Detalhes que não batem na reportagem
"Um inglês de 35 anos teve uma câmera, avaliada em R$ 2 mil, e R$ 5 mil em espécie roubados."
5 mil em espécie? Alguém perguntou pr'esse sujeito o que ele fazia com cinco mil reais no bolso, na praia? Ia comprar alguém?
"O comandante do 23 BPM (Leblon), coronel Jorge Braga, disse que a polícia tem feito sua parte. Ele cobrou mais ações do município e disse que as investigações policiais indicam que os menores que fizeram o arrastão são da Favela do Jacarezinho.
— Ninguém quer assumir essa responsabilidade de lidar com menores de rua e (isso) acaba nas mãos da PM"
Vem cá, se eles não são menores de rua, qual é a relação entre o reto e a vestimenta?
"Se acontece alguma coisa com esses menores durante a ação da PM, teremos que responder por isso — disse o comandante. "
Tradução - a PM não prende, mata e tortura.
"— Eu não conheço esse cinegrafista amador. Gostaria de conversar com ele e ver realmente as imagens em sua totalidade"
Eu, se fosse o tal cinegrafista, já estaria no Galeão, perguntando pra moça do guichê qual o vôo que sai primeiro.
Auferre, trucidare, rapere, falsis nominibus imperium; atque, ubi solitudinem faciunt, pacem appellant.
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30.9.04
Sharon Matheus
Depois das cenas de assalto na Praia do Leblon, tem gente por aí exigindo que a polícia seja mais "dura" e "vença a guerra."
Só pra lembrar, "guerra" não é modo de dizer.
Se polícia "dura" resolvesse o crime, o Rio era pra ser mais pacífico do que Oslo, ao invés de ter acabado de superar Bogotá e Johannesburgo em número de mortos. Pelo contrário, é exatamente a atitude de impunidade, que deixa a polícia cometer o crime de matar gente, que faz com que o crime de deixar pra lá o assalto não tenha importância. A função da polícia do Rio deixou de ser policiar a cidade, e passou a ser a "guerra" ao tráfico. Pra todos os efeitos práticos, o Rio hoje é uma cidade sem polícia, enquanto as favelas são um território ocupado por um exército invasor. O criminoso é visto como se fosse uma mancha a ser apagada, ao invés do crime ser visto como uma situação a ser administrada. Parece que esse povo nunca soube da distinção entre poder e força; ou que o crime baixa, não pela força imposta a ele, mas porque o criminoso é enredado num jogo, também chamado de lei. O criminoso que sabe que "assalto" dá 3 meses mas "lesão" dá 3 anos tem muito menos chance de cometer um crime do que aquele para quem "polícia" dá porrada, não importa o que ele tenha feito. Não é coincidência que nos EUA seja entre os bairros de pretos e imigrantes que a criminalidade fique parecida com a daqui.
Aliás, graças a Deus a guarda municipal não anda armada. Porque eles também, ao invés de manter a ordem pública, fazem as batalhas campais no centro da cidade. A atitude geral é a mesma - "fazer" alguma coisa é melhor do que manter a cidade sem que coisas ruins aconteçam. Boa administração, ao invés de ser vista como o governo tão bom que nem se repara nele, é confundida com "fazer" - obras, porradas, não importa. Tem que ser visível.
O impressionante é que funciona. Queria saber se esse povo ia gostar de ter um pai que fizesse obra em casa o tempo, sem saber pra que ou não mudando nada, e ia preferir uma mãe que batesse no filho o tempo todo a uma cujo filho não fizesse cagada.
Só pra lembrar, "guerra" não é modo de dizer.
Se polícia "dura" resolvesse o crime, o Rio era pra ser mais pacífico do que Oslo, ao invés de ter acabado de superar Bogotá e Johannesburgo em número de mortos. Pelo contrário, é exatamente a atitude de impunidade, que deixa a polícia cometer o crime de matar gente, que faz com que o crime de deixar pra lá o assalto não tenha importância. A função da polícia do Rio deixou de ser policiar a cidade, e passou a ser a "guerra" ao tráfico. Pra todos os efeitos práticos, o Rio hoje é uma cidade sem polícia, enquanto as favelas são um território ocupado por um exército invasor. O criminoso é visto como se fosse uma mancha a ser apagada, ao invés do crime ser visto como uma situação a ser administrada. Parece que esse povo nunca soube da distinção entre poder e força; ou que o crime baixa, não pela força imposta a ele, mas porque o criminoso é enredado num jogo, também chamado de lei. O criminoso que sabe que "assalto" dá 3 meses mas "lesão" dá 3 anos tem muito menos chance de cometer um crime do que aquele para quem "polícia" dá porrada, não importa o que ele tenha feito. Não é coincidência que nos EUA seja entre os bairros de pretos e imigrantes que a criminalidade fique parecida com a daqui.
Aliás, graças a Deus a guarda municipal não anda armada. Porque eles também, ao invés de manter a ordem pública, fazem as batalhas campais no centro da cidade. A atitude geral é a mesma - "fazer" alguma coisa é melhor do que manter a cidade sem que coisas ruins aconteçam. Boa administração, ao invés de ser vista como o governo tão bom que nem se repara nele, é confundida com "fazer" - obras, porradas, não importa. Tem que ser visível.
O impressionante é que funciona. Queria saber se esse povo ia gostar de ter um pai que fizesse obra em casa o tempo, sem saber pra que ou não mudando nada, e ia preferir uma mãe que batesse no filho o tempo todo a uma cujo filho não fizesse cagada.
Véspera de eleição
...E as manchetes dos jornais, que ontem na Internet penavam pra apresentar dados diversos da PNAD como univocamente ruins, já se decidiram.
"Era Lula começa com queda de renda e emprego."
"Era Lula começa com queda de renda e emprego."
Debates e valentões
Pode ser só paranóia minha, mas os estilos de debate do George Bush (fils) e do César Maia são muito parecidos. Ambos repetem seus slogans de campanha sem se preocupar em responder ao adversário - o estilo autista de debater.
A peça que Bush prega nos adversários é que ganhar dele o debate das idéias é fácil - difícil é fazer isso sem parecer um bully, um valentão que bateu na criança imbecil. César Maia faz o contrário, é ele o valentão. Falando com a Jandira Feghali, então, é de um machismo vergonhoso - só falta perguntar "tá num daqueles dias, muié?"
Será que a diferença pega mal pro Brasil? Assim, que o Brasileiro se identifica com o valentão e não com a vítima? Meio cedo pra fazer filosofia de buteco.
