A oposição e a grande mídia procuram o tempo todo achar no PAC alguma "corrupção," palavra mágica que invalida tudo que passar perto (como no caso do ProUni, no qual 170 ricos entre 400.000 beneficiados provavam que o programa não presta). Ou "atrasos" num programa monstro que, na prática, é praticamente toda a formação de capital fixo do governo federal, e boa parte das esferas inferiores.
Deixando de lado essas besteiras de uma oposição que só quer o poder por si só e de uma mídia burra a ponto de estampar carta-corrente na primeira página, ainda há muito o que criticar de verdade nos projetos de infraestrutura do governo federal. Assim, e pra ver se tomo vergonha na cara e volto a postar regularmente aqui, começo hoje a falar mal dos maiores projetos do PAC, um por post.
Pra começar, e falando mal do PAC como um todo, adianto minha crítica com relação a todos eles: são projetos "Brasil grande," em que a realização da mega-obra é um fim-em-si e seus efeitos são apenas os diretos (transporte, irrigação ou o que seja), sem que haja um planejamento verdadeiro, apontando as consequencias do projeto. Isso apesar da própria Dilma ter contado a bravata de que agora haveria, ao contrário do que acontecia nos governos FH, Itamar e Sarney, planejamento econômico. É uma meia verdade: o que há em contraponto ao período anterior, quase tão importante quanto, é governo (ao invés de cleptocracia). Planejamento...mómenos.
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1 - o TAV Rio-Campinas.
Muita gente critica o TAV como obra "faraônica." Bem, grande é, sem dúvida. São 31bn de reais, no barato.
O projeto: Trem-bala, em linha dedicada a ser construída, com oito estações:
Rio (Central do Brasil ou Leopoldina)-Galeão-(Resende OU Volta Redonda)- São José dos Campos - Guarulhos - São Paulo (Luz ou a construir) - Viracopos - Campinas
O grosso dos 31bn seria gasto nas "obras de arte," mais especificamente em túneis e viadutos para subir a serra das araras e em trechos em túnel dentro do Rio de Janeiro e de São Paulo, mais o preço de se desviar ou afundar linhas férreas e estradas por onde ele passasse.
A tecnologia propugnada seria o trem convencional, com velocidades de pico de 300Km/h, o que representa hoje a média da malha "bala" francesa e japonesa (algumas linhas desses dois países chegam a 350Km/h de velocidade operacional. A velocidade média ficaria em 260Km/h, com paradas de cinco minutos e operação das sete da manhã à uma da manhã. O tempo da Leopoldina à Luz, portanto, seria de pouco menos de três horas. O preço estimado ficaria em torno de R$120 a preços de hoje.
Ao contrário de muita gente por aí, não creio que a obra em si e de si seja mau negócio. Pelo contrário: fora as desapropriações, acho que seria um raro caso de linha de trem que poderia ser rentável por si só, com juros nem tão baixos. As passagens principais (Luz-Leopoldina) seriam atraentes mesmo a preço idêntico ao da ponte aérea (700R$, segunda e sexta), já que a ponte tem atraso médio de meia hora, e outra meia hora de check-in, e meia hora no táxi, e quinze minutos de embarque além do horário, e quinze minutos taxiando ou esperando autorização. Efeito total: o tempo da ponte é o mesmo do trem. Além das passagens principais, o trem seria, efetivamente, o trem de aeroporto pro Galeão, Guarulhos e Viracopos. A metade do preço do táxi, o preço pra Guarulhos seria de 40R$, e poderia capturar uma boa metade dos 18 milhões de passageiros de Guarulhos, mais seus familiares. E a Dutra concentra mais de metade dos roubos de carga de alto valor agregado do Brasil, o que oferece um belo filé de transporte de carga à noite.
Passagens, então, e número possível de passageiros por ano, pros trechos mais rentáveis:
Leopoldina-Galeão: 25R$ x 2M = 50
Leopoldina-Luz: 120R$ x 8M = 960
São José-Luz: 50R$ x 2M = 100
Guarulhos-Luz: 30R$ x 15M = 450
Luz-Viracopos: 40R$ x 1,5M = 60
Luz-Campinas: 60R$ x 2M = 120
Os outros trechos, pela demanda existente e sem contar indução, não chegam juntos a 30. Deixemo-los de lado, inda mais porque seriam baratos mesmo.
Total de renda: 1,74bn a.a. - e isso é com um preço comparável ao serviço de ônibus de primeira classe, o que subestima a atratividade do trem-bala.
Custo operacional come uns 500 milhões por ano, na pior das hipóteses (é quanto custa, com salários e montanhas japoneses, pra manter um trem bala de tamanho equivalente num país com terremoto).
1,24bn por ano pra compensar o custo da construção.
Subsídio estatal de só um terço da obra, pensando em juros razoavelmente altos. E isso porque os números que tô usando são pra lá de conservadores. Na prática, preços ainda capazes de lotar a linha aumentariam isso aí pra uns 2,5bn a.a., o que cobriria inteiramente, sem subsídio estatal e com lucro de 100 milhões por ano o custo. Com subsídio estatal, poderia se praticar os preços acima e aumentar imensamente a movimentação atual de gente em todos os trechos.
Isso dito, as considerações:
1- 31bn de dólares num projeto que, ultimamente, é indutor de desenvolvimento, na região mais desenvolvida do Brasil? Tá certo que é impossível sonhar, num modelo político fragmentado não só porque é federação, com algo parecido com as metrópoles regionais de equilíbrio francesas, ou com as tecnopolein soviéticas (que , ok, também não deram certo), mas também não precisa de continuar ajudando, com verba tirada de todo mundo num modelo de impostos regressivo, a concentração, né?
