Pesquisar este blog

30.9.05

EXPLETIVE!

Tony Blair - boldly going where only Bush's proctologist has ever gone before.

Wish list :

to have more stringent "anti-terrorist" legislation than US PATRIOT. Check. (90 dias sem acusação na cadeia; 5 anos de cadeia por falar bem de terrorista)

to kill more suspected terrorists at home. Check.

to practice Reaganomics. Check (evolução do Gini inglês positiva em quase 0.05)

to increase military spending. Check.

to make Greens angry. Check. (fresquin)

Recordar é viver

Em 1990, o país que estava em primeiro lugar no índice de competitividade do Fórum de Davos era o Japão.

29.9.05

Lógica

Não é só o Globo falando mal do Lula que tem dívida com Lewis Carroll, Lula falando bem do Lula também. Ao inaugurar uma fábrica de 3,6bn da Stora Enso, produtora de commodities para o mercado externo, o presidente disse que (parafraseando) "é de investimentos como esse que o Brasil precisa para deixar de ser um produtor de commodities para o mercado externo."

Em outros termos, A = -A.

Detalhe 1: O dito investimento tem financiamento do BNDES. Em troca do financiamento, a Stora Enso destinou 21 milhões a projetos sociais. Para efeito de comparação, os requerimentos sociais e ambientais em que teria incorrido se tivesse instalado a fábrica em seus países de origem, a Suécia ou a Finlândia, teriam custado no mínimo 8% do preço do projeto, ie uns 300 milhões. Lembrando: 1,45bn do dinheiro foi nosso. Se o BNDES comprasse dívida brasileira a baixo juro, como os correios japoneses fazem, saia mais rentável. A Agência Brasil fala em 10.000 empregos, o que dá 145.000 reais por emprego.

Detalhe 2: Procurar esse artigo no site da Folha deu numa notinha mínima. A falta que um Alckmin no palanque faz.


Companheira Marisa da Silva

28.9.05

Treplicando

Continuando um pouco a própria "carta aos reaças," e um pouco o comentário do André.

A idéia de que "é difícil definir quem é o quê no Brasil" é um lugar comum, com uma base real na comparação com os EUA,* em que o racismo é baseado na ascendência. Mesmo que não haja mais nos EUA leis, como havia antigamente**, definindo qual a proporção de sangue negro que faz de alguém negro, a definição ainda é simples, e um afro-descendente que queira dizer que é branco estará "passing," fingindo, ao contrário daqui, em que a mesma pessoa será branca de verdade. O problema dessa formulação é que ela tem uma meia-verdade embutida, e que é irrelevante mesmo quando é verdade.

A meia verdade: é difícil definir exatamente quem é o que no Brasil, dentro de uma fatia específica da população, que inclui parte dos "pardos" e parte dos "brancos. Não em geral. A Bené é preta, e ninguém duvida disso. A Rosinha Garotinho é branca. O Vicentinho e a Marina Silva já são mais complicados. E notem, ao contrário do que quer o movimento negro, que rejeita a classificação do IBGE em facor de uma dualidade branco/negro, a situação dos "pretos" é, em todo o Brasil, muito pior do que a dos "pardos." Mesmo tirando todas as variáveis exóticas. Pretos vivem mais separados dos brancos, têm menos valor no "mercado" matrimonial, ganham menos, são mais revistados pela polícia...ressalte-se, fazendo a eterna comparação com os EUA, que mesmo os pretos ainda sofrem de discriminação matrimonial umas vinte vezes menor do que nos EUA, com a pior região metropolitana brasileira, o Vale do Itajaí,**** tendo a mesma segregação matrimonial que a melhor americana, Washington.

A irrelevância: uma distinção clara entre grupos humanos não é condição necessária nem suficiente para o preconceito, ao contrário da teoria senso-comunista de que o racismo advém da observação das diferenças. Não só o racismo em suas diversas encarnações, da cordial à apartada, como até a xenofobia, que é muito mais radical e rejeita o contato, prescinde da possibilidade de distinção clara. A guerra da Bósnia é um exemplo: na Bósnia-Herzegovina pré-dissolução, a população falava serbo-croata. Não existe distinção física nem de sotaque. Dos 60% que responderam alguma coisa ao invés de simplesmente "iugoslavo" ao Censo, 36% se casavam com gente do "outro grupo." O sentimento religioso não era nem é particularmente pronunciado. A segregação residencial estava abaixo de 25iv* E conseguiram, mesmo assim, entrar em uma guerra étnica.

Do mesmo modo, o racismo no Brasil nunca precisou de uma distinção clara para se perpetuar. Nunca houve barreiras definidas, e nunca houve entraves ao contato que fosse iniciado pelo indivíduo que está acima na escala. O racismo brasileiro, se quiser assim, segue uma lógica individualista, "de mercado," que se opõe à lógica hierárquica do racismo americano ou sul-africano.v*Ao invés de ser enfiado pela sociedade numa casta específica, o indivíduo tem uma certa quantidade de "capital racial," que ele utiliza junto com "capital social," "capital educacional,' "capital mesmo' e afins. A questão é que esse capital racial não tem nenhuma tendência maior à equalização ao longo do tempo do que os outros capitais.

Claro que isso não impede que haja outras formas de preconceito no Brasil, e que elas infelizmente não disponham da mesma quantidade de inimigos que o racismo. Não só o preconceito social é aceito; preconceitos étnicos diversos também são, dos mais leves ("aquele turco safado finalmente foi preso", "japoneses foram mortos," "parece coisa de judeu") ao mais comum e, por ser exclusivamente brasileiro, não identificado como preconceito étnico, que é o preconceito contra nordestinos.vi* Mas aí é que está - com todas as minhas críticas à posição do movimento negro, foi graças a ele, e não a alguma evolução natural da sociedade, que o racismo deixou de ser escamoteado no Brasil. Até há pouquíssimo tempo atrás, o Brasil, oficialmente, era um país em que não havia racismo, como apregoado pelos relatórios brasileiros sobre racismo enviados à ONU. Essa mentira já foi denunciada no genérico, mas ainda não no particular, a ponto de se ter a situação em que racismo é crime inafiançável, mas os milhares de casos cotidianos - da pessoa preta que não pode usar o elevador social ao ministro do Supremo Tribunal Federal barrado pelos seguranças na própria possevii* - não geram condenações. É uma falácia falar de outros males brasileiros, ou mesmo de outros preconceitos, como argumento contra a luta anti-racista; uma coisa não exclui a outra - e, cinicamente, eliminar preconceitos de classe numa sociedade capitalista é um pouquinho difícil. O que gera um efeito interessante - a interação do racismo brasileiro com o preconceito de classe, ao mesmo tempo que minora a violência e radicalidade desse racismo, o torna mais difícil de eliminar.


E pra parar o texto abruptamente, apesar de não ter chegado a um final decente, lanço o Manifesto de um Homem Só Pelos Bugres nas Novelas de Época, do movimento pró-gobineau AMARACISTANOJENTO.


