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2.1.06

Unanimidades

Todo mundo (mesmo) que não está no Banco Central é contra os juros altos. Até os banqueiros associados com eles, já se manifestaram contra, na pessoa dos "economistas-chefes" dos grandes bancos. Todos os candidatos, no governo e fora dele, defendem a sua redução, mesmo os que já defenderam como razoável uma taxa SELIC de 40% ao ano.

Mas será que tem alguém que se beneficia das taxas altíssimas? Os bancos, geralmente apontados como vilões da história, pelo visto não. Com o menor juro real em muito tempo, 2004 foi um ano de lucros recordes. A Febraban é um cartel, e um cartel de bancos (sem ser um cartel bancário paraestatal, como no Japão e na Alemanha) vai ter lucros horrorosos, não importa o que aconteça. Se baixarem os juros, eles aumentam o crédito. Se houver um holocausto nuclear, desconfio da possibilidade de os bancos brasileiros continuarem a ter lucros recorde.

Então, quem realmente tem interesse nos juros altos? Deixando de lado a classe média-alta rentista, com a renda fixa ou a "multiconta" rendendo 13% ao ano, as empresas de grande porte - principalmente as privatizadas e/ou multinacionais. Têm grandes dívidas em dólar (é o caso da própria Globo, que no ano que passou deu um calote, curiosamente menos criticado como falha moral do que o calote argentino), e a valorização do real aumenta os lucros em dólar. Até as exportadoras - que teoricamente têm a perder com aumento de custos - vêem, na maioria dos casos, um número suficiente de "compensações," fora a original. A Vale do Rio Doce lucra mais cobrando frete em reais do que vendendo ferro em dólar. A Bunge e a Cargill lucram mais vendendo fertilizante do que soja. As montadoras vendem ainda primariamente pro mercado interno. Etc etc etc.




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Todo mundo reclama de que o brasileiro paga imposto demais. Eu já desconfio de que não pague imposto demais, pague impostos demais, mas isso não vem ao caso. O caso é que os impostos não vêm do nada. Foram aumentados em 10% durante o governo FH para cobrir uma expansão do gasto público que todo mundo acha imprescindível - aliás, que todo mundo quer aumentar. Mesmo cortando os juros, o gasto público brasileiro para sustentar cositas como SUS, com uma renda per capita baixa, é esse mesmo. E a falácia de "eu pago que nem na Escandinávia, devia ter serviços de qualidade escandinava" faz todo o sentido. Por exemplo, se eu gastar 0.1% do dinheiro que tenho numa casa, que nem o Bill Gates fez, devia ter uma mansão que nem a dele. Ou vão começar a comparar alhos com alhos, e falar do gasto público brasileiro em dólares comparado ao escandinavo?


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O IBGE finalmente anuncia que vai começar a levar a sério o setor de turismo. Mas a meta "ambiciosa" do governo é chegar a um patamar de turismo comparável ao da Tunísia. E enquanto isso, com o incentivo do ministério da agricultura, algumas das principais "reservas" de turismo a ser exploradas vão desaparecendo. Taí um belo motivo pra defender a "reserva de mercado" de 35 dias para filmes nacionais - quem sabe assim brasileiros (e outros, mas principalmente brasileiros) se interessam mais em viajar no Brasil que na Route 66.


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Falando na dita produção cinematográfica, concentrada nos estados mais ricos como tudo no Brasil, pesquisas de opinião confirmam que o discurso dos governantes cariocofluminenses de que o governo federal persegue o Rio colou. Imagina se o Brasil tivesse, regionalmente, uma estrutura de distribuição de fundos federais progressiva. Mesmo com os bancos de desenvolvimento (do NE e da Amazônia), em termos regionais como pessoais, o estado brasileiro é dos menos distributivistas do mundo, apesar do poder das oligarquias de estados menores. Os efeitos? Enquanto nos EUA a diferença de renda entre os estados pobres do Sul (menos Virgínia, inflada pelos subúrbios da capital federal) e a Nova Inglaterra é de 75% sobre a renda dos primeiros, e na França a diferença entre a Córsega e as regiões industriais em torno de Lyon e Ruão é de 31% da renda da primeira, no Brasil a diferença entre os estados do Nordeste e São Paulo (que é grande o bastante pra ser uma "região" sozinho) é de 254%.

PS - Nos EUA, a comparação é por mediana de renda famliar, no Brasil e na França por renda per capita. Em nenhum dos três foi contado o distrito federal, no qual as rendas são muito mais altas, o que atrapalha a situação francesa, por conta do peso de Paris para além do Estado - a diferença de renda entre a Île de France e a Córsega é de 100%. O Maranhão (Brasil) e as colônias americanas e francesas foram deixados de lado porque tão muito abaixo da curva e têm peso populacional relativamente desprezível.

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