A peça que Bush prega nos adversários é que ganhar dele o debate das idéias é fácil - difícil é fazer isso sem parecer um bully, um valentão que bateu na criança imbecil. César Maia faz o contrário, é ele o valentão. Falando com a Jandira Feghali, então, é de um machismo vergonhoso - só falta perguntar "tá num daqueles dias, muié?"
Será que a diferença pega mal pro Brasil? Assim, que o Brasileiro se identifica com o valentão e não com a vítima? Meio cedo pra fazer filosofia de buteco.
29.9.04
Projetos para o "Bairro Novo," em São Paulo
No site Vitruvius
É até estranho pensar que tem um lote desse tamanho pra ser usado perto do centro de São Paulo, quando as matas da Billings e da Serra da Cantareira, bem mais longe, estão desaparecendo, debaixo de favelas e condomínios de rico.
Gostei mais do 1002, 1033 e 1041, mas tudo bem, o ganhador nem é tão feio. Podia ser mais alto. E a idéia do 1041 de um "parque aquático" é genial.
É até estranho pensar que tem um lote desse tamanho pra ser usado perto do centro de São Paulo, quando as matas da Billings e da Serra da Cantareira, bem mais longe, estão desaparecendo, debaixo de favelas e condomínios de rico.
Gostei mais do 1002, 1033 e 1041, mas tudo bem, o ganhador nem é tão feio. Podia ser mais alto. E a idéia do 1041 de um "parque aquático" é genial.
28.9.04
Por que Samba do Avião?
O nome não é homenagem ao próprio, nem a seu compositor (que Glenlivet o tenha), mas à vereadora e candidata à reeleição Leila do Flamengo.
Moradora de São Conrado, assim como seu mestre César Maia, Leila tem no Flamengo seu curral de votos, e reinvindica toda e qualquer obra como realização sua. A burrice brasileira de achar que obra na rua é uma coisa boa por si só - queria vr se alguém resolvesse fazer obra na casa deles sem saber pra quê, ou deixando tudo igual depois - faz com que ela seja sempre reeleita.
No começo deste ano, ela apresentou à Câmara de Vereadores uma lei importantíssima, estabelecendo que todo avião, ao pousar em qualquer dos aeroportos da cidade, deveria, durante a aproximação, tocar o Samba - obrigatoriamente e sem interrupções.
A beleza da lei - combinando fascismo, absurdo, ridículo e impossibilidade (o município não pode legislar sobre o espaço aéreo) - foi a inspiração para começar um blog chamado EU ODEIO CÉSAR MAIA! Como eu odeio outras coisas além dele*, ficou de nome "Samba do Avião." Pessoalmente, nada contra, mas ainda prefiro Madredeus-electrônico.
*se bem que no momento, com o barulho das obras de recapeamento eleitoral, ele é definitivamente o primeirão da lista.
Moradora de São Conrado, assim como seu mestre César Maia, Leila tem no Flamengo seu curral de votos, e reinvindica toda e qualquer obra como realização sua. A burrice brasileira de achar que obra na rua é uma coisa boa por si só - queria vr se alguém resolvesse fazer obra na casa deles sem saber pra quê, ou deixando tudo igual depois - faz com que ela seja sempre reeleita.
No começo deste ano, ela apresentou à Câmara de Vereadores uma lei importantíssima, estabelecendo que todo avião, ao pousar em qualquer dos aeroportos da cidade, deveria, durante a aproximação, tocar o Samba - obrigatoriamente e sem interrupções.
A beleza da lei - combinando fascismo, absurdo, ridículo e impossibilidade (o município não pode legislar sobre o espaço aéreo) - foi a inspiração para começar um blog chamado EU ODEIO CÉSAR MAIA! Como eu odeio outras coisas além dele*, ficou de nome "Samba do Avião." Pessoalmente, nada contra, mas ainda prefiro Madredeus-electrônico.
*se bem que no momento, com o barulho das obras de recapeamento eleitoral, ele é definitivamente o primeirão da lista.
27.9.04
O nosso Mar de Aral
No geral, continuo não me arrependendo de ter votado no Lula, ainda mais sendo o Serra a continuidade dos 8 anos que quebraram o Brasil. Mas às vezes é difícil, e não estou falando dos juros altos (os reais, a 9%, já estão quase civilizados), mas do desenvolvimentismo à Brasil Grande, da Dilma Roussef querendo detonar tudo pra fazer hidrelétrica, do Lessa sonhando com São Luiz e a Baía de Sepetiba pretos de fuligem, e disso :
http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=21815
A referência ao Mar de Aral é porque, na Ásia Central soviética se plantou muito algodão e milho irrigados... deu nisso:
http://www.unep.org/vitalwater/images/30-aral-sea-chronology.jpg
http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=21815
A referência ao Mar de Aral é porque, na Ásia Central soviética se plantou muito algodão e milho irrigados... deu nisso:
http://www.unep.org/vitalwater/images/30-aral-sea-chronology.jpg
23.9.04
Ore pelo Brasil
Terror total :
"— Eu nem gosto de comentar essas coisas, mas vocês deviam saber: este rapaz defende a legalização da maconha e o casamento de pessoas do mesmo sexo. E isso não é coisa que cristão apóie — disse Garotinho, no palco, pedindo aos evangélicos votos para o candidato do PMDB, Mário Marques.
— Falem na igreja, conversem, falem com o papai e com a mamãe. Isso é ruim para Nova Iguaçu — apelou Garotinho."
- http://oglobo.globo.com/jornal/pais/146001091.asp
http://www.orepelobrasil.com.br/
(Quem diria que um dia eu ia torcer pelo Linddibérgui.)
"— Eu nem gosto de comentar essas coisas, mas vocês deviam saber: este rapaz defende a legalização da maconha e o casamento de pessoas do mesmo sexo. E isso não é coisa que cristão apóie — disse Garotinho, no palco, pedindo aos evangélicos votos para o candidato do PMDB, Mário Marques.
— Falem na igreja, conversem, falem com o papai e com a mamãe. Isso é ruim para Nova Iguaçu — apelou Garotinho."
- http://oglobo.globo.com/jornal/pais/146001091.asp
http://www.orepelobrasil.com.br/
(Quem diria que um dia eu ia torcer pelo Linddibérgui.)
