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10.2.12

Calaus

Muita retórica vem sendo gasta para decidir se as concessões de aeroportos pelo governo federal constituem ou não "privatizações." Sinceramente, a semântica me é indiferente, apesar de notar que concessões de energia elétrica e telefonia sob o governo FHC, além do fim do monopólio do petróleo, foram chamadas de privatização pelo PT, o que daria razão aos tucanos e tecnocratas que tripudiam em cima da primeira grande concessão do governo Dilma. (Sob o governo Lula, uma data de rodovias federais foram concedidas.) Sinceramente, a semântica me é indiferente, assim como o dado em si da concessão. Concessões de serviços públicos são um fato da realidade sob o capitalismo, que não tem ligação direta, aparentemente, nem com o quão "à esquerda" um país é, nem com a qualidade desses serviços. Há empresas públicas e mistas, operando concessões ou com estrutura própria, mundo afora, e podemos encontrar tanto bons exemplos quanto porcarias em todas as situações.

O que preocupa mais é que as bases da operação de concessão dos aeroportos, ao contrário das concessões de rodovias feitas pelo Lula, são em muitos pontos parecidas com as da "privataria" tucana. Vamos a elas:

- o edital foi extremamente complexo, coisa de que os representantes do governo se orgulharam. Ora, regras para serem transparentes e monitoráveis têm que ser é simples, não complexas. Um processo bizantino é coisa de quem quer passar a perna no alheio, e não creio que esse alheio sejam os grupos que venceram as licitações, que têm à disposição os melhores economistas e advogados que o dinheiro pode comprar, pra fazer a análise.

- O preço dos aeroportos, a ser pago ao longo de décadas, é curiosamente próximo dos lucros anuais deles (130 milhões vs. 127, no caso de Viracopos). Assim, o que terá que ser pago pelos próprios compradores, e não a partir do lucro que terão, serão os investimentos. Que, tchan tchan tchan tchan, serão bancados pelo BNDES.

- Os consórcios vencedores são formados por empresas de idoneidade e procedência duvidosas. E não, não se trata de nenhum terceiromundismo - meu problema não é com as compradoras incluírem operadoras de aeroportos no terceiro mundo, mas com as composições societárias delas incluírem construtoras sobrecapitalizadas (atoladas de dívidas) e fundos sediados em países pouco transparentes. Mais, claro, os fundos de pensão públicos, que assim falseiam um pouco a "privatização."

Em todos os três itens, a situação é menos extrema que em algumas privatizações ocorridas sob o tucanato. Para comparar, o preço total pelo qual foi adquirida a Vale pôde ser pago com o lucro dela de três anos, e não três décadas; o edital mais bizantino ainda incluiu venda casada de toda a infraestrutura de escoamento de minérios do Brasil; e o consórcio era majoritariamente formado pelos fundos de pensão, mas dentro de um acordo pelo qual eles não tinham voz, apesar disso. Assemelha-se mais, nesse sentido, à curiosa engenharia financeira das usinas amazônicas, em que de novo fundos de pensão, mais a Eletrobrás, pagam a conta e assumem o risco, e as privadas entram com o lucro.

E é graças às referidas usinas, e às concessões de rodovias, e a tantos outros exemplos, que se pode dizer que a comemoração tucana é indevida - faz tempo que o PT privatiza. Ou, pelo menos, tem bico de tucano, se não a cauda e a plumagem. E uma boininha. Mas tem, evidentemente, mais sangue popular do que o pé na cozinha de FHC. Hmmm...

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