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14.12.12

A ideologia acidental

A política brasileira tem se caracterizado por uma rejeição da ideologia, pelo menos às claras. Nenhum partido de esquerda fala em aumentar imposto. Nenhum partido de direita se assume privatista. E por aí em diante; a idéia de defender sua ideologia contra a alheia foi substituída pela idéia de, pelo menos às claras, tentar agradar a todos. O embate ideológico, quando existe, é escamoteado, fazendo com que a política pareça ainda mais resumir-se a uma luta pelo poder do que é na verdade. Não deixa de ser curioso: políticos se apresentam como menos idealistas do que são, convencidos que estão (ainda mais depois da dupla de postes lulesca, de cujas eleições se tirou todas as idéias erradas) da rejeição pelos eleitores de grandes idéias. A "gestão" pseudoempresarial, ideologia que começou nas escolas de negócios e pela qual, em 2008, muitas delas fizeram mea culpa, virou um consenso brasileiro em quase todos os matizes ideológicos, ajudando ainda mais a fazer com que a ideologia que haja em algum partido fique muito bem escondida.

Nessa situação, não deixa de ser um refresco ver um debate claramente ideológico entre uma presidenta de centro-esquerda, que quer forçar as companhias elétricas privatizadas a abaixarem seus preços, e o partido que se reinvindica líder da oposição de direita, que defende as empresas contra o governo, e propõe como solução para o mesmo problema, ao invés do corte de lucros, o corte de impostos sobre lucros de empresas e de fundos do trabalhador. O PSDB está defendendo suas convicções ideológicas como partido liberal mesmo ao custo de impopularidade. Parece uma vitória clara da ideologia, não? Há algo que exprima mais a convicção ideológica de um partido do que defendê-la mesmo contra a vontade popular? Mas como diabos o PSDB, que fugiu tanto de se assumir liberal de direita (até as campanhas moralistas contra "o partido do aborto e do kit gay" eram terceirizadas e negadas em público) foi se tomar de brios ideológicos de repente?

A resposta, infelizmente pra quem gostaria de ver uma discussão ideológica na política, é que o embate ideológico é apenas coincidental. A disputa é muito mais simples e,como cada vez mais na política brasileira, paroquial; paradoxalmente, o sistema federativo confuso e misturado significa que se pensa no seu estado ou município contra o resto da federação ou a União acima de tudo. Os governadores do PSDB não estão defendendo empresas privadas, mas sim as companhias estatais de energia elétrica pertencentes a seus respectivos estados; nenhum tucano que não tenha interesse direto está lá se coçando muito contra a redução da conta de luz da Dilma. A questão é só de dinheiro no caixa estadual mesmo, e ideológica só por acidente e coincidência.

O tempora o mores.

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