Pretensão extra extra extra
Haiku Nara
Deuses e budas
Caminhando devagar
Desdentados
Ashikaga Haiku
King of Japan
A rough ruffian calls at
the Yellow Throne
Haiku Sengoku
Mosquetões
Arcos quebrados, manchas
Uma mulher morta
Haiku Tokugawa
Quatro putas uma
Espada quatro brigas
Quatro cadeias
Meiji Haiku
Iron tracks
smoke, noise,
fleeing rabbits
Showa Haiku
Gojira meca
Spectreman manga
Tezuka Sony
Deuses e budas
Caminhando devagar
Desdentados
Ashikaga Haiku
King of Japan
A rough ruffian calls at
the Yellow Throne
Haiku Sengoku
Mosquetões
Arcos quebrados, manchas
Uma mulher morta
Haiku Tokugawa
Quatro putas uma
Espada quatro brigas
Quatro cadeias
Meiji Haiku
Iron tracks
smoke, noise,
fleeing rabbits
Showa Haiku
Gojira meca
Spectreman manga
Tezuka Sony
22.9.04
O Pai dos Pobres no Orfanato
Lendo um artigo sobre a proposta, feita por Marcus Garvey, de uma emigração de afro-americanos para o Brasil, tido à época como "paraíso racial," e as reações no lado de cá. Soa até familiar:
Um deputado pernambucano propôs a criação de uma lei que controlasse a entrada de negros no país. (Controlar quer dizer barrar mesmo.)
As reações na própria Câmara não foram lá muito receptivas :
"O projeto é um atentado aos direitos do homem e do cidadão...é um atentado à dignidade da raça negra...O Brasil , pelos seus representantes, só pode repelir esse infeliz projeto, que seria o indício de um Código Negro, de uma política de preconceitos de raça indigna de uma República." (Deputado gaúcho positivista)
"verdadeiramente horrorizado...não compreender como o Sr. Andrade Bezerra...havia esquecido, ao redigir seu projeto proibindo a entrada de negros no Brasil, não apenas os mais belos artigos de nossa constituição federal, mas principalmente sua fé cristã" (Deputado pernambucano católico)
etc etc etc
Já boa parte da imprensa da Capital era a favor - "não que fosse racista," claro. Com umas poucas exceções, de um racismo hilário de tão histérico, e algumas outras exceções contra o projeto.
No final das contas? O projeto gorou, mas o Governo encarregou-se de criar dificuldades à imigração vinda dos EUA, extra-oficialmente. Quem iria instaurar o racismo e a eugenia na forma da lei? Ele mesmo, o titio Getúlio, rolha do poço agora cavado lá na Glória.
Outra coisa interessante do artigo é a parte do discurso do deputado gaúcho em que ele menciona que a Constituição permitia o livre trânsito inclusive sem passaporte. Vê se hoje em dia atravessar fronteira sem passaporte ia ser permitido. Os fascistas perderam a batalha mas ganharam a guerra. :/
Ns.E. -
Marcus Garvey - Líder negro jamaicano-americano. Doidão - é como se ele fosse uma mistura fin-de-siècle de Malcom X com Afrika Bambaata. Racismos à parte, o artigo na Estudos Afro-Asiáticos deixa de lado o fato de que a intenção dele era mesmo criar um estado nacional negro, no Mato Grosso ou na África. O site da TVE americana sobre ele : http://www.pbs.org/wgbh/amex/garvey/
Código Negro - Code Noir - Código regendo as relações raciais no Império colonial francês, editado pela primeira vez por Luís XIV. O racionalismo e clareza envolvidos fizeram dele um ícone da dureza em se tratando de racismo no século XIX, em que a referência ao Haiti de Toussaint L'Ouverture ainda era mais importante no discurso contra o racismo do que a historiomitologia da luta contra o racismo nos EUA. As prescrições dele não eram, apesar disso significativamente piores do que o tratamento dado aos escravos em outros lugares. (Quer dizer, eram horríveis.)
http://www.tlfq.ulaval.ca/axl/amsudant/guyanefr1685.htm
http://www.historia.presse.fr/data/thematique/80/08003401.html
Um deputado pernambucano propôs a criação de uma lei que controlasse a entrada de negros no país. (Controlar quer dizer barrar mesmo.)
As reações na própria Câmara não foram lá muito receptivas :
"O projeto é um atentado aos direitos do homem e do cidadão...é um atentado à dignidade da raça negra...O Brasil , pelos seus representantes, só pode repelir esse infeliz projeto, que seria o indício de um Código Negro, de uma política de preconceitos de raça indigna de uma República." (Deputado gaúcho positivista)
"verdadeiramente horrorizado...não compreender como o Sr. Andrade Bezerra...havia esquecido, ao redigir seu projeto proibindo a entrada de negros no Brasil, não apenas os mais belos artigos de nossa constituição federal, mas principalmente sua fé cristã" (Deputado pernambucano católico)
etc etc etc
Já boa parte da imprensa da Capital era a favor - "não que fosse racista," claro. Com umas poucas exceções, de um racismo hilário de tão histérico, e algumas outras exceções contra o projeto.
No final das contas? O projeto gorou, mas o Governo encarregou-se de criar dificuldades à imigração vinda dos EUA, extra-oficialmente. Quem iria instaurar o racismo e a eugenia na forma da lei? Ele mesmo, o titio Getúlio, rolha do poço agora cavado lá na Glória.
Outra coisa interessante do artigo é a parte do discurso do deputado gaúcho em que ele menciona que a Constituição permitia o livre trânsito inclusive sem passaporte. Vê se hoje em dia atravessar fronteira sem passaporte ia ser permitido. Os fascistas perderam a batalha mas ganharam a guerra. :/
Ns.E. -
Marcus Garvey - Líder negro jamaicano-americano. Doidão - é como se ele fosse uma mistura fin-de-siècle de Malcom X com Afrika Bambaata. Racismos à parte, o artigo na Estudos Afro-Asiáticos deixa de lado o fato de que a intenção dele era mesmo criar um estado nacional negro, no Mato Grosso ou na África. O site da TVE americana sobre ele : http://www.pbs.org/wgbh/amex/garvey/
Código Negro - Code Noir - Código regendo as relações raciais no Império colonial francês, editado pela primeira vez por Luís XIV. O racionalismo e clareza envolvidos fizeram dele um ícone da dureza em se tratando de racismo no século XIX, em que a referência ao Haiti de Toussaint L'Ouverture ainda era mais importante no discurso contra o racismo do que a historiomitologia da luta contra o racismo nos EUA. As prescrições dele não eram, apesar disso significativamente piores do que o tratamento dado aos escravos em outros lugares. (Quer dizer, eram horríveis.)
http://www.tlfq.ulaval.ca/axl/amsudant/guyanefr1685.htm
http://www.historia.presse.fr/data/thematique/80/08003401.html
Plena campanha
O Globo e o JB publicaram reportagens genéricas elogiando o César Maia. Até aí tudo bem - só a velhinha de Taubaté, do Veríssimo, ainda acredita que a grande imprensa brasileira* não faz campanha pelos candidatos conservadores.
