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23.3.11

Muamar X.

Neste momento, em que cada vez mais dúvidas se avolumam sobre o resultado e o significado dos ataques da OTAN às forças de Khadafi, leio uma crônica do Veríssimo reclamando da profusão de grafias utilizadas para transliterar o nome do ditador no alfabeto latino. O que o Veríssimo talvez não saiba é que essa profusão é oficial. Khadafi, com o espírito de porco e o gosto pelo espalhafatoso e bombástico que lhe são peculiares, tem alterado a grafia latina oficial de seu nome ao longo de suas quatro décadas de poder, justamente para confundir todo mundo. A Biblioteca do Congresso americana finalmente desistiu de acompanhá-lo, para efeito de indexação, lá pelo fim dos anos 90.

Falei de espírito de porco e gosto pelo espalhafato? Pode ser. A descrição também se aplica à tenda que ele carrega por onde anda ao invés de se hospedar em hotel ou nas embaixadas líbias, com o resultado de atrapalhar a vida de todo mundo. Ou à sua guarda pessoal de ninjas gostosas. Ou aos caftãs de beduíno que, combinados aos óculos escuros, lhe dão meio uma aparência de camelô do Saara. (Bem, um camelô que usasse botox.) Mas acontece que todas essas coisas ajudam a montar uma imagem que é útil a um sujeito que, afinal, sobreviveu como ditador durante quase uma década a mais do que eu tenho de vida. "Excentricidades" e "fraquezas" que ajudam alguém a construir a imagem que deseja são coisa de esperto. Qadaffi, com elas, neutraliza parte da sua imagem de ditador no exterior (muita gente chega a apoiá-lo, principalmente contra os EUA) e se autoapresenta como um "homem do povo" na Líbia - uma de suas afetações menos conhecidas fora do país é só falar num carregado dialeto local de sua tribo, coisa que tem poucas chances de ser natural já que até os anos 80 ele ainda falava árabe padrão culto.

Mesmo a guarda pessoal de ninjas gostosas, ou a "voluptuosa" enfermeira ucraniana mencionada no wikileaks, não deixam de se prestar a essa narrativa. No caso, funciona como com o seu colega de festas bunga bunga, Silvio Berlusconi, e a imagem de velho tarado é simpática a uma fração significativa do eleitorado machista.



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Alguém mais tem a impressão de que, se para o povo líbio e árabe em geral a situação na Líbia é uma sinuca de bico em que não se pode ganhar, para o Ocidente tanto a cooptação quanto a derrota da "primavera dos povos" árabe são boas conclusões do processo desencadeado com a resolução da ONU?

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