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16.5.13

Maurício Gernsback Tolmasquim, a ferro e fogo



Em entrevista concedida ao Valor para neutralizar, digo comentar sobre estudo do WWF sobre a necessidade de proteção de ecossistemas amazônicos, o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim, diz que "não se vai construir a ferro e fogo" enquanto explica que sim, vai construir a ferro e fogo.





Problemas na entrevista do Tolmasquim: 1) Tolmasquin: Tapajós é uma área pouco antropizada. O grande desafio ali não é desenvolver, é construir preservando o máximo possível. Por isso a ideia das usinas plataformas, pensando em que as áreas onde ficariam os operários da obra sejam temporários e que não se formem cidades, que pessoas não se estabeleçam ali e que as áreas mexidas sejam reflorestadas.

Hidros-plataforma são um embuste, por uma série de motivos que já comentei aqui. Resumindo, é que plataformas não são isoladas e de baixo impacto no sítio por alguma forma exótica de planejamento ou engenharia, mas porque sendo flutuantes são construídas longe de seu destino final. O local de impacto da construção de uma plataforma é Niterói, não a bacia de Campos. Não dá pra rebocar usina hidrelétrica. http://sambadoaviao.blogspot.com.br/2012/05/projeto-hudson-redux.html


2) Tolmasquim: No caso do Tapajós, não tenho dúvida. Não se pode construir uma usina a ferro e fogo, destruindo todos os Ecossistemas. É claro que esse modelo vai contrariar tanto o pessoal que quer otimizar o uso daquela bacia, que não está usando da forma ótima, como vai contrariar os que desejam preservar intocado aquele ambiente. É preciso ter uma solução de compromisso. O potencial do Tapajós, Teles Pires e Juruena é de 28 mil MW - isso é o que é possível, não o que será feito. O que será feito é o que vamos ver no futuro. Só uma parte pequena está planejada.

Falar que "não fazer 100% de um nem de outro" é conciliação. Só que só de projeto firme ele fala em mais de 60% dos MW. Fazer só quase tudo o que ele quer é fingir que houve conciliação. Aliás, restringir a questão ao Tapajós, idem. As usinas do Madeira e do Xingu não entram na conta do "a parte que nós desenvolvimentistas queríamos" por quê?


3) Tolmasquim: Pelo inventário do Teles Pires, Juruena e Tapajós são 42 usinas. Isso não significa que serão construídas, o que está em planejamento é outra coisa. Mas no inventário há potencial para sete usinas no Tapajós, 29 no Juruena e seis no rio Teles Pires. São desde usinas bem pequenas até grandes.

O último PDE tem oito usinas na região no planejamento até 2021. São quatro no Teles Pires - Colider (342 MW) e Teles Pires (1820 MW) que já estão em construção, Sinop (461 MW), que deve ir a leilão possivelmente em agosto, e São Manuel (746 MW), onde ainda temos que fazer audiência pública. No rio Tapajós são outras duas, São Luiz do Tapajós (6133 MW), que está em estudos e provavelmente vamos leiloar em meados do ano que vem, e Jatobá (2338 MW). Por fim, no Juruena, São Simão (3509 MW) e Salto Augusto (1461 MW), que ainda nem se iniciaram os estudos. Isso não quer dizer que as outras estão abandonadas, apenas não estão ainda no horizonte do planejamento. Os estudos serão úteis para a discussão no futuro.

Ao falar de MW, tratar dano ambiental como se fosse coisa fungível. "Não mexemos em x% da área". Só que o pedaço que mexeu ferrou tudo. Arguivelmente, apenas a hidrelétrica de São Luís do Tapajós, com 6GW anunciados, já mexe com toda a bacia, já que interrompe o fluxo do Tapajós. Rios em particular são por definição ambientes dinâmicos, e o mesmo peixe pode ter como seu território todo o comprimento do Tapajós. E não, escadinha não resolve o problema, até porque além da barreira física tem a zona morta a montante da barragem, em que a água parada tem menos oxigênio.


4) Tolmasquim: Na Amazônia há dois tipos de usinas, dois modelos. Um deles é para áreas antropizadas, onde há muita atividade humana, que é o caso das usinas do Madeira, em Rondônia, e de Belo Monte, no Pará, onde 70% do entorno são fazendas. Nessas áreas, muitas vezes longínquas, com uma considerável população pobre vivendo em situação precária, a usina é vista como vetor de desenvolvimento regional. As condicionantes da obra levam o tratamento de esgoto aos municípios, melhoram o sistema de saúde. Nesses casos, as usinas podem significar desenvolvimento regional e também preservação ambiental, com a obrigação de criar áreas de conservação, recompor a mata ciliar. Obrigações que procuram reverter o processo de degradação e proporcionar desenvolvimento regional.

Falar do ideal de desenvolvimento levado por usinas em áreas já desmatadas como se tivesse relação com a realidade. Esgotamento, recomposição de matas ciliares, e companhia, são belas intenções, não o que as empresas construtoras de barragens realmente fazem, muito menos o que acontece na região, para além do controle delas. Sem prever as falhas nem ter mecanismos para preveni-las, os "planos" da EPE, com todo o seu custo e todos os seus pesquisadores, são wishful thinking, e valem tanto quanto um post no meu blog propondo usinas nucleares-parque no sudeste.


5) Tolmasquim: O potencial hidrelétrico, da mesma forma que a Biodiversidade, é uma riqueza. Temos a matriz energética que menos emite gás estufa do mundo. Não vamos aproveitar todo o nosso potencial hidrelétrico de lá. Belomonte, do ponto de vista de engenharia não é um projeto onde se visou produção de energia máxima. Não é que a engenharia não saiba fazer uma usina, poderia gerar mais se tivesse um reservatório grande, mas o impacto disso não seria aceitável. Mas não terá os impactos negativos que poderia ter. Esse meio termo é o que buscamos, esse é o debate.

Valor: E a preservação é uma variável importante?

Tolmasquim: No caso do Tapajós, não tenho dúvida. Não se pode construir uma usina a ferro e fogo, destruindo todos os Ecossistemas. É claro que esse modelo vai contrariar tanto o pessoal que quer otimizar o uso daquela bacia, que não está usando da forma ótima, como vai contrariar os que desejam preservar intocado aquele ambiente. É preciso ter uma solução de compromisso. O potencial do Tapajós, Teles Pires e Juruena é de 28 mil MW - isso é o que é possível, não o que será feito. O que será feito é o que vamos ver no futuro. Só uma parte pequena está planejada.

Valor: Essa bacia é a mais importante como potencial hídrico do país, representando 25%?

Tolmasquim: Sim, entre as que não foram exploradas ainda. O que precisamos agora é criar elementos importantes para o diálogo entre as áreas. Não necessariamente todo mundo vai concordar no fim, mas isso faz parte do processo.

Valor: E a questão indígena?

Tolmasquim: É o tema mais importante no planejamento de hoje. 

Exagerar a importância da energia do Tapajós. Se Belo Monte é o modelo, o "meio termo" propalado são 11GW, não 28. Com 100% de aproveitamento. Afinal, Belo Monte tem uma potência nominal de 11GW, e geração firme de 4, e o regime de águas do Xingu é muito parecido com o do Tapajós. 28GW são duas Itaipus, é um número impressionante. "Um pouco menos de uma Itaipu" em troca de eliminar completamente uma área de Amazônia maior do que a maioria dos estados brasileiros é menos atraente.