Duas observações nada originais
1 - O interessante é o esquerdismo de todos esses jornais conservadores. No Brasil, até o ACM é de esquerda - a dupla realidade da classe média brasileira, liberal até que isso possa significar fazer alguma coisa, não mudou nada nos últimos 100 anos.
2 - O Gallup americano já admitiu estar fazendo projeções falsas, dando a Bush votos a mais - a amostra deles usa 44% de republicanos e 32% de democratas, ao invés de números similares aos dos registros, 34/34. Corre a notícia de que os vários institutos de pesquisa daqui estariam fazendo o mesmo para César Maia- inflando não só este, mas também o Crivella.
Por via das dúvidas, a não ser que um milagre tenha acontecido e a Jandira tenha chance, vou votar no Peixe-Boi.
Eca.
*Só a grande não - lendo o nomínimo, você chora pela oportunidade que o Brasil perdeu, ao eleger o Sapo Barbudo ao invés do Paladino Da Justiça, Superserra o Bom.
Duas observações nada originais
1 - O interessante é o esquerdismo de todos esses jornais conservadores. No Brasil, até o ACM é de esquerda - a dupla realidade da classe média brasileira, liberal até que isso possa significar fazer alguma coisa, não mudou nada nos últimos 100 anos.
2 - O Gallup americano já admitiu estar fazendo projeções falsas, dando a Bush votos a mais - a amostra deles usa 44% de republicanos e 32% de democratas, ao invés de números similares aos dos registros, 34/34. Corre a notícia de que os vários institutos de pesquisa daqui estariam fazendo o mesmo para César Maia- inflando não só este, mas também o Crivella.
Por via das dúvidas, a não ser que um milagre tenha acontecido e a Jandira tenha chance, vou votar no Peixe-Boi.
Eca.
*Só a grande não - lendo o nomínimo, você chora pela oportunidade que o Brasil perdeu, ao eleger o Sapo Barbudo ao invés do Paladino Da Justiça, Superserra o Bom.
Arco do Desmatamento II
Dos pobres - o pedaço menos íngreme da encosta do Dona Marta, lado norte (Laranjeiras) já teve um monte de árvores cortadas. Estaria quase nuinha, se não fosse o capim, e mais de uma construção já pode ser vista na crista - o que, se a bola de cristal não tiver com defeito, significa que daqui a pouco o Morro Santa Marta vai ser do lado de cá também. E a Vila Alice já pode ser vista atrás do Instituto dos Surdos.
Dos ricos - ainda no morro Dona Marta, três casas no Cosme Velho já desmataram pra fazer seus "puxadinhos." E a Prefeitura conseguiu levar adiante o seu projeto de favelização de rico em Vargem Grande e no Recreio.
Dos tão ricos que nem são gente - o IBAMA liberou a hidrelétrica de Barra Grande, afogando um dos últimos bosques de araucária.
Dos ricos - ainda no morro Dona Marta, três casas no Cosme Velho já desmataram pra fazer seus "puxadinhos." E a Prefeitura conseguiu levar adiante o seu projeto de favelização de rico em Vargem Grande e no Recreio.
Dos tão ricos que nem são gente - o IBAMA liberou a hidrelétrica de Barra Grande, afogando um dos últimos bosques de araucária.
9.9.04
Rednecks
Quem : O dicionário explica "às vezes pejorativo; diz-se dos habitantes rurais do Sul dos EUA."
Fora isso? Os novos pretos. Como assim? Bom, pra começar, agora são eles que morrem nas linhas de frente - os negros, que tinham essa tarefa no Vietnã, foram pra burocracia militar.
Bom, mais uma explicação preliminar, agora sobre o Exército americano. A burocracia do Pentágono é uma das maiores do mundo - os únicos exércitos maiores que eles, o ELRPC e o indiano, são de recrutas, e tem "núcleos" muito menores. Pra efeito de comparação, o Pentágono tem 10 vezes mais empregados que a GM e um orçamento 4 vezes maior que o faturamento da GE. E isso não leva em conta os reservistas, guardas nacionais, mercenários, nem terceirizados - e a estimativa por baixo é de que estes façam um contingente de uns 300 mil. Como eles conseguem fazer tanta gente se alistar, se o salário não é tão grande assim (pagando a renda per capita americana a todos eles, na média, o baque já é maior que o PIB de muito país), e o adicional de periculosidade é póstumo? Graças à linda desigualdade social americana, quase tão legal quanto a daqui. E ao GI Bill e a treinamento profissional grátis, que fazem da carreira militar uma opção de avanço na vida pra quem não tem futuro. Então quem entra pra linha de frente, quase por definição, é o estrato mais fudido da sociedade americana. No momento, "poor rural whites" (e o Pentágono não cruza os dados, mas eles são do vale do Mississippi e do Sul), e imigrantes (de novo, o Pentágono não repara oficialmente, mas eles são quase todos das "colônias", chicanos, filipinos e caribenhos). E sim, você pode se alistar agora e virar cidadão depois. Nesse sentido, o exército americano é uma imensa legião estrangeira.
Bom, isso tudo foi só pra dizer o ponto de partida - o novo andar do porão da escada social americana deixou de ser os pretos pra ser os rednecks. Isso não é inteiramente verdade em alguns sentidos - por exemplo, especificamente do ponto de vista da repressão policial, driving while black continua sendo um crime terrível, e negros continuam tendo chances bastante boas de ir parar no xilindró em algum momento da vida. Mas nesse segundo ponto, que tem tanto a ver com envolvimento real em crime quanto com o preconceito policial, os pescoços vermelhos já chegam perto. E, mais uma vez, quando um grupo "étnico" inteiro se envolve com crimes frequentemente, seja crime organizado ou crime de pé-rapado, isso é um belo sinal de exclusão.
É interessante que, entre as características negativas que são atribuídas aos rooinecks*, está o próprio racismo. Isso é, o preconceito imputa ao seu alvo como defeito ser preconceituoso. As outras características negativas são as de sempre, a degeneração física (tornando em defeitos pessoais os efeitos da pobreza, como ser desdentado ou ter marcas de doença), a imbecilidade (com direito ao dialeto/sotaque ridículo e analfabeto), e aquelas ligadas ao sexo - menos o caráter lúbrico que se imputa ao negro, mas uma imagem constante de proles extensas e incestos.
Admita-se que a imagem negativa do redneck, em termos mais gerais, é relativamente antiga. Ela não foi tão fortemente negativa no passado, porém, e, mais importante, ela se referia "ao seu primo da roça." Hoje, a estereotipização é exclusiva, "racial" nesse sentido. Trata-se de um grupo alienígena, (essa palavra inglesa, alien, que denota algo tão mais distante que o estrangeiro), um outro que deve ser mantido à distância, não um parente. Note-se aí que é exatamente esse o modo particular do racismo americano, em contraposição ao racismo hierárquico brasileiro. Falta o reforço "científico" que se agarrou ao racismo, falta a diferenciação clara através da cor da pele, mas o processo mental é similar. E ele se transferiu para os rednecks na história muito recente.
