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17.5.06

Ainda não é o apocalipse II

A violência nas ruas e nas cadeias é algo infinitamente pior do que a possível diminuição no lucro da indústria paulista, mas de novo não é o fim do mundo. A violência brasileira é uma catástrofe cotidiana: são mais de 30.000 mortos todos os anos, dos quais pelo menos 4.000 são mortos pelo Estado. E rebeliões em presídios em SP (norte do Paraná e leste do MS fazem parte de SP, pô) são frequentes há pelo menos duas décadas. Lembro de quando eu era criança e lia Cric e Chiclete com Banana, e volta e meia tinha alguma referência às rebeliões. A histeria dos últimos dias foi parcialmente justificada pelo negócio ter finalmente atingido o Brasil asfáltico, mas teve muito a ver com o fato de a mídia estar trabalhando em clima de histeria pelo menos desde o Roberto Jefferson. Passar um mesmo ônibus queimando de novo e de novo, sem tirar o "ao vivo" da imagem, é no mínimo irresponsável, e sinceramente imoral.

Agora olha que coisa: o PCC "está tocando o terror em SP" (com a conivência das autoridades, que bloquear celular é a coisa mais fácil do mundo). Matou 24. Enquanto isso, a "reação" policial, aplaudida pelos "homens de bem," caminha rapidamente rumo aos três dígitos.

Não adianta dizer que foi "confronto." Em confronto, morrem quantidades parecidas de gente dos dois lados. Com a desculpa do combate ao crime, pessoas ("suspeitos," mas a polícia não avisa quem, vai que se prova, como é o caso metade das vezes, que não eram suspeitos de nada, ou como é o caso em 2?3 das vezes, que não estavam armados) estão sendo assassinadas. Isso não é estado de direito, e é muito pior do que o PCC. Mesmo contando o medo que este causou, com muitas mãozinhas da imprensa que repetia os mesmos episódios sem avisar do fato, multiplicando a força do PCC na visão que apresentava. Pior porque o PCC, por pior que seja, é uma gangue criminosa. A polícia, teoricamente, age em nosso nome, com nosso dinheiro, a mando dos governadores que nós elegemos. E mata mais do que (diretamente) os americanos mataram no Afeganistão. Eu brincava que precisava, caso o Alckmin se elegesse e seguisse a recomendação da Veja de levar a democracia à Bolícia, de aprender a tradução correta de "no blood for gas," pra botar no cartaz. Mas precisa não. A guerra travada pelo governo brasileiro, em sua encarnação estadual, é a ocupação por uma polícia militarizada a partir do nome do próprio Brasil. O resultado dela não é segurança para a classe média que se sente mais segura a cada "bandido" morto, mas mais insegurança. Claro. A polícia que viola os direitos humanos não está sendo dura com bandidos, está desrespeitando a lei, e quem desrespeita uma porque o poder é dele, não da lei, pode aplicar a mesma escolha a outra. A ética dos heróis de filme de ação, que são implacáveis com os maus (têm detectores pra saber quem é o mau) mas escoteiros com os bons, é tão inverossímil quanto a física que lhes permite sobreviver a balas de canhão.

Em tempos: antes que venha a ladainha da "polícia corrupta e violenta," o buraco é mais em cima. Polícia é parcialmente corrupta e violenta em qualquer lugar do mundo. Por definição, ou vício de ofício, e assim como não creio que o bandido brasileiro seja uma besta-fera cuja eliminação física resolva o problema, não creio que a polícia brasileira tenha atraído pra si quadros piores do que em outros países. O problema não é esse, é que não temos polícia mesmo. Achamos que um exército de ocupação seria mais reconfortante. Deu no que deu - a reação ao exército de ocupação é a guerrilha.

2 comentários:

Marco Aurélio disse...

Tiago

Como se não bastasse esta situação caótica ainda existem uns idiotas que espalham boatos sobre PCC e alimentam pânico em SP através de e-mails , de mensagens de comunicadores instantâneos e em sites de relacionamento. Isso prejudica a vida de milhares de pessoas e ainda dificulta o trabalho da polícia e também da imprensa.
Antes de repassar qualquer mensagem para sua lista de contato, encaminhe-a sempre a empresas de antivírus, que poderão confirmar se são verdadeiras. Não vamos ajudar a complicar mais ainda a situação!

Veja exemplo de boato virtual que já circula pela web:

ISSO É URGENTE!! > >HOJE ÀS 18HS HAVERÁ UM ATAQUE DE VIOLENCIA NA CIDADE.... POR FAVOR, ESTEJAM >EM SUA CASA ÀS 18HS!!! > > AS 18 HS, VAI TER UMA AÇÃO DE VIOLÊNCIA NA CIDADE, A DIRETORIA DE UMA > GRANDE EMPRESA RECEBEU UMA CARTA DA POLÍCIA ÀS 10H DE HOJE AVISANDO A > RESPEITO DISSO.... > > TODOS OS FUNCIONÁRIOS VÃO SER DISPENSADOS A PARTIR DAS 16HS > QUE NÃO ERA PRA NINGUÉM FICAR NAS RUAS > OS ÓRGÃOS PUBLICOS TÃO REPASSANDO ESSA CARTA ÁS EMPRESAS LIGADAS AO > GOVERNO, COMO NO CASO DA DIRETORA DA EMPRESA QUE RECEBI ESTA INFORMAÇÃO. > > POR FAVOR, AVISE O MÁXIMO POSSÍVEL DE PESSOAS QUE VOCÊ CONHECE!!! > > ATENÇÃO, ISSO NÃO É TROTE, É SERIO..... POR FAVOR, AVISEM TODOS QUE VOCÊ > CONHECE!!! >

Obrigado

Um abraço

Marco Aurélio

nenhum disse...

Tiago, a televisão pode ter mostrado o mesmo ônibus, mas vários outros foram queimados interior afora sem que suas imagens fossem mostradas...