*A comparação é inevitável; no universo conceitual brasileiro, o etnocentrismo está mais centrado na metrópole do que cá na colônia.

**E ainda há para os índios.

***Sim, tanto pra uma quanto pra outra a quantidade de pretos (VdI) e negros (DC) na população geral já tendo sido levada em conta e eliminada.

IV* Para efeito de comparação, o mesmo índice, de dissimilaridade espacial, varia para negros (BR: pardos+pretos) entre 37(SP, RJ, PoA) e 48 (Salvador) no Brasil, e entre 75(NY) e 92(Chicago) nos EUA.

V* O racismo na Europa, apesar de se constituir basicamente em preconceito étnico, é ainda uma terceira história, embora tenha, na França desde as levas imigratórias da virada do século e na Grã-Bretanha desde a leva caribenha pós-descolonização, características que se assemelham mais na forma ao modelo americano, e no resultado ao modelo brasileiro.

VI* A força da associação entre preconceito étnico e socioeconômico no Brasil pode ser medida pela violência relativa do preconceito contra os grupos de imigrantes mencionados e os "paraíbas" e "baianos."

VII* Depondo contra a teoria da exclusividade do preconceito social; afinal de contas, é um juiz, velho e bem vestido tentando entrar no Supremo, não um sujeito em trapos. Ou, como disse uma tia-avó minha uma vez sobre o próprio filho, "ele entrou no aeroporto todo sujo e cheio de craca nas pernas. Ainda bem que ele é branquinho, senão tinham jogado ele no lixo."

Architeuthis Dux

Eu não disse que elas iam conquistar o mundo? Já nem se preocupam mais em se esconder, o que significa que nossa derrota é inevitável. Claro que, como sublinha o artigo da BBC, temos uma arma

Bottom-trawling by fisheries is destroying squid egg masses on the seabed, Dr O'Shea claimed. Evidence for this comes from an efficient squid predator - the sperm whale.



Mais fotos na National Geographic.


PS eu odeio ter que lembrar disso, mas o nosso querido amigo Architeuthis Dux não é tão grande quanto lhe pintam, e não é o maior prato no menu dos cachalotes. Mais informações na Giant squid and colossal squid fact sheet.

27.9.05

Teoria do desenvolvimento

A conclusão, para qualquer pessoa minimamente informada, é óbvia: o Brasil só não Deu Certo porque até hoje nunca teve um partido político que hasteasse a bandeira da moralidade, nem apoio do governo para o latifúndio exportador.

26.9.05

Carta aos reaças.

Caros amigos.

Reconheço que a tese da "democracia racial" brasileira tem um valor tradicional que não caberia bem descartar. Afinal, que seria do mundo sem a tradição? E boa parte da identidade brasileira foi construída a partir dessa ideologia. Mais do que isso - a própria denúncia da democracia racial parte da própria, já que o Florestan Fernandes, que foi o primeiro "acadêmico" a fazer essa denúncia (cinicamente, o primeiro branco, mas cinismo não é conservador, não é mesmo?), tinha sido contratado pela UNESCO para descobrir o segredo da falta de racismo, e engarrafar para distribuir mundo afora.

Só tem um probleminha. Quando vocês usam a democracia racial e a "falta" de racismo no Brasil pra acusar quem vê racismo de racista, isso pode até fazer vocês se sentirem bem, mas não engana ninguém. A declaração de que "não existe preconceito racial, existe preconceito social associado à cor preta" chega a ser ridícula. Se existe preconceito associado à cor, existe preconceito de cor. E sinto muito, mas há uma quantidade bastante razoável de dados indicando que existe, sim, preconceito racial que vai além da ligação com a classe socioeconômica. Menos do que em muitos outros países, é verdade, apesar de os dados serem distorcidos, nas metrópoles do Sudeste, pela falta de uma resposta "paraíba" à pergunta sobre cor/raça. E, por isso mesmo, tenho uma idéia pra vocês, se quiserem mesmo ser anti-racistas e se opor ao movimento negro ao mesmo tempo.

Vejam bem, muitos de nós (nós, a elite, quase toda branca a ponto de gente de países mais segregados ficar com a impressão do Brasil como especialmente racista) dizemos, até com certo orgulho, que temos ancestrais negros. Vide o pé na cozinha do Príncipe dos Sociólogos. O problema é que esse pé é uma afetação, mais do que um sentimento de identidade, e segue os passos do Gilberto Freyre, em que os brasileiros se misturaram "com" os negros e índigenas, ou seja "os brasileiros" são os brancos. Todas essas declarações de amor à democracia racial vêm de um povo que se vê branco, de um país branco com negros oprimidos. Toda a construção do "brasileiro' desde o Freyre e o Getúlio passa por isso. Por um lado, se hiperenfatiza o papel dos imigrantes, como se nós tivéssemos recebido mais deles do que a Argentina ou os EUA, por outro o "brasileiro" misturado é o peão, é um outro. Tudo bem, a posição desconfortável de petit bourgeois global que ocupamos não é só nossa, é de todas as elites subdesenvolvidas.

Vamos ser sinceros. Há racismo no Brasil, há uma desigualdade racial imensa, e isso tem que ser remediado. E não vai ser remediado através de políticas neutras, ou sequer de políticas dirigidas aos pobres, já que uma condição socioeconômica equivalente não elimina o racismo. Que o digam os judeus. Então, o que fazer, se você é um conservador e abomina o movimento negro, ações afirmativas e o escambau? Não estou dizendo que isso faz de você um racista, existem bons motivos nacionalistas para não gostar de algo que é uma forma de nacionalismo rival. E olhe só, a declaração de que status socioeconômico e educacional não acaba com o racismo, se você pensar bem, também serve contra as cotas.

Que tal uma idéia - fazer uma campanha nacionalista capitalizando em cima do fato de o Brasil ser um país mulato? Não um país "que se misturou com negros e com indígenas," um país negro mesmo, no sentido mais amplo? Que tal enfiar retratos do Machado de Assis, do Lima Barreto, do André Rebouças, do Abdias do Nascimento, do Luiz Gama, para competir com a imagem do Zumbi? Dizer que afro-brasileiro é pleonasmo, lembrando que a civilização brasileira foi feita por mulatos, que antes de trazerem os imigrantes para embranquecer o país até a elite era mulata, como observou o Gobineau (que, afinal, era um especialista...)? Mandar a Globo retratar isso nas novelas de época, ao invés daquele quadro que acaba parecendo mais o Antebellum na Geórgia do que um engenho de café no Vale do Paraíba? Desarianizar a história do Brasil? Incentivar a história da África e das relações desta com o Brasil nas escolas? Em suma, fazer um nacionalismo da democracia racial que não fosse mais baseado num ator central branco que não tem preconceitos?