Claro que o preconceito racial não desapareceu. Pelo contrário, continua firme e forte, inclusive fazendo vítimas fatais. Mas a forma que ele toma para a maior parte da população mudou, e muito. Em parte, claro, devido às grandes migrações internas do século XX, que fizeram com que mudasse o campo desse preconceito, já que assim uma enorme população negra saía do arco "caribenho," a imensa área entre o Potomac e o Tietê na qual a escravidão africana sustentou a agroexportação. (Casos semelhantes são a migração caribenha para o Reino Unido e a adaptação dos ex-escravos e seus descendentes imediatos a uma São Paulo industrializante descrita por Florestan Fernandes em "A Inserção do Negro na Sociedade de Classes").
A mudança na imagem que os americanos têm do seu próprio Sul espelham, de certa forma, a mudança na imagem que o "Ocidente" como um todo - isto é, os EUA, Europa Ocidental, e os velhos Dominions do Império Britânico- tem do Sul global. O preconceito associado ao elitismo foi trocado por um preconceito em que, numa operação que demonstra o perigo dos rótulos e bom mocismo fáceis, a identificação se dá com os menos favorecidos. Isto é, as "elites" dos países subdesenvolvidos passam de vanguardas que levarão seus países a ser mais como a Europa ao papel de "velhos Europeus," daqueles vilões colonizadores com os quais o Europeu já não se identifica, culpados pelas mazelas do terceiro mundo. O deslocamento temporal da referência que permite essa identificação ao mesmo tempo ambígua e unívoca não é único, acontece também quando o Islã, por exemplo, é apresentado como uma fonte de razão e sabedoria confrontada com a Europa bárbara, e o Islã de hoje, que é, nesse imaginário, o mesmo Islã é ele mesmo bárbaro. Apenas o Eu coletivo ocidental evolui, como se se tratasse de um jogo de computador em que as coisas só se movem quando em contato com o protagonista. E o mal cometido pelo Ocidente está no passadom, é algo a se lamentar e não a mudar.
Então, juntando isso ao fato - real - da resistência maior nos estados do Sul à integração, que era mais ameaçadora a esses "white trash" do que aos nortistas, seguros na sua "superioridade," a pecha de racista se integra aos sulistas, enquanto o racismo vai lentamente se tornando uma característica negativa. Note-se que a visão do racismo como característica negativa não é uma visão de um problema com a sociedade, estrutural, mas uma qualidade intrínseca ao "racista," um indivíduo com essa mácula de caráter. Uma falha moral, bem ao estilo puritano, a ser denunciada e castigada, e não um erro a ser corrigido com ensino, com ação afirmativa, mudando a sociedade.
Ao mesmo tempo, os programas de ação afirmativa, ao longo de décadas, surtiram efeito o suficiente para que os negros deixassem de ser o grupo mais pobre e menos educado dentro da sociedade americana. A tocha passou para os brancos rurais, que antes dividiam características econômicas e de educação semelhantes, mas mantinham o status mais alto por ser brancos. Embora o valor de ser branco não tenha desaparecido, o fato de esse grupo ter sido "congelado," numa posição econômica e educacional inferior, fez com que o seu status total caísse. Ainda mais quando ligado aos preconceitos norte-sul.
O resultado é que, numa sociedade "multicultural," em que os indivíduos são antes parte de sua cultura do que indivíduos na sociedade, os rednecks como um grupo passaram a compartilhar boa parte do preconceito antes destinado aos negros. Dos preconceitos, e das funções sociais, como por exemplo a de servir de culpados pelo tráfico de drogas, e a de morrer pela pátria.
Fora isso? Os novos pretos. Como assim? Bom, pra começar, agora são eles que morrem nas linhas de frente - os negros, que tinham essa tarefa no Vietnã, foram pra burocracia militar.
Bom, mais uma explicação preliminar, agora sobre o Exército americano. A burocracia do Pentágono é uma das maiores do mundo - os únicos exércitos maiores que eles, o ELRPC e o indiano, são de recrutas, e tem "núcleos" muito menores. Pra efeito de comparação, o Pentágono tem 10 vezes mais empregados que a GM e um orçamento 4 vezes maior que o faturamento da GE. E isso não leva em conta os reservistas, guardas nacionais, mercenários, nem terceirizados - e a estimativa por baixo é de que estes façam um contingente de uns 300 mil. Como eles conseguem fazer tanta gente se alistar, se o salário não é tão grande assim (pagando a renda per capita americana a todos eles, na média, o baque já é maior que o PIB de muito país), e o adicional de periculosidade é póstumo? Graças à linda desigualdade social americana, quase tão legal quanto a daqui. E ao GI Bill e a treinamento profissional grátis, que fazem da carreira militar uma opção de avanço na vida pra quem não tem futuro. Então quem entra pra linha de frente, quase por definição, é o estrato mais fudido da sociedade americana. No momento, "poor rural whites" (e o Pentágono não cruza os dados, mas eles são do vale do Mississippi e do Sul), e imigrantes (de novo, o Pentágono não repara oficialmente, mas eles são quase todos das "colônias", chicanos, filipinos e caribenhos). E sim, você pode se alistar agora e virar cidadão depois. Nesse sentido, o exército americano é uma imensa legião estrangeira.
Bom, isso tudo foi só pra dizer o ponto de partida - o novo andar do porão da escada social americana deixou de ser os pretos pra ser os rednecks. Isso não é inteiramente verdade em alguns sentidos - por exemplo, especificamente do ponto de vista da repressão policial, driving while black continua sendo um crime terrível, e negros continuam tendo chances bastante boas de ir parar no xilindró em algum momento da vida. Mas nesse segundo ponto, que tem tanto a ver com envolvimento real em crime quanto com o preconceito policial, os pescoços vermelhos já chegam perto. E, mais uma vez, quando um grupo "étnico" inteiro se envolve com crimes frequentemente, seja crime organizado ou crime de pé-rapado, isso é um belo sinal de exclusão.
É interessante que, entre as características negativas que são atribuídas aos rooinecks*, está o próprio racismo. Isso é, o preconceito imputa ao seu alvo como defeito ser preconceituoso. As outras características negativas são as de sempre, a degeneração física (tornando em defeitos pessoais os efeitos da pobreza, como ser desdentado ou ter marcas de doença), a imbecilidade (com direito ao dialeto/sotaque ridículo e analfabeto), e aquelas ligadas ao sexo - menos o caráter lúbrico que se imputa ao negro, mas uma imagem constante de proles extensas e incestos.
