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26.4.08

Racismo à antiga

17.4.08

Caridade com sofrimento alheio

Um artigo do LA Times, já um pouco datado, fala dos investimentos da fundação Bill e Melinda Gates, que contrastam só um pouquinho com as metas humanitárias da fundação.

Não acho que a idéia do "investimento ético" é a panacéia que tentam vender. Pelo contrário, mesmo que fosse inteiramente focado em empresas realmente éticas - e os índices tanto da Bovespa quanto da NYSE incluem a Aracruz Celulose - ele seria incapaz, por definição, de alterar substancialmente a dinâmica de preços, e portanto a atitude do sistema como um todo, dentro de um livre mercado capitalista. Mas as centenas de bilhões de dólares das fundações filantrópicas americanas poderiam muito bem fazer uma diferença, não decisiva mas pelo menos substancial, se fossem aplicadas em empresas com um padrão mínimo de responsabilidade. Digamos, não "boas," mas pelo menos "não tão horríveis assim."

O problema pra que isso acontecesse é que, por definição, uma fundação deve manter seu dinheiro em aplicações "fortes," para não arriscar a interrupção de suas atiuvidades-fim. Por outro lado, procuram um mínimo de rentabilidade, para conseguir expandir suas operações. E o único jeito de reconciliar esses dois objetivos é a aplicação nas blue chips, as companhias grandes e fortes - que geralmente são justamente as que têm prontuários globais dignos do Lex Luthor.

8.4.08

Dark angelic mills

Desde o final dos anos 70, é comum a noção de que o mundo, e especialmente suas regiões mais ricas, estaria entrando em uma era "pós-industrial." A noção não é de modo algum incontroversa, mas reflete uma realidade: os processos produtivos atualmente se caracterizam por uma produtividade extrema que faz com que menos de 20% da população de um país, trabalhando na indústria, possa suprir todas as suas necessidades materiais. Assim, o trabalhador na indústria começa a trilhar o mesmo caminho que seu avô camponês um dia trilhou, e junto com ele o "capitão da indústria," que ruma ao baú onde o senhor feudal está guardado.
Disse "reflete uma realidade," mas a realidade em questão é uma realidade nocional; pertence ao campo das percepções e imaginários mais do que ao campo da atividade física. Afinal de contas, ainda há gente - e muita - trabalhando no agronegócio, mesmo em países desenvolvidos. A questão é que essa gente passa a trabalhar de acordo com uma concepção e estrutura de produção industriais, ao invés da estrutura camponesa ou feitorial de antes; e com a especialização, muitas tarefas que eram dos próprios produtores de alimentos passaram a se tornar tarefas industriais. Numa sociedade camponesa, apesar de haver artesãos especializados, boa parte da produção eg de pano, ou panelas e potes ou o que seja é feita pelos próprios agricultores. Do mesmo modo, com a "economia do conhecimento," continuam havendo indústrias, mas o proletário passa a se tornar um prestador de serviço em firmas fragmentárias.
Isso não é uma "necessidade" infraestrutural ou tecnológica, mas um resultado em parte de teorias, em parte sim de uma evolução tecnológica, em parte de estratégias deliberadas contra regulamentação governamental e associação dos empregados. Mas por não ser "necessário," não deixa de moldar o mundo em que vivemos. Nesse mundo, muita gente que é filha de proletários ou industrialistas não conhece aquele ambiente no qual os pais viveram; a cultura urbana que surge se percebe como desconectada de uma "realidade" que é o ambiente de produção antigo, do mesmo modo como a formação de uma vida inteiramente urbana isolava os citadinos do século XVIII do contato com a natureza. Ou pelo menos essa é a minha explicação provisória.
Ops. Esqueci de apresentar o que deveria ser explicado.
Se virmos os abundantes projetos de "requalificação urbana" existentes mundo afora, a linguagem e as intenções deles são extremamente parecidos com os dos construtores de parques durante o período 1740-1860. Fala-se de preservar uma herança que faz parte da nossa própria identidade - como seres humanos e como membros de comunidades específicas. São feitos comentários sobre a rápida erosão das oportunidades de conviver de modo adequado, em espaços públicos e comunitários. Até a o contraste com as atitudes passadas (e presentes ainda em círculos menos "avançados") que viam na natureza ou no parque industrial uma selva horrenda é similar.
Então, a preservação do passado industrial faz parte de uma iteração moderna do parque. Jardins e parques, desde que a noção começou, representam uma tentativa de recriação de um ambiente ideal, de certa forma edênico. No limite, como o chahr-bagh persa, representam uma tentativa literal de recriação do paraíso, com as árvores, rios e alinhamento que se acreditava serem característicos deste. Outros, como os jardins italianos da renascença tardia, representavam uma "lição" espiritual e intelectual, um processo de internalização da iluminação; é o caso, também, do tipo de jardim chinês que ficou conhecido no Ocidente pós-nova era como jardim zen.
O que separa o parque moderno de outros jardins, e que ele tem em comum com a tentativa de preservar o ambiente industrial, é que A) o paraíso perdido em questão não faz parte de uma realidade remota e de outra qualidade, inumana, B) o parque não está associado a uma construção ou uso específico (se houver museus, instalações esportivas, ou outras construções dentro do parque, elas que fazem parte do parque, e não o contrário, e C) faz parte da ideologia por trás de sua construção a apresentação deles como essenciais para a preservação/recriação de uma vida comunitária perdida/em degeneração.
Imagino o que não diria um Ruskin (no auge da primeira era dos parques) ao ver os urbanistas de hoje clamarem pela preservação dos dark satanic mills

1.4.08

Porrada fofa

Uma decisão recente da Suprema Corte japonesa negando o julgamento do recurso impetrado contra a condenação, há 42 anos atrás, de um acusado de assassinato, serve pra lembrar que nem tudo muda tanto quanto parece. O Japão obcecado por coisas fofas, desenhos animados e uma realidade cuidadosamente sem conflitos e asséptica de hoje em dia continua sendo, como no passado, um país em que a autoridade e a hierarquia esperam ser obedecidas inquestionavelmente - e têm métodos para garantir isso bastante, ahnn... radicais. Afinal, é uma das poucas democracias do mundo que conservam a pena de morte em tempos de paz.

Não é de se surpreender, quando se lembra que logo depois da administração do doido do McArthur, que democratizou o país e fez uma reforma agrária maciça (sem ligar pra essas besteiras de se o latifúndio era improdutivo ou não), os americanos decidiram que o Japão tinha que ser uma barreira aos soviéticos, tiraram todos os criminosos de guerra do período fascista da cadeia e instalaram no governo. Bem, quase todos - alguns já tinham sido enforcados, então ao invés do governo foram só virar santos na capela onde todo primeiro-ministro vai rezar. (Admita-se : com os crisântemos da família imperial bordados na enorme bandeira branca, é mais bonita do que a média dos monumentos fascistas ou ur-fascistas