2- Sumpaulo, a região metropolitana oficial, tem 19 milhões de habitantes. Há já quem defenda que, por critérios como os que são adotados mundo afora, a baixada santista e o vale do paraíba paulista já sejam parte da região metropolitana "real." O trem bala, com passagem em 20 minutos entre o centro de Campinas ou São José e o de São Paulo, consolidaria de vez essa realidade, além de estimular a suburbanização (com o que ela inevitavelmente tem de degradação ambiental) de todo o vale do Paraíba. O emergente carioca também, teria que decidir entre uma casa na Barra e na serra.
3- Ao contrário do alardeado, a economia de carbono proporcionada pelo trem-bala vai ser de mais ou menos zero. Apesar de a economia dele propriamente dita ser enorme em relação à ponte aérea (mesmo considerando que a maioria da energia virá de termoelétricas no Rio). É que, ao gerar uma concorrência para esta, inevitavelmente diminuirá o preço da passagem. E, ironicamente, o trem-bala viabilizaria seu principal concorrente, uma "ponte aérea" Rio-Campinas.
4- Rio e São Paulo são cidades ricas, mas as estações propostas estão em bairros degradados - a Cracolândia em SP e o vazio entre São Cristóvão e o Porto, no Rio. Ao fazer delas pólos de movimentação de gente com grana, o TAV faria mais do que os absurdos programas de revitalização via shopping center dos governos cleptocratas do Rio e São Paulo. Por outro lado, a dita localização pode afastar gente, principalmente porque poucos turistas de negócios estariam dispostos a encarar (com mala!) o metrô na hora do rush.
5- O preço do projeto poderia muito bem ser empregado, com um período de desenvolvimento mais longo, para desenvolver nossa própria tecnologia de trem bala ao invés de pagar a empresas estrangeiras que já estão envolvidas em escândalos por aqui.
6- O tamanho mínimo, pelo manual, para uma pista de decolagem de um boeing 737 é de 2Km para o modelo 737-100, 2,4Km para os demais modelos. As quatro pistas do Santos Dumont e de Congonhas têm 1.260, 1.323, 1.435 e 1.940 metros. E apesar das pistas menores, o SDU é o menos arriscado, já que dá pra arremeter, ou simplesmente cair de barriga na água (se o pouso for no sentido norte-sul); em Congonhas não há espaço pra erro nenhum. Ou seja, no momento, toda decolagem ou pouso na ponte aérea é uma operação de risco que vai contra o manual. O acidente da TAM em 2007 não foi um infortúnio, foi um milagre. Milagre de que não haja um daqueles por ano. Um trem-bala permitiria que o razoável fosse feito: só podem pousar nos respectivos aeroportos aviões em cujo manual tenha escrito distância de pista igual à das suas respectivas pistas. Vá, uma vez e meia. A Embraer agradece, e passagens aéreas caem no Brasil inteiro conforme o duopólio pense no que fazer com esse bando de Boeing na mão.
Conclusão? Eu, pelo menos, acho que sou a favor, principalmente pelo item 7. Mas em documento oficial algum vi isso tudo ser levado em consideração. Muito menos quantificado.
2 comentários:
É uma meia verdade: o que há em contraponto ao período anterior, quase tão importante quanto, é governo (ao invés de cleptocracia). Planejamento...mómenos.
hehehe
A implantação do Trem de Alta Velocidade (TAV) ou Trem bala, entre o Rio de Janeiro e Campinas-SP custará cerca de R$ 70 milhões/km contra R$ 2 milhões/km do trem convencional, ou seja daria para construir cerca de 17.000 km deste contra 510 km do trem bala . Se combinarmos a implantação do trem convencional com a revitalização da malha existente a extensão seria maior beneficiando outros estados.
A malha ferroviária mundial tem mais de 1.000.000 km de trens convencionais contra um pouco mais de 8.000 km dos trens de alta velocidade, concentrados em 9 países de alta renda per capita (Japão, Taiwan, Coréia do Sul, França, Alemanha, Itália, Espanha, Bélgica e Inglaterra). Não temos tecnologia para fabricar as composições do trem bala, mas certamente com investimentos modestos em desenvolvimento, fabricaremos as convencionais, movimentando toda a indústria brasileira.
Os trens de alta velocidade, atingem mais de 250 km/hora, e abaixo disto, são os considerados trens convencionais. Por que não começar com um trem convencional a 200km/hora com o devido tempo desenvolveremos tecnologia para trem de alta velocidade (MAGLEV COBRA) ? obras deste tipo podem resultar em fracassos como o túnel sob o canal da Mancha, cuja receita não paga os juros de financiamento e o governo tem que arcar com a diferença, todo o cuidado é pouco, pois não somos ricos.
Todas as cidades envolvidas no empreendimento serão ouvidas pelo consórcio responsável pela licitação, mas não foi apresentado nenhum plano alternativo com o trem convencional.
Temos que investir em Transporte Multimodal, pois o Brasil é de extensão continental e não entrar numa aventura faraônica que é o trem-bala.
Fontes utilizadas:
1)Estudo disponível no site do BNDES: “Trens de Alta Velocidade: Experiência Internacional” de Sander Magalhães Lacerda,
2)Matéria de 3 páginas do Estado de São Paulo no dia 23/08/09 sobre o trem bala (Cidades, C1, C4 e C5) que aponta sérios danos ambientais, desapropriações de áreas residenciais e industriais: serão 312 km de superfície, 108 km de pontes e 91 km de túneis,
3)Artigo “A quem interessa o trem bala mesmo?” de Creso de Franco Peixoto - Engenheiro Civil, mestre em Transportes e professor de Engenharia Civil do Centro Universitário da FEI - Fundação Educacional Inaciana:
4)Maglev Cobra : //www.maglevcobra.com.br
Antônio Carlos de Castro
Campinas-SP
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