Não sei se ia adiantar. Mas pelo menos vocês poderiam alegar estar fazendo alguma coisa contra o racismo, ao invés de só ficar dizendo que quem tenta enxotar o rinoceronte que está na sala é culpado pelo rinoceronte.


Alvíssaras.

24.9.05

No país do espelho

O Globo noticia "Governo Lula criou Banco Popular do Brasil, Empresa de Pesquisa Energética, e Hemobrás."

Na mesma matéria em que uma confusão entre definições diferentes de "criação de empresa" é usada para fazer manchete, com a operação cotidiana da Petrobrás e do Banco do Brasil virando criação de novas empresas, O Globo também redefine toda a teoria dos negócios, ao dizer que o Banco Popular do Brasil "já" está dando prejuízo.

Lugares estranhos do mundo I Redux

O Mar de Aral, em mapa e em satélite.


23.9.05

O verde das nossas matas

Empresa de celulose dobra produção e causa "boom" florestal

****
R-r-r-r-REVENGE!

Mamba negra

Enquanto isso, o Rita fez zigue ao invés de zague, e não será o quinto furacão a bater nos EUA com vento de categoria 5 no olho. Pela primeira vez em muito tempo, mas provavelmente por pouco tempo, emprego e produtividade crescem simultaneamente no Brasil. O Daniel Dantas repetiu a performance do Duda Mendonça,e a Heloísa Helena a do Bolsonaro.

E eu vi o cúmulo dos cúmulos do pidgin-Portuguese. No cartaz da HBO, Uma Thurman e o doce sabor da revanche.


Snake charmer

21.9.05

Coitadinhos

Maluf diz que, na cadeia, "não lhe dão nenhuma liberdade." A advogada de Beira-Mar ficou chocada porque, em São Paulo, ele era "tratado como um prisioneiro."

Coitadinhos. Enquanto isso, os prisioneiros de verdade vão sendo amontoados nas cadeias, no Brasil e no mundo, várias vezes mais do que a superlotação permitiria. E existe um Fundo Penitenciário (existe fundo pra tudo no Brasil), que dos seus 7 (? tenho que conferir) anos de vida só foi usado em 2003.


***********

O supremo acaba de derrubar um dos dois últimos atos de FH como presidente, a tentativa de se impedir que ex-mandatários pudessem ser julgados por crime cometido no exercício do poder. O outro foi empurrar o limão da licitação de aviões de guerra pro Lula (que este tentou converter em limonada associando o adiamento ao fome zero).

17.9.05

Take a hint, Mr President

And finally, New Rule: America must recall the president. That's what this country needs. A good, old-fashioned, California-style recall election! Complete with Gary Coleman, porno actresses and action film stars. And just like Schwarzenegger's predecessor here in California, George Bush is now so unpopular, he must defend his jog against...Russell Crowe. Because at this point, I want a leader who will throw a phone at somebody. In fact, let's have only phone throwers. Naomi Campbell can be the vice-president!

Now, I kid, but seriously, Mr. President, this job can't be fun for you anymore. There's no more money to spend. You used up all of that. You can't start another war because you also used up the army. And now, darn the luck, the rest of your term has become the Bush family nightmare: helping poor people.

Yeah, listen to your mom. The cupboard's bare, the credit card's maxed out, and no one is speaking to you: mission accomplished! Now it's time to do what you've always done best: lose interest and walk away. Like you did with your military service. And the oil company. And the baseball team. It's time. Time to move on and try the next fantasy job. How about cowboy or spaceman?!

Now, I know what you're saying. You're saying that there's so many other things that you, as president, could involve yourself in...Please don't. I know, I know, there's a lot left to do. There's a war with Venezuela, and eliminating the sales tax on yachts. Turning the space program over to the church. And Social Security to Fannie Mae. Giving embryos the vote. But, sir, none of that is going to happen now. Why? Because you govern like Billy Joel drives. You've performed so poorly I'm surprised you haven't given yourself a medal. You're a catastrophe that walks like a man.

Herbert Hoover was a shitty president, but even he never conceded an entire metropolis to rising water and snakes.

On your watch, we've lost almost all of our allies, the surplus, four airliners, two Trade Centers, a piece of the Pentagon and the City of New Orleans...Maybe you're just not lucky!

I'm not saying you don't love this country. I'm just wondering how much worse it could be if you were on the other side. So, yes, God does speak to you, and what he's saying is, "Take a hint."

15.9.05

Decupagem

O relatório "Doing Business" do Banco Mundial recebeu bastante atenção na imprensa brasileira, pelo compreensível motivo de o Brasil figurar nele em 115º lugar (um à frente da Venezuela). Não lembro, porém, de nenhum jornal separando o ranking em seus dez sub-rankings, nos quais as posições brasileiras são bem díspares, muito menos os sub-rankings em seus componentes (que, de novo, são bastante heterogêneos). Como ficar com os pés no fogão e a cabeça na geladeira não é muito saudável, aqui a ficha.

Curiosamente, o país com (há três décadas) os maiores juros do mundo sai bem na categoria "obtenção de crédito." Tudo bem, isso é porque o índice não inclui os juros ou a facilidade de um empresário obter crédito na praça, mas apenas os fatores que em tese condicionariam isso (e são usados para explicar o alto spread brasileiro), "Strength of legal rights index, depth of credit information index."* Bom, não contavam com a astúcia deles.


*"The Legal Rights Index ranges from 0-10, with higher scores indicating that those laws are better designed to expand access to credit. The Credit Information Index measures the scope, access and quality of credit information available through public registries or private bureaus. It ranges from 0-6, with higher values indicating that more credit information is available from a public registry or private bureau."

Pão de pobre não cai assim não

Tem gente do PT esperançosa, e gente do PSDBFL amedrontada, com a possibilidade de que o próximo ano seja bom pra economia. A pesquisa CNT/Sensus parece indicar que esperança e medo estão fora de lugar; em uma fase econômica que pode não ser espetacular, mas é melhor do que qualquer coisa que a maior parte da população brasileira viu enquanto adulta, a avaliação da economia não está muito longe do que era em inícios de 2002.

Faz sentido. Avaliar economia já não é fácil pra quem lida com ela profissionalmente, e a maior parte da população brasileira é semi- ou completamente analfabeta. Se houvesse, como nos EUA, uma classe média investindo em ações grande, poderiam ser influenciados pelos índices da Bolsa e quevalhas, mas a maior parte dos brasileiros tem dificuldades em prover necessidades básicas, imagine investir em ações.

Você sabe que está ficando velho...

Quando pensa, espontaneamente, "vivi para ver isso."

Pois é, vivi pra ver Gabeira e Freire abraçados ao Caiado gargalhando. Tudo bem o PPS era da base do FH, e o PV presidido pelo Zequinha, mas a imagem ainda choca. A internet lerda e a cassação do Jefferson cooperaram pra me fazer desistir de achar uma foto pra pôr aqui. Já votei no Gabeira, e ganhei o apelido de "comunista" quando fiz remo porque ia usando uma camiseta velha "estou Lula porque sou Freire."