Admita-se que a imagem negativa do redneck, em termos mais gerais, é relativamente antiga. Ela não foi tão fortemente negativa no passado, porém, e, mais importante, ela se referia "ao seu primo da roça." Hoje, a estereotipização é exclusiva, "racial" nesse sentido. Trata-se de um grupo alienígena, (essa palavra inglesa, alien, que denota algo tão mais distante que o estrangeiro), um outro que deve ser mantido à distância, não um parente. Note-se aí que é exatamente esse o modo particular do racismo americano, em contraposição ao racismo hierárquico brasileiro. Falta o reforço "científico" que se agarrou ao racismo, falta a diferenciação clara através da cor da pele, mas o processo mental é similar. E ele se transferiu para os rednecks na história muito recente.
Claro que o preconceito racial não desapareceu. Pelo contrário, continua firme e forte, inclusive fazendo vítimas fatais. Mas a forma que ele toma para a maior parte da população mudou, e muito. Em parte, claro, devido às grandes migrações internas do século XX, que fizeram com que mudasse o campo desse preconceito, já que assim uma enorme população negra saía do arco "caribenho," a imensa área entre o Potomac e o Tietê na qual a escravidão africana sustentou a agroexportação. (Casos semelhantes são a migração caribenha para o Reino Unido e a adaptação dos ex-escravos e seus descendentes imediatos a uma São Paulo industrializante descrita por Florestan Fernandes em "A Inserção do Negro na Sociedade de Classes").
A mudança na imagem que os americanos têm do seu próprio Sul espelham, de certa forma, a mudança na imagem que o "Ocidente" como um todo - isto é, os EUA, Europa Ocidental, e os velhos Dominions do Império Britânico- tem do Sul global. O preconceito associado ao elitismo foi trocado por um preconceito em que, numa operação que demonstra o perigo dos rótulos e bom mocismo fáceis, a identificação se dá com os menos favorecidos. Isto é, as "elites" dos países subdesenvolvidos passam de vanguardas que levarão seus países a ser mais como a Europa ao papel de "velhos Europeus," daqueles vilões colonizadores com os quais o Europeu já não se identifica, culpados pelas mazelas do terceiro mundo. O deslocamento temporal da referência que permite essa identificação ao mesmo tempo ambígua e unívoca não é único, acontece também quando o Islã, por exemplo, é apresentado como uma fonte de razão e sabedoria confrontada com a Europa bárbara, e o Islã de hoje, que é, nesse imaginário, o mesmo Islã é ele mesmo bárbaro. Apenas o Eu coletivo ocidental evolui, como se se tratasse de um jogo de computador em que as coisas só se movem quando em contato com o protagonista. E o mal cometido pelo Ocidente está no passadom, é algo a se lamentar e não a mudar.
Então, juntando isso ao fato - real - da resistência maior nos estados do Sul à integração, que era mais ameaçadora a esses "white trash" do que aos nortistas, seguros na sua "superioridade," a pecha de racista se integra aos sulistas, enquanto o racismo vai lentamente se tornando uma característica negativa. Note-se que a visão do racismo como característica negativa não é uma visão de um problema com a sociedade, estrutural, mas uma qualidade intrínseca ao "racista," um indivíduo com essa mácula de caráter. Uma falha moral, bem ao estilo puritano, a ser denunciada e castigada, e não um erro a ser corrigido com ensino, com ação afirmativa, mudando a sociedade.
Ao mesmo tempo, os programas de ação afirmativa, ao longo de décadas, surtiram efeito o suficiente para que os negros deixassem de ser o grupo mais pobre e menos educado dentro da sociedade americana. A tocha passou para os brancos rurais, que antes dividiam características econômicas e de educação semelhantes, mas mantinham o status mais alto por ser brancos. Embora o valor de ser branco não tenha desaparecido, o fato de esse grupo ter sido "congelado," numa posição econômica e educacional inferior, fez com que o seu status total caísse. Ainda mais quando ligado aos preconceitos norte-sul.
O resultado é que, numa sociedade "multicultural," em que os indivíduos são antes parte de sua cultura do que indivíduos na sociedade, os rednecks como um grupo passaram a compartilhar boa parte do preconceito antes destinado aos negros. Dos preconceitos, e das funções sociais, como por exemplo a de servir de culpados pelo tráfico de drogas, e a de morrer pela pátria.
8.9.04
Tio Patinhas
Há quem pense que ter muito dinheiro faz as pessoas pirarem. O exemplo clássico é o Tio Patinhas, nadando na caixa forte. Pois bem, essa é a única explicação possível para os projetos mirabolantes do Lessa como presidente do BNDES. De reitor da falida UFRJ a presidente dum orçamento de quatorze dígitos, pirou.
Bom, quem dera que fosse essa a explicação. Porque o tipo de merda que o Lessa faz é velho no BNDES. O caso extremo - do qual eles não aprenderam porra nenhuma - é a AmBev. Pegaram uma grana do BNDES pra fazer uma empresa quase-monopólio. A justificativa, tanto para receber a grana quanto pro CADE permitir a fusão, a despeito de todas as leis antitruste possíveis e imagináveis, foi a de fazer uma "multinacional brasileira." E la foram os saudosistas do Brasil Grande investir dinheiro alheio e jogar fora a proteção da concorrência, em nome de poder encher a boca pra dizer que o Brasil "tem a cervejaria número não sei quantos do mundo!" Bem feito, agora os empresários, que tão se lixando pro ufanismo e querem é fazer dinheiro, venderam a casa pros belgas da Interbrew. E o BNDES reclama, mas continua com a idéia idiota de estimular trustes, à maneira dos kereitsus e zaibatsus japoneses, ou dos ainda mais inchados chaebols coreanos.
Noves fora que nem o Japão nem a Coréia, à época em que os ditos cujos foram estabelecidos, eram democracias, e vamos esquecer que receberam uma boa grana de "reconstrução." Ah é, e vamos também esquecer toda a corrupção gerada pela mistureba de Estado e Empresa. Então vai lá, dá o meu dinheiro pra bilionário, de graça. Aproveitando, faz uma reforma agrária geral, que nem na Coréia e no Japão, em que a concentração da grande indústria se deu ao mesmo tempo que uma redistribuição de capital em escala épica.
