal da represa desde muito antes, e em especial do silêncio dos candidatos presidenciais, Marina incluída sobre a questão, vou ser do contra de novo: agora a Inês é morta, os cavalos escaparam pela porteira, o leite derramou. Os maiores problemas socioambientais derivados de hidrelétricas na Amazônia não são os causados pelo lago*, mas aqueles derivados do fluxo habitacional temporário e da interrupção do curso do rio, partindo em dois um ecossistema integrado (muitos peixes, eg, se reproduzem nas cabeceiras de um rio, mas vivem sua vida adulta no curso principal, ou mesmo no mar).
O segundo fator continua sendo preocupante em Belo Monte, sem dúvida, mas escadinhas de peixe, como a que existirá, amenizam ele bastante. Não é fácil quantificar se Belo Monte vai ser mais danosa aos peixes do Xingu do que um parque eólico equivalente seria às aves marítimas do Nordeste. O primeiro, que é o pior deles, é que essa imensa massa humana (em Belo Monte, fala-se de 100.000 pessoas - mais do que a população atual de Altamira - ou de Corumbá, ou de outros cinco mil municípios brasileiros - é transiente e desocupada. A usina não precisa durante sua construção de todos aqueles que são atraídos pela notícia dela, e depois da construção, de quase ninguém. E aí você tem dezenas de milhares de pessoas sem ocupação nem como voltar pra casa, cuja única alternativa é a agricultura de subsistência no que um dia foi floresta. O que, é claro, gera poluição e desmatamento, e conflitos com os índios e ribeirinhos.
Ora pois, a essas alturas o povo já se mudou pra Altamira. Cancelar a obra não faria tanta diferença assim. Belo Monte não será um problema ambiental, já foi um problema ambiental. Por isso é que eu não me importo mais tanto assim com ela. Por outro lado, e infelizmente sem nenhuma atenção global (será que vão fazer vídeo depois de feito o estrago?), o novo, e retrógrado, código florestal caminha para ser aprovado no Congresso. O novo código, não custa lembrar, causaria o desmatamento de uma área literalmente 500 vezes maior que a do lago de Belo Monte, na projeção mais otimista. Centenas de vezes maior, mesmo incluindo o desmatamento induzido. Sem vídeo da Globo avisando que a parolagem ambientalista de que a legislação ambiental brasileira é rigorosa é uma mentira deslavada, e que o contrário é verdade - na maioria dos países, o desmatamento permitido é zero, não 20 a 80% de uma propriedade.
*a não ser que se cometa a burrice de deixar a floresta lá para ser alagada, caso em que a usina emite metano em proporção pior, para o efeito estufa, do que se fosse uma usina de carvão do mesmo tamanho.
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