13.9.05

Xepa














A solução para o problema logístico brasileiro: Cruzador Espacial Yamato e Galaxy Express 999


Semana passada, fiz um belo* post sobre a necessidade do Brasil enfrentar o seu quinhão de responsabilidade, e ir além, quanto ao aquecimento global. As medidas de redução de emissão de gases do efeito estufa proposta teriam, ainda, na maioria dos casos, consequências ambientais locais mais imediatas, e às vezes de grande peso, como é o caso de um reordenamento do transporte público que diminuísse o uso de óleo diesel, e portanto a emissão de fuligem, responsável na Europa pela maior parte das mortes devidas à poluição.

Onde a porca torce o rabo é que todas essas medidas teriam custos, financeiros e outros, e à guisa de expiação pela recomendação fácil aos que não ouvem, resolvi lembrar de alguns:

1) O menor custo, ou melhor, o mais pulverizado e incremental, portanto mais fácil de ser enfrentado no Brasil em que os juros têm dois ou três dígitos há décadas, é a substituição dos ônibus diesel-mecânicos que hoje infestam as cidades brasileiras por ônibus diesel-elétricos, também conhecidos como "híbridos." O nome híbrido vem da indústria automobilística, com seus carros 'híbridos" entre o elétrico e o a gasolina, mas o princípio é empregado há bastante mais tempo em locomotivas, sem nenhuma preocupação ambiental ou mesmo de conservação de combustível: é que há limites para a energia que pode ser transmitida mecanicamente, através de uma caixa de câmbio, do motor aos eixos. Enfiar um gerador a diesel em cima da locomotiva, alimentando um motor elétrico, foi chamado de "transmissão elétrica," e o único limite de potência teórico é o da potência máxima de um motor elétrico - no momento, 750MW, a potência das turbinas de Itaipú e Três Gargantas, e umas cem vezes mais do que os trens mais potentes. Na prática, o tamanho e peso são limitantes, tanto do tamanho dos motores quanto dos geradores - os trens mais potentes comem energia de uma linha externa, porque o diesel necessário para alimentar um trem desses drenaria vários vagões rapidamente.

O Brasil tem tecnologia para fabricar e exportar ônibus diesel-elétricos. Com um financiamento do BNDES (a maior fonte de recursos à disposição do poder público brasileiro), a produção em grande escala seria até simples. Existe mais de 50.000 ônibus urbanos no país; um programa que substituísse 5% deles a cada ano implicaria em (100.000US$/bus x 2.500 bus) 250 milhões de dólares por ano de financiamento. O maior obstáculo não é o preço, mas o mesmo que prejudicaria outra medida no mesmo sentido e de custo zero, a reordenação das linhas de ônibus nas regiões metropolitanas. A saber, que o transporte público, formal e informal, costuma ser gerido por máfias. Máfia no sentido cabeça-de-cavalo-na-cama mesmo. E pra eles, o ônibus diesel-elétrico, que dura uns 20 anos, não tem tanta graça quanto receber subsídios pra comprar novos ônibus a cada quatro anos. Além disso, o transporte público, no Brasil, sofre uma concorrência pesada do transporte informal; para que o ônibus diesel-elétrico fizesse efeito, ele teria que ter custo baixo o bastante para concorrer com as vans e quetais, o que significa subsídios estatais ao transporte público. Coisa de um ou dois bilhões de reais, dependendo do preço em que as vans não pudessem mais competir.

2) A alteração da matriz de transporte de carga brasileira é talvez a mais cara de todas as coisas mencionadas. Isso porque qualquer solução que baixe o consumo de energia baixa o custo do transporte, aumentando a demanda. A não ser que você estivesse falando de uma eletrificação generalizada nas ferrovias - e aí você não tá mais falando do Brasil, tá falando da rica nação de Pindorama pós-fusão nuclear - a eficiência pode dar peso político, mas não vai diminuir muito e pode até aumentar a emissão de gases estufa. Custo: estratosférico, mesmo assumindo que funcione. Até a França e os EUA reclamam das condições das próprias ferrovias. Por baixo, recuperando e melhorando a malha ferroviária existente, reorganizando o acesso ferroviário a Santos, e construindo as duas ferrovias já planejadas, 25 bilhões de dólares, que só parcialmente poderiam ser bancados pelo BNDES.

2.a)Como mencionou o Guilherme num comentário ao primeiro post, parte disso pode também ser contrabalançado pela produção de biodiesel, a partir de oleaginosas ou de aproveitamento do lixo. O problema do biodiesel é que, se ele não representa a desgraceira social e ambiental do proálcool, é inclusive porque a densidade de produção das oleaginosas não é a mesma da cana de açúcar. O óleo de lixo ainda está em fase experimental, e alguns dos óleos cogitados para biodiesel, como o de mamona, custam muito mais do que o óleo diesel, tornando dúbia a vantagem para os produtores de usá-lo para fazer o mesmo. Um investimento em biotecnologia poderia render bastante aí, tanto em culturas perenes (palmeiras) quanto em algas (que poderiam render até cinco vezes mais óleo que qualquer cultura terrestre). Custo : impossível de prever sem estudo detalhado, e olhe lá. Digamos, 500 milhões por ano em tecnologia. Para a implantação, 100 milhões pagam cultivo e fábrica para 25 milhões de litros; o Brasil consome 36bn de litros por ano. R$144bn, e uma área só um pouco maior do que a do Pará cultivada com mamona ou soja, um pouco maior do que o Maranhão com dendê ou babaçu. Ah é - o biodiesel é menos poluente localmente do que o diesel fóssil, por não estar misturado aos poluentes como enxofre, e isso tem efeito multiplicador com o uso de ônibus diesel-elétricos.

3) A implantação de "energias alternativas," no Brasil, inclui algo nem um pouco alternativo, que é a hidrelétrica de pequeno porte, ainda por cima definida em MW, que eu acho que é a forma mais antiga de geração de energia elétrica. Independente disso, uma usina hidrelétrica grande só é ruim em si quando detona alguma área importante histórica ou natural inteira, como a represa de Assuã, no Egito, Três Gargantas na China ou Yaciretá na Argentina. Deixando isso de lado, o que conta é a área inundada agregada contra a geração total de energia elétrica. Como eu já mencionei ao defender as usinas "hidrocinéticas," a poluição londrina diminuiu, acabando com os famosos pea-soup fogs, justamente quando os milhões de braseiros e lareiras foram substituídos por três centrais de grande porte. As PCHs, portanto, não são uma boa idéia "ambiental," apesar de o serem em termos de efeito estufa, principalmente porque, sendo sua implantação ainda praticável no Sul-Maravilha, são mais baratas por Kwh chegando ao consumidor do que uma usina na Amazônia, ou mesmo no Rio Grande do Sul. Não servem para o nordeste, porque quase toda a energia hidrelétrica aproveitável, de qualquer tamanho, já foi aproveitada. Custo: apagar áreas remanescentes de mata atlântica, fora isso praticamente zero, já que há interesse privado. Meia dúzia de garantias de compra. O custo por MWh ficaria em, a princípio, 50US$, bem mais do que o custo médio das usinas hidrelétricas existentes, que usaram excelentes lugares (fora aberrações como Balbina e Sobradinho, os maiores lagos do país para a 25ª e a 11ª maiores usinas em geração de energia), mas ainda razoável, no limite mínimo do custo de usinas a gás.