Hoje o Lessa proclamou, num seminário sobre desenvolvimento econômico no Estado do Rio de Janeiro, alguns factóides de fazer inveja ao César Maia. O mais pitoresco :
Pelo menos esse não prejudica ninguém. Já os megaprojetos que envolvem o porto de Sepetiba, entre os quais o Lessa anunciou "duas siderúrgicas" e a Petrobras um parque petroquímico...ainda vamos estar falando de limpar a Baía de Guanabara, e a de Sepetiba vai estar pior, em nome de uma falácia pra dar dinheiro a empreiteiros. Fora que, com mais duas siderúrgicas, o Paraíba do Sul vai morrer de vez. O Rio vai virar potentado do Golfo Pérsico de vez - cheio de petróleo, governado por fundamentalistas religiosos, e tendo que dessalinizar água do mar pra beber.
A falácia em questão na verdade é dupla. Uma é que o porto de Sepetiba apresenta "maravilhosas condições naturais etc etc" para se tornar um superporto. Besteira, primeiro porque não apresenta - o custo da dragagem é mais ou menos o mesmo do porto do Rio, a não ser que você taque o lodo na praia ali do lado, e as condições de acesso terrestre estão por construir (olha aí as empreiteiras ficando ricas). Segundo porque superporto se faz a partir da demanda, mesmo que as "condições naturais" sejam uma porcaria. Osaka-Kobe não é o melhor porto do mundo, e dois terços do porto de Cingapura têm calado "natural" de 3 metros*, enquanto o de Roterdã é assoreado o tempo todo, gasta uma fábula de dragagem. E a localização do Rio não é essas maioneses todas, a costa a norte só vai ter alguma atividade econômica muito depois. Superporto da América Latina, era melhor o Rio Grande, ou só pro Brasil Santos mesmo. Santos é uma porcaria de porto pra navio grande, mas o custo da dragagem (ou da construção de um porto oceânico em Santos) tem que ser comparado com o de construir a estrutura de terra até São Sebastião ou Sepetiba.
A outra falácia é que você faz o porto e aí acontece a demanda. Por enquanto, o Rio não tem demanda nem pra encher os portos existentes. Os navios de contêiners que passam aqui são duas categorias abaixo dos que passam pelos "superportos" - cuja demanda, aliás, é, pra cada um, muito, mas muito maior que a de todo o Brasil junto. Cingapura dá umas dez vezes Santos. Se é pra jogar o meu dinheiro fora em barquinho (e eu, pessoalmente, acho barquinho uma coisa maneiríssima), faz uns estaleiros. Ou compra uma rede de barcas cruzando a baía de Guanabara. (além dos que já existem, terminais na Praça Mauá, no Fundão, no Galeão e no Cocotá, em Caxias, e em São Gonçalo. Quicá um roll-on-roll-off até Caxias, pra ônibus subindo a serra.)
E a última falácia de Sepetiba é que o porto seria em Sepetiba. Um livro de projetos do Brasil Grande fala do excelente porto de ANGRA DOS REIS. E tem a batimetria do lado; 2/3 da baía de Sepetiba são rasos. O porto de Sepetiba é uma laranja; não ficaria na baía de Sepetiba, mas começaria no atual porto pra se extender até Angra. Que nem a usina de Belo Monte, da Eletronorte - a usina nem é tão problemática assim, e é eficiente - mas, de verdade mesmo, carece de fazer outras 5, todas piores, Xingu acima, senão só gera energia metade do ano...
Outro projeto Cesarmaiesco do Lessa é "o eucalipto e o etanol pro norte fluminense." Sob a égide de grandes empresas, CLARO. Caramba, foi a porcaria do Proálcool que prejudicou tanto os agricultores de SP que deu origem ao movimento dos Sem Terra, e agora querem fazer tudo de novo? Que estória é essa? Vou ter que assistir exposição do Sebastião Salgado sobre os sem-terra criados pelo Proeucalipto?
E todos eles reclamando dos "entraves ambientais." Porra, "entraves"? O Globo reclamava outro dia, junto com a DIlma Roussef, que uma hidrelétrica, "já pronta," não conseguia a licença pra subir a água "só" porque ia afundar 3000 hectares de mata de araucária. Coitadinhos. Parece o argumento dos bingos.
Ah, uma das siderúrgicas propostas é da Vale. Cuja privatização é outra "maravilha" do BNDES. No caso, com a desculpa de que o Antonio Ermírio não podia ganhar porque senão ia ser muita concentração de mercado. Menos do que fatia da AmBev, mas deixa pra lá, eles deram todas as oportunidades para que, depois da privatização, a Vale se tornasse monopolista, e venderam a porcaria num bloco só, pro monopólio ser multidimensional.
*calado - profundidade do casco do navio embaixo d'água, no caso de um porto, o maior navio que cabe lá.
Bom, quem dera que fosse essa a explicação. Porque o tipo de merda que o Lessa faz é velho no BNDES. O caso extremo - do qual eles não aprenderam porra nenhuma - é a AmBev. Pegaram uma grana do BNDES pra fazer uma empresa quase-monopólio. A justificativa, tanto para receber a grana quanto pro CADE permitir a fusão, a despeito de todas as leis antitruste possíveis e imagináveis, foi a de fazer uma "multinacional brasileira." E la foram os saudosistas do Brasil Grande investir dinheiro alheio e jogar fora a proteção da concorrência, em nome de poder encher a boca pra dizer que o Brasil "tem a cervejaria número não sei quantos do mundo!" Bem feito, agora os empresários, que tão se lixando pro ufanismo e querem é fazer dinheiro, venderam a casa pros belgas da Interbrew. E o BNDES reclama, mas continua com a idéia idiota de estimular trustes, à maneira dos kereitsus e zaibatsus japoneses, ou dos ainda mais inchados chaebols coreanos.
Noves fora que nem o Japão nem a Coréia, à época em que os ditos cujos foram estabelecidos, eram democracias, e vamos esquecer que receberam uma boa grana de "reconstrução." Ah é, e vamos também esquecer toda a corrupção gerada pela mistureba de Estado e Empresa. Então vai lá, dá o meu dinheiro pra bilionário, de graça. Aproveitando, faz uma reforma agrária geral, que nem na Coréia e no Japão, em que a concentração da grande indústria se deu ao mesmo tempo que uma redistribuição de capital em escala épica.
Hoje o Lessa proclamou, num seminário sobre desenvolvimento econômico no Estado do Rio de Janeiro, alguns factóides de fazer inveja ao César Maia. O mais pitoresco :
Cuma?
- Não se explora a contra-violência do Rio. Os empresários deveriam adotar uma praça e promover atividades culturais, especialmente de dança
Pelo menos esse não prejudica ninguém. Já os megaprojetos que envolvem o porto de Sepetiba, entre os quais o Lessa anunciou "duas siderúrgicas" e a Petrobras um parque petroquímico...ainda vamos estar falando de limpar a Baía de Guanabara, e a de Sepetiba vai estar pior, em nome de uma falácia pra dar dinheiro a empreiteiros. Fora que, com mais duas siderúrgicas, o Paraíba do Sul vai morrer de vez. O Rio vai virar potentado do Golfo Pérsico de vez - cheio de petróleo, governado por fundamentalistas religiosos, e tendo que dessalinizar água do mar pra beber.
