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19.1.12

Prioridades do governo brasileiro na virada do século

É curioso ver as prioridades do governo. Por exemplo:

Para geração de energia através de imensas usinas hidrelétricas em locais remotos, ecoando Nikita Kruschev, que dizia* que iria afogar o capitalismo em rios de eletricidade, tem dinheiro - a engenharia econômica de Belo Monte, mais ainda que a das usinas do Madeira, não é a de uma usina elétrica comum, com retorno pela própria atividade, mas a de um enorme enterro de dinheiro público. Para investimento em eficiência energética, que será necessário no século XXI e pode gerar novas tecnologias, não tem. Apesar do custo ser menor. Mas eficiência energética não é grandioso. Não tem graça posar de capacete ao lado dum sujeito com aquecimento solar no chuveiro.

Para uma ponte rodoviária da escala da Rio-Niterói ligando Manaus ao subúrbio de Iranduba (pop. 40.000) e ao município de Manacapuru (pop. 85.000, a 68km de distância), tem dinheiro. Afinal, Washington Luís já dizia que governar é abrir estradas. Para pesquisar o maglev-cobra, tecnologia que permitiria, se desenvolvida, cortar os custos de implantação de transporte de massa em cidades enormemente (o maglev-cobra pesa metade do peso de um monotrilho por passageiro transportado, é 3x mais eficiente em gasto de luz, e não faz barulho), não tem. Cientista é tudo maluco e pouco confiável, ao contrário de empreiteiro.

Trezentos e vinte e oito mil portugueses virem morar no Brasil, somando-se ao milhão que já estava aqui, pode, assim como 100.000 cada de italianos e espanhóis. Quatro mil haitianos no Brasil é uma invasão contra a qual o governo deve fechar as porteiras. Não que eu ache que essa diferença tenha sequer alguma possibilidade de se dever a um tipo de preconceito que o Ali Kamel, da Globo, já demonstrou em livro não existir no Brasil.

Para pesquisa agrícola aplicada (e fornecida de graça ao agronegócio), tem 5 bilhões por ano, dois só na Embrapa. Para pesquisa científica de ponta, incluindo o ESO e o ITER, que podem revolucionar a ciência (e, se der certo, no caso do último, a economia), e mesmo ganhando desconto na fatura, o Brasil não paga o que devia. 170 milhões por ano para o conjunto dos projetos internacionais. Menos de um décimo do que se gasta melhorando a eficiência da soja na terra pela qual os fazendeiros não pagam imposto vai para tentar descobrir fusão nuclear. Ou melhor, iria, se fosse pago.

Brasil, bravamente caminhando rumo ao século XX.



*Non è vero. Ma va, è bene trovatto.

2 comentários:

Marcus Pessoa disse...

Muito triste. É só o que tenho pra comentar.

Anônimo disse...

Em especial quanto a obras ou projetos de engenharia, mas não só nesses casos, não há mistério algum nessas escolhas, bastando para elucidar o caso apenas atentar no seguinte critério: dá azo a comissão de corrupção e de caixinha partidária? Se pelas circunstâncias concretas da obra e/ou projeto (magnitude, eventual potencial de desvio clandestino de dinheiro e materiais etc.), tal critério puder ser atendido. A obra ou projeto serão executados e as verbas para ele serão facilmente liberadas; se não, esqueça. Simples assim.