As outras energias alternativas têm mais potencial. A política de hidrelétricas da fase industrializante brasileira fez da filial brasileira da Voith-Siemens a instalação de produção de turbinas hidrelétricas mais importante do mundo; se o Brasil não tem tanto vento quanto água (e isso muda se a política for do Mercosul inteiro), ainda assim dá pra gerar bastante energia elétrica, se isso for uma prioridade, no Vale do São Francisco e no litoral nordeste, mais alguns pontos espalhados menores, mas próximos de grandes consumidores. E, com a mudança mundial no sentido do vento, virar central de referência nesse campo não é pouca coisa. O custo em linhas de transmissão, pela localização, seria negativo, já que as centrais eólicas ficam no caminho onde já estão previstas linhas de transmissão para ligar NE e SE e NE e N, e uma produção no meio do caminho baratearia a coisa. Custo: 60US$ por MWh, o que se justifica em termos puramente econômicos, com o preço atual dos hidrocarbonetos. Se preferir, pra acrescentar o equivalente de uma usina térmica como a que está sendo implantada no Rio, de 800MW, seriam 2bn de dólares. Para a geração a partir de resíduos de biomassa, ou de gases do lixo, o custo é mais ou menos equivalente, mas tem que subtrair o custo atual de se livrar desses resíduos. Em todos os casos, as geradoras de energia vêem a coisa com uma certa desconfiança, inclusive porque os maiores clientes, no Brasil, são as indústrias, principalmente as grandes indústrias, e não, como em outros países, o consumo pulverizado, residencial. É isso, por exemplo, que torna atraente a construção de grandes hidrelétricas na Amazônia, pra alimentar fundições de alumínio e papeleiras.

Geração solar é bem mais cara, mas vem avançando significativamente nos últimos anos. Uma política de incentivo seria melhor do que qualquer investimento direto (fora pesquisa), inclusive porque a geração distribuída , em que cada consumidor é até certo ponto gerador, alivia a rede como um todo. As distribuidoras de energia, que não chegam a ser uma Febraban mas têm uma certa capacidade de, ahem, fazer amigos e influenciar pessoas, têm uma relação ambivalente para com a geração distribuída, já que por um lado é menos gente comprando o que eles têm pra vender, por outro lado aliviam a rede por cuja manutenção eles são responsáveis. Dentro das cidades, existe áreas imensas que poderiam ser aproveitadas para a geração de energia solar: "chapéus" em postes públicos, tetos de supermercados e shoppings, até a faixa de domínio de vias expressas (imagine a avenida Brasil ou a Linha Vermelha com telhado).

3.a) Usinas nucleares vão pra outro post (que este já tá chato o bastante sem entrar em "reatores de seixos"), mas o custo é mais ou menos equivalente ao das eólicas, se você esquecer de um detalhe chato: o que fazer com o lixo radioativo. Tem a vantagem de se concentrar em grandes usinas, e de ter muita gente pressionando a favor por conta da "estratégia" - leia-se inveja do pênis, e da possibilidade de utilizar a tecnologia e infraestrutura em aplicações militares. Não necessariamente uma bomba - a marinha brasileira ainda sonha em fazer um submarino nuclear.

4) Tecnologias de controle da emissão de poluentes na agroindústria. A pesquisa ainda é bastante básica - pra chegar a resultados concretos e implementar vai uma bela grana. Digamos, dobrar o orçamento da Embrapa.



A conclusão de todo esse lero-lero? As medidas de que eu falei são, com exceção dos ônibus diesel-elétricos e moinhos de vento, pouco divisíveis para qualquer efeito concreto, e todas caras. E afetariam uma fração de 25% da emissão de gases do efeito estufa no Brasil de 2003, ao passo que os 75% (mudanças no uso da terra e queimadas) têm um custo político que ninguém tem o direito de subestimar, num país em que até o Partido Verde é presidido por um latifundiário. O copo tá meio vazio.

*"Belo" se refere à facilidade de opinar de cadeira, ser "armchair quarterback," técnico de sofá, como dizem os gringos, não à qualidade.

A internet tá lenta aqui, e eu não lembro dos links de cabeça. Ponho hoje mais tarde.

"Integração entre o trem e a moradia," versão carioca

http://oglobo.globo.com/jornal/Bairros/ZonaNorte/169739796.asp


Os apitos da locomotiva da MRS Logística soam como tiros de largada. No viaduto que passa sobre a Linha Vermelha, crianças que empinam pipas correm para as pequenas plataformas de recuo para ficar a salvo do trem. Este, por sua vez, diminui a velocidade para algo em torno de 25 quilômetros por hora. O ritmo lento é necessário para que, nos próximos três quilômetros, não haja incidentes.

O trem passa tão rente aos casebres que o fiscal de linha Ailton de Andrade, há 27 anos na MRS, cumprimenta quem está dentro de casa. Ele diz que, muitas vezes, seus técnicos têm de entrar nos barracos para fazer a manutenção dos dormentes — muitos afetados pelas construções.

Ao ouvir um tiro, disparado a poucos metros como advertência por causa da máquina do repórter fotográfico, Ailton revela também que a proximidade com os traficantes é bem maior do que gostariam os maquinistas:

— Neste pequeno trecho por onde passamos, eles são presença constante. Em geral, a convivência é pacífica mas a maioria dos colegas trabalha com medo.


Os barracos sobre a linha férrea se tornaram um emblema dos transtornos trazidos para a região pelo avanço da favelização e são um problema duplo que o Ministério das Cidades pretende solucionar com a assinatura do convênio com a prefeitura.

Por um lado, idosos, adultos e crianças que convivem com os trens de carga estão sob permanente risco de morte. Um incidente ocorrido há um ano é um exemplo: um rolo de aço que não estava centralizado no vagão caiu e destruiu vários barracos durante a passagem da composição. Perigos como este foram objeto de um relatório elaborado em abril pela Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara de Deputados.

Por outro lado, a produtividade dos terminais portuários, segundo a MRS, é afetada pela proximidade das favelas. As conseqüências são o risco de saques e acidentes.

Quiz

Você tem R$2.900.000.000,00 na mão. Você prefere gastar:


A) Que nem o Palofinho, reduzindo em 2,5% a alíquota de imposto de renda incidente sobre os rendimentos dos 5% mais ricos entre os brasileiros.

B), Que nem a Dilminha, cortando impostos sobre investimentos em energia.

C) Que nem o Furlanzinho, reduzindo impostos sobre itens da cesta básica e da construção civil.


E o divertido é que o Palófi era trotskista, e o Furlan é empresário.

10.9.05

Achando bonito não ter o que comer

Inspirado pelo post do André no Contra o Consenso, aí do lado, resolvi pôr essa imitação barata aqui. Imitação barata porque o sentimento é parecido - apesar de eu não achar que ele seja contraditório. Nacionalismo não é simplesmente o amor pela sua terra, ele é o amor pela sua Nação. Atente para a letra maiúscula, que ela é importante. Gostar da sua terra não implica em pensar que existe alguma clivagem absoluta entre ela e outras terras, que é a grande invenção do nacionalismo. Há muito pouca gente que pense em termos nacionalistas sobre sua cidade, por exemplo. Garotinho e afins reclamam de não haver fluminenses no ministério, mas ninguém pensa que é um horror sermos governados por um paulista.

Bem, na verdade a grande invenção do nacionalismo é criar a comunidade imaginária maior. Antes dele, acharíamos paulistas estrangeiros, sim. Então, se por um lado eu detesto o nacionalismo por que ele implica na noção de estrangeiro, que eu acho horrível, por outro lado tenho que reconhecer que ele não criou a noção, apenas deslocou suas fronteiras. E justiça seja feita, por mais exacerbado que seja, o nacionalismo brasileiro é dos menos ofensivos. Raramente é identificado com a virilidade militar, com a defesa do governo, ou com uma xenofobia que vá além da paranóia anti-ianque. Se é para ser nacionalista, melhor ter orgulho de Kaká, Robinho e dos dois Ronaldinhos do que do porta-aviões ou de uma pretensa superioridade moral. E é um nacionalismo surpreendentemente inclusivo, mesmo comparado com países, como os anglo-saxões, com muito mais imigrantes; se por um lado o pobre-coitado morto na cela da PF virou "o chinês," por outro lado o índice de segregação espacial brasileiro, até pra chineses, é o mais baixo que se pode encontrar, e o de exogamia o mais alto. (Deixa pra depois a discussão sobre o quanto isso revela uma lógica de preconceito diferente, mais do que a sua ausência.)

Então aqui vai um feliz aniversário atrasado ao país Más Grande del Mundo. Que daqui a vinte anos ele faça jus ao título autoconcedido, com linha de Maglev, educação secundária universal e um Gini-renda abaixo de 45, que Jun Sakamoto seja mais conhecido do que YSL e a Rua do Ouvidor mais tchuns que a Park Avenue, o Rio Grande do Norte tenha mais turistas e moinhos de vento do que a Catalunya e Manaus mais pesquisadores e instalações portuárias do que Chicago.

Dissonância Cognitiva II

Sou eu o único a achar que, para uma câmara que teve de presidentes nos últimos anos próceres como Inocêncio de Oliveira e Udal Hussein Magalhães, a demonização do Severino só se justifica pela origem humirde, não pela vileza?


*****

Ainda na dissonância cognitiva, sou eu o único a achar que uma pesquisa que deponha a favor da minha posição pode ser uma porcaria falaciosa? A pesquisa da UNESCO que atribui às campanhas contra o desarmamento a queda dos números oficiais de mortes por arma de fogo no Brasil é de um rigor científico digno da Veja, mesmo sem a barriga do Globo pondo os números errados no infográfico. Correlação =/= causa parece ser algo que nunca ensinaram pr'esse povo. Ou melhor, eles até mencionam isso no prólogo, enchem a boca para falar de métodos de análise, mas em momento algum procuram qualquer explicação alternativa. E o número de homicídios nas duas maiores categorias depois de armas de fogo, facas e "outros," também caiu.

Fora que toda a teoria das "mortes em excesso," que leva à possibilidade de se falar em "vidas poupadas" é uma visão extrema da transformação de pessoas em populações, e que pode ser usada para todo tipo de retórica. Quer um exemplo? Usando uma metodologia semelhante à da campanha do desarmamento, o Pentágono e a Casa Branca alegam que a guerra no Iraque está salvando vidas.

Sou 100% a favor da campanha do desarmamento. Uma pistola só tem um fim, que é matar gente, e por mim é algo que não devia existir. O argumento de que o desarmamento dos "homens de bem" leva a menos mortes por motivos estúpidos faz sentido, porque ao contrário do imaginário midiático boa parte das mortes não vem de criminosos organizados em grandes cidades. Fora que a divisão entre "homens de bem" e "marginais" é de um preconceito ridículo, e só se é criminoso depois de cometer o crime. Por isso tudo é que eu acho que não seria necessário enfeitar a verdade pra se fazer campanha contra o desarmamento. Deixem os Ronald Levinsohns, Mainardis e Bolsonaros com a mentira, que é o métier deles.

8.9.05

A província mais solar do Império


O uso irônico da frase é ™ e ® Smart Shade of Blue, na lista de links ao lado.

Capitalismo x AIDS


Falando nisso, parece que o Panfleto Negro do Capitalismo e o Panfleto Negro do Comunismo ganharam um irmão, o Panfleto Negro do Colonialismo. Parece até interessante, apesar dos mesmos vícios dos irmãos, e da ironia inerente ao título...

¿Donde está Severino?

Fuçando por resenhas sobre "Um Dia Sem Mexicanos," descobri duas coisas. Uma, que o filme que me fez rolar de rir foi considerado, em geral, monótono. Como resenhista é tudo hype, "o original," o curta, é genial, o longa que passa no cinemão é desprezível....até aí, gosto não se discute (e eu adorei "Os Vingadores"), mas a outra coisa que me impressionou é que os resenhistas, presumivelmente pertencentes à classe média brasileira, se identificaram com os latinos do filme, não com os gringos ridículos.

Ora, eu pelo menos saí do cinema imaginando foi "um dia sem baianos." O Alckmin até tem certa semelhança com o senador que é empossado no filme do Arau...

6.9.05

O Efeito Estufa de Tupã

A discussão sobre o efeito estufa foi reaquecida pelo furacão Katrina, e a ligação óbvia entre um sistema global mais energético (é isso que "aquecimento" quer dizer) e mais furacões. Que o aquecimento global ocorre já é, segundo o último simpósio de climatologia, inegável. Que ele seja antropogênico já parece uma boa aposta. Que nós possamos manter as bases econômicas da economia global, ainda mais com os países pobres se aproximando dos padrões de consumo dos ricos, parece dúbio, mesmo se é verdade que a intensidade de carbono, em massa de CO2 emitida por dólar de PNB, do Japão é várias vezes menor que a dos EUA.