A falácia em questão na verdade é dupla. Uma é que o porto de Sepetiba apresenta "maravilhosas condições naturais etc etc" para se tornar um superporto. Besteira, primeiro porque não apresenta - o custo da dragagem é mais ou menos o mesmo do porto do Rio, a não ser que você taque o lodo na praia ali do lado, e as condições de acesso terrestre estão por construir (olha aí as empreiteiras ficando ricas). Segundo porque superporto se faz a partir da demanda, mesmo que as "condições naturais" sejam uma porcaria. Osaka-Kobe não é o melhor porto do mundo, e dois terços do porto de Cingapura têm calado "natural" de 3 metros*, enquanto o de Roterdã é assoreado o tempo todo, gasta uma fábula de dragagem. E a localização do Rio não é essas maioneses todas, a costa a norte só vai ter alguma atividade econômica muito depois. Superporto da América Latina, era melhor o Rio Grande, ou só pro Brasil Santos mesmo. Santos é uma porcaria de porto pra navio grande, mas o custo da dragagem (ou da construção de um porto oceânico em Santos) tem que ser comparado com o de construir a estrutura de terra até São Sebastião ou Sepetiba.
A outra falácia é que você faz o porto e aí acontece a demanda. Por enquanto, o Rio não tem demanda nem pra encher os portos existentes. Os navios de contêiners que passam aqui são duas categorias abaixo dos que passam pelos "superportos" - cuja demanda, aliás, é, pra cada um, muito, mas muito maior que a de todo o Brasil junto. Cingapura dá umas dez vezes Santos. Se é pra jogar o meu dinheiro fora em barquinho (e eu, pessoalmente, acho barquinho uma coisa maneiríssima), faz uns estaleiros. Ou compra uma rede de barcas cruzando a baía de Guanabara. (além dos que já existem, terminais na Praça Mauá, no Fundão, no Galeão e no Cocotá, em Caxias, e em São Gonçalo. Quicá um roll-on-roll-off até Caxias, pra ônibus subindo a serra.)
E a última falácia de Sepetiba é que o porto seria em Sepetiba. Um livro de projetos do Brasil Grande fala do excelente porto de ANGRA DOS REIS. E tem a batimetria do lado; 2/3 da baía de Sepetiba são rasos. O porto de Sepetiba é uma laranja; não ficaria na baía de Sepetiba, mas começaria no atual porto pra se extender até Angra. Que nem a usina de Belo Monte, da Eletronorte - a usina nem é tão problemática assim, e é eficiente - mas, de verdade mesmo, carece de fazer outras 5, todas piores, Xingu acima, senão só gera energia metade do ano...
Outro projeto Cesarmaiesco do Lessa é "o eucalipto e o etanol pro norte fluminense." Sob a égide de grandes empresas, CLARO. Caramba, foi a porcaria do Proálcool que prejudicou tanto os agricultores de SP que deu origem ao movimento dos Sem Terra, e agora querem fazer tudo de novo? Que estória é essa? Vou ter que assistir exposição do Sebastião Salgado sobre os sem-terra criados pelo Proeucalipto?
E todos eles reclamando dos "entraves ambientais." Porra, "entraves"? O Globo reclamava outro dia, junto com a DIlma Roussef, que uma hidrelétrica, "já pronta," não conseguia a licença pra subir a água "só" porque ia afundar 3000 hectares de mata de araucária. Coitadinhos. Parece o argumento dos bingos.
Ah, uma das siderúrgicas propostas é da Vale. Cuja privatização é outra "maravilha" do BNDES. No caso, com a desculpa de que o Antonio Ermírio não podia ganhar porque senão ia ser muita concentração de mercado. Menos do que fatia da AmBev, mas deixa pra lá, eles deram todas as oportunidades para que, depois da privatização, a Vale se tornasse monopolista, e venderam a porcaria num bloco só, pro monopólio ser multidimensional.
*calado - profundidade do casco do navio embaixo d'água, no caso de um porto, o maior navio que cabe lá.
1.9.04
Arco do Desmatamento
E não é que o César Mai cortou uns 3/4 da copa da gameleira que fica na frente das casas casadas, pra galera poder ver a obra dele?
Assim como, na "reforma e restauro" do Passeio Público, sumiram boa parte das árvores. Assim como volta e meia vai uma embora, e não é trocada por um bilhão de anos. Eventualmente ele troca, e enche a boca pra dizer que plantou árvore. Puta troca, uma de 100 anos por uma de dois. Sombra maneira, a mudinha, né? agora mesmo tem umas palmeiras imperiais morrendo na Paysandú - mas pode deixar que a Fundação Parques e Jardins tá bem de vida, ou pelo menos a diretora tá.
Desse jeito, o César Maia ainda vai transformar o Rio em um imenso Bangu, um deserto a 50ºC. E, quando tiver tirado a última árvore pra virar estacionamento, vai pôr um "sistema de refrigeração por gotículas", e esse bando de imbecil vai achar ótimo e reeleger ele de novo.
Se bem que às vezes eu acho que eu que sou doido, por achar calçada melhor que vaga de estacionamento, árvore melhor que anúncio da Clear Channel, e o Rio de Janeiro melhor que a Gary, Indiana em que o César Maia ainda vai nos transformar.
Assim como, na "reforma e restauro" do Passeio Público, sumiram boa parte das árvores. Assim como volta e meia vai uma embora, e não é trocada por um bilhão de anos. Eventualmente ele troca, e enche a boca pra dizer que plantou árvore. Puta troca, uma de 100 anos por uma de dois. Sombra maneira, a mudinha, né? agora mesmo tem umas palmeiras imperiais morrendo na Paysandú - mas pode deixar que a Fundação Parques e Jardins tá bem de vida, ou pelo menos a diretora tá.
Desse jeito, o César Maia ainda vai transformar o Rio em um imenso Bangu, um deserto a 50ºC. E, quando tiver tirado a última árvore pra virar estacionamento, vai pôr um "sistema de refrigeração por gotículas", e esse bando de imbecil vai achar ótimo e reeleger ele de novo.
Se bem que às vezes eu acho que eu que sou doido, por achar calçada melhor que vaga de estacionamento, árvore melhor que anúncio da Clear Channel, e o Rio de Janeiro melhor que a Gary, Indiana em que o César Maia ainda vai nos transformar.
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