Fim do resumo. E o Brasil na dança? O Brasil tem uma certa semelhança com Janus, porque se apresenta ao mesmo tempo como desenvolvido ('me respeitem') e subdesenvolvido ('coitadinho de mim'). Se largasse as duas posições, e assumisse responsabilidades globais, o que inclui o efeito estufa, ia ter mais sucesso nos dois fins almejados, o respeito e a ajuda externa. O Ministério de Ciência e Tecnologia finalmente produziu um relatório da contribuição brasileira ao efeito estufa, e nela até que o país sai bem na fita, tornando inexplicável a posição pró-poluição do país. Ou melhor, como vamos ver depois, explicável, só injustificável. Pontos principais:

1) A matriz energética brasileira é relativamente pouco estufada. Todo mundo sabe que a geração elétrica é principalmente de energia hidrelétrica, mas a eletricidade é uma contribuição relativamente restrita à matriz energética. Mesmo assim, na soma dos fatores, o Brasil se mexe com relativamente pouco dinossauro morto.

2) A maior contribuição industrial ao efeito estufa brasileira não é a indústria de transformação, mas a agropecuária. Arroto de vaquinha, CH4, que é muito pior do que CO2 em retenção de calor por quantidade, 80% do metano vem dos buchos de vacas no Brasil, e queimadas. Fora a transformação de ambientes naturais em antrópicos, eliminando os ralos de carbono, que responde por 70% da contribuição brasileira ao aquecimento.


Na comparação, mesmo contando o arroto das vaquinhas, o Brasil não é muito energívoro, e menos ainda carbonífero, apesar da concentração no país de indústria pesada para exportação (os efeitos ambientais locais dessa indústria - siderúrgicas, fundições de alumínio, papeleiras, mineradoras e petroquímicas - são horrendos). Mas uma situação atual confortável fica bem menos agradável quando se olha para o futuro, o que explica a tomada de posição brasileira. Vamulá:

1) A tal da exportação de indústria pesada foi identificada tanto por multinacionais quanto pelo BNDES como um caminho a seguir. Foi ela que fez da Bélgica o último colocado entre os países europeus no índice de sustentabilidade ambiental. Com instituições populares mais fracas que as belgas, a referência brasileira seria mais algo como a Alemanha Oriental ou os Urais.

2) Outra "fórmula" do crescimento econômico, ainda mais com a possível liberalização do regime de subsídios agrícolas dos países ricos, é o tal do arroto da vaquinha.

3) O modelo elétrico brasileiro, baseado em grandes hidrelétricas financiadas pelo estado, gorou. Parte por conta do projeto neoliberal do PSDBFL, parte por necessidade técnica, já que os grandes aproveitamentos hidrelétricos, fora a resistência ambiental, se esgotaram na região densamente povoada. A distância entre geração e consumo atual já faz do Brasil um dos países com as maiores perdas de transmissão do mundo; se pusessem uma hidrelétrica no Xingu pra alimentar São Paulo, metade da eletricidade ia ser gasta pelo caminho, aquecendo o próprio cabo. Como a Eletrobrás foi quem se deu mal nisso, o caminho seguido - em bases ruinosas "emergenciais," agora em curso de correção - foi através da Petrobras, que por ser uma empresa de petróleo financia usinas a gás ou óleo combustível, não outras fontes. Também ajuda nessa decisão o fato de que o custo de investimento de térmicas convencionais (ie fósseis) é uma parte relativamente pequena do custo total, e o juro brasileiro é, há décadas, o que se sabe.

4) As soluções de transporte, tanto de cargas quanto de passageiros, são de um consumo de energia muito superior à média. Isso pode ser visto atentando-se para a conta-transporte da energia brasileira, que contrasta com a baixa mobilidade do brasileiro. Isso não é só resultado, como você vai pensar se ler um dos 1,224,545 artigos de jornal reclamando do "apagão logístico," um resultado da incúria e imprevidência de nossos governantes, apesar de eu achar que, como o Bush, o FH sempre mereça levar porrada. As ferrovias brasileiras, que não formam uma rede decente, são consequência do modelo de desenvolvimento econômico do país, e de toda a américa latina, baseado na exportação primária sem necessidade de processamento, e portanto com apenas dois pontos: o de produção e o porto. Os únicos lugares da AL em que redes ferroviárias decentes se formaram foram a província de BsAs e o Estado de São Paulo, em ambos os casos devido à alta densidade de cidadezinhas agrícolas e vias férreas até o porto. E mesmo a ferrovia até o porto, no Brasil, tem um probleminha no caminho. Um probleminha de um quilômetro de altura chamado Serra do Mar. O mesmo problema, do outro lado, faz com que, apesar de termos um rio do tamanho do Mississípi e outro dez vezes maior (literalmente), não tenhamos uma malha hidroviária como a dos EUA: os rios que descem o planalto precisam ser adaptados pra virar hidrovia, ao contrário de um rio de planície. Há malha hidroviária na Amazônia, onde não há gente. (Tanto num caso quanto no outro, em termos históricos - a Amazônia está cada vez mais povoada, e até Itaipú o Paraná e afluentes foram hidroviados.)

5.a) Quanto ao transporte de passageiros, claro, há o horror rodoviarista do JK, mas há também a questão do transporte público ser de ônibus. Ônibus, é sempre bom lembrar, além do escapamento de CO2 que leva ao efeito estufa, emitem uma quantidade brutal de poluentes de efeito local muito pior. O ar das grandes cidades brasileiras é uma merda. De novo, isso não é só culpa dos JKs, Lacerdas e Prestes Maias: o transporte ferroviário urbano demanda grandes investimentos, o que é difícil com os juros altos, e ainda mais quando o trem/metrô tem que competir por recursos escassos com a rodovia que atende à classe alta e às transportadoras (sendo dedicado, não interessa às transportadoras de carga).

6) O Brasil voltou a ter crescimento econômico. A não ser que elejam de volta o PSDBFL, isso quer dizer revisar pra cima o consumo de energia. O consumo brasileiro ainda é basicamente industrial e ainda em boa parte rural e primitivo; com um aumento da renda, isso pode se transformar bastante rapidamente, causando saltos de demanda de energia elétrica e de transporte. Se aceitarmos que a matriz de transporte brasileira vai continuar porca e a de energia elétrica ficar menos limpa, o efeito multiplicador vai ser bastante desagradável.


Conclusão: o Brasil pretende contribuir, e muito, para o efeito estufa, sob a alegação (inteiramente correta) de que os outros fazem pior, e o farão ainda por um bom tempo, em termos absolutos e relativos. Isso é, com o perdão da opinião fácil, incrivelmente estúpido. O Brasil tem mais a perder com o aquecimento global do que qualquer dos países que vê como "concorrentes." Para o Canadá e os EUA, o aquecimento pode representar aumento da produtividade agrícola, para o Brasil representa perda de chuva e desertificação, possivelmente acarretando até a perda de energia. Ciclones de nível 1 ou 2 já estão atingindo a costa subtropical brasileira (como será o nome deles? Furacão nem tufão...ventão?), e se um furacão de verdade se abater numa cidade imprensada contra a Serra do Mar, as consequências não vão ser agradáveis. Boa parte da população brasileira vive quase ao nível do mar, e na costa norte uma elevação desse nível pode chegar, durante a maré alta, a mais de cem metros pra dentro da atual linha costeira, pra aumentos de temperatura globais dentro das previsões.

Apesar da crescente preocupação com o meio ambiente no Brasil ser muitas vezes travestida de preocupação sensata, essa sensatez é geralmente apresentada em termos de "ser bonzinho é recompensado," e como se "o meio ambiente," como "o social," fosse um todo virtuoso. Se os Getúlios de fancaria prestassem atenção no que fazem, perceberiam que o efeito estufa, como outro risco ambiental ignorado, a destruição do Pantanal por hidrovias e gado, representam a maior ameaça ao País (essa gente sempre escreve país com letra maiúscula), e não "preocupação de ecologista," de Gabeira querendo preservar a vista da janela. Entre outras coisas, vão deixar sem uso todas essas hidrelétricas enormes, quando o Cerrado e o Pantanal secarem. Faria sentido, portanto, o Brasil investir tudo na contenção de efeito estufa, por menor que seja a contribuição brasileira ao total global, inclusive pra poder fazer lobby com outros países nesse sentido. Abandonar os projetos de gás natural pra eletricidade (quanto mais carvão) em prol de outras fontes, por exemplo. Ou usinas nucleares, que não são "ecológicas" no sentido de virtuosas, mas têm contribuição zero pro aquecimento global. Ou eólicas e solares - principalmente para substituir linhas de transmissão enormes até localidades isoladas. Eletrificação de linhas de trem hoje percorridas por diesel-elétricas. Substituição de ônibus diesel por diesel-elétricos, e construção de metrôs. Prevenção de queimadas. Investir em tecnologia anti-efeito estufa, de biocombustíveis a geração solar a inibidores de pum. Isso tudo não é uma questão só de preservar gente (com quem eles não se importam), mas o País.

5.9.05

As voltas que a vida dá

A eleição de Severino Cavalcanti para a presidência da Câmara foi saudada pela grande imprensa como uma derrota merecida do governo, que tinha tido a ousadia de apoiar Greenhalgh para o cargo. (Alguém com currículo, num cargo mais acostumado a prontuários.) Hoje, a reportagem de segunda mão estrangeira aponta que "top Lula ally investigated," e a esquerda do posto nove vira ídolo da direita da casa grande para defenestrar o homem que eles mesmos puseram lá.

Diga-se de passagem, não consigo imaginar o Gabeira falando grosso daquele jeito com um presidente da câmara que não tivesse cara de porteiro. Corrupto, escroto, ignorante e animalesco o Severino é, mas nisso não é exceção na Casa que já foi chefiada pelo filho de Toninho Malvadeza e pelo dono de escravos assumido Inocêncio Oliveira, pra ficar só no passado mais que recente.

Mariana

O Brasil realmente devia pôr estátuas nas ruas da República, que nem a França faz. Só que as nossas, ao invés do busto, deveriam ter a bunda. Já fica aqui meu voto pra Tiazinha de primeira Mariana.

Por que a observação? Por causa disso.

A feira de moda praia e lingerie Lyon, Mode City, que termina hoje em Lyon (França), mostrou que o Brasil tem procurado adequar-se às exigências do mercado europeu, da mesma forma que as grifes européias têm utilizado o país como inspiração para seus produtos de verão.

Na feira de Lyon o Brasil não está presente apenas nas marcas nacionais. Empresas baseadas na França valem-se da tradição, e às vezes do know how brasileiro, para conquistar o cliente europeu.

2.9.05

Katrina Aquecimentova

Katrina chegou, e muita gente aproveitou pra apontar o dedo pro Joãozinho Talibã. Tudo bem, a princípio qualquer coisa que se fale mal do Bush está certa, mas... o aquecimento globla aumenta a frequência e intensidade dos furacões, mas não é diretamente responsável pelo Katrina, que foi azar. Podia ter ido parar em qualquer outro lugar, podia não ter sido durante a maré alta...tudo bem, o aquecimento da água do Golfo do México aumenta as chances de vir outro, mas isso não é uma relação direta com este em particular. E o protocolo de Kyoto, ainda que tivesse sido implementado por todo mundo, não teria feito nenhum efeito ainda, teve muito pouco tempo - fora que ele é extremamente tímido, há quem diga que não teria efeito nem num prazo secular.

Apesar disso, é claro que "a culpa" é do Bush de várias maneiras. Listando:

1) A Guarda Nacional está no Iraque. Em número de soldados, a resposta ao Katrina está em um terço da resposta ao furacão Andrew, e a defasagem é maior em número de soldados treinados em enfermagem ou policiamento, ou de helicópteros, hospitais de campanha e e destacamentos de engenharia.
2) O programa de contenção de enchentes do Army Corps of Engineers teve verbas cortadas em 2001, e foi paralisado em 2003, com as verbas desviadas para a Homeland Security.
3) A FEMA, a defesa civil federal, foi sucateada desde o começo do governo Bush, perdendo sua capacidade de lidar com desastres.
4) A costa do Golfo do México, em seu estado natural, tem várias barreiras anti-furacão. A lama do Mississípi, que criou o pé-de-galo em que está situada Nova Orleáns, é abundante (o rio carrega mais lama do que o Amazonas, apesar de ser dez vezes menor), e ajuda a absorver a força dos furacões a quilômetros da costa; manguezais fazem o mesmo serviço; os canais auxiliares do delta se mudam, ajudando a escoar a água. Etc etc etc. É claro que a degradação da costa sul dos EUA antecede o Bush, mas ele conseguiu cortar muito da prevenção e recuperação que existia. No embalo, o programa de despoluição do Mississípi foi posto on hold, o que piora a situação de quem fica no meio das águas agora.
5) O "bolsa-família" americano foi cortado, começando com o Clinton, resultando em menos capacidade das próprias pessoas pobres de lidar com o furacão. Não custa lembrar que quase metade da população de N'awlins, e quase um terço da população dos três estados afetados, vive abaixo da linha da pobreza.
6) Tá que houvesse menos recursos, mas mesmo esses não foram mobilizados. O exército só foi mencionado ontem, a guarda nacional foi sendo mandada aos pouquinhos, até ontem a maior distribuição de água mineral era de um empresário que resolveu mandar o estoque dele, com a ajuda de voluntários. O Bush se orgulha de nunca dormir depois das oito, mas isso é exagero.
7) A antipatia pelo Bush não cortou a ajuda internacional aos EUA. Pelo contrário, as dificuldades fizeram com que o lucro político ficasse maior. Mas os canais de relacionamento pelos quais isso poderia ser organizado foram cortados, inclusive porque o Bush tem "trocado de mal" com o Departamento de Estado desde que este, ao contrário do Pentágono, se recusou a puxar o saco e concordar com Sua Majestade quanto ao Iraque.

Deve ter mais coisa. Em termos de catástrofe natural, o Bush tá quase